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O presidente da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias), Moacyr Servilha Duarte, diz que sem soluções novas o motorista terá de se acostumar aos grandes congestionamentos em estradas que chegam a regiões metropolitanas. E que, em um prazo entre cinco e dez anos, praticamente ninguém conseguirá trafegar em rodovias com pedágio no país sem pagar a tarifa. Até lá, diz, todas terão o "free-flow", sistema eletrônico que cobra de acordo com a distância percorrida.

Folha - O pedágio não é muito caro no Brasil, principalmente em São Paulo?
Moacyr Servilha Duarte - Falta enfoque nessa discussão. Você tem que ver a equivalência entre a tarifa e o benefício que o usuário recebe. Estudos que fazemos mostram que o benefício é favorável ao usuário, principalmente ao caminhoneiro. Nesse sentido, a tarifa não é cara. O que dificulta a modicidade é a base de pagantes. Se eu cobrasse 100% dos usuários a tarifa seria módica. Na Dutra, só 9% pagam.
Mas há uma crítica muito forte contra o governo de SP em razão das tarifas.
É discussão muito difícil, politizada, político-partidária. A oposição ataca o programa de SP, que é um sucesso inegável, e o governo acaba não se sentindo em condições de se defender.

Folha - Como o setor avalia a tentativa do governo de SP de alterar os aditivos feitos em 2006, dizendo que as empresas foram muito beneficiadas?
Duarte - Na época, você tinha vários desequilíbrios e precisava de vários investimentos. Em 2004, 2005, foram reconhecidos os desequilíbrios. Quem definiu as regras de como fazer o reequilíbrio foi o governo. Foi feita uma negociação. É muito fácil depois dizer que a renegociação está errada. Esse tipo de contestação é difícil e dificulta muito. Você usa a cobrança do pedágio como instrumento político partidário em programa eleitoral.
A concepção que usuário tem é que a rodovia está paga. Isso não existe. Rodovia está gerando despesa todo dia. Ponte, sem manutenção, ela cai.
O governador se compromete na campanha eleitoral a baixar pedágio e vê isso como uma possibilidade de baixar. Cria uma insegurança.

Folha - As empresas aceitariam uma redução?
Duarte - Essas coisas afetam diferentemente cada concessionária. Mas acho que é de não aceitar, por várias razões. Há mecanismos para reduzir a tarifa e alguns foram usados para neutralizar o não reajuste em julho, após os protestos. Claro que se você não dá reajuste baixou a tarifa. Ele [Alckmin] usou os mecanismos para compensar, mas o objetivo de que baixou a tarifa não consegue vender à sociedade.
E você não renegocia com governo, é com o Estado. E se cada governador se dá ao direito de rever...

Folha - Mas as empresas devem ser ressarcidas de um imposto que não pagaram?
Duarte - Tem que usar projeções, corre o risco de não acertar. Isso é da lei. Você tem fatos que o contrato prevê que têm que ser equilibrados. Não foi recolhido porque trabalhou com projeção. Como o tráfego está menor, estou recebendo de ISS mais do que recolhido, mas minha receita também é menor. Mas se o tráfego fosse maior, eu ia pagar mais ISS do que recebendo e em compensação iria ganhar na receita. Não pode reclamar, o risco é delas. Quem escolheu essa solução foi o governo.

Folha - As agências são independentes?
Duarte - O grande problema hoje do programa de concessões é que contrato de 25, 30 anos vai ter renegociação, vai ter coisas imprevistas. E quem tem que coordenar é a agência reguladora. Na medida em que a agência não tem força e não consegue se impor, fica muito difícil. Agência tem, no máximo, autonomia. O que a gente sente é que as agências não têm autonomia nem peso, têm poder concedente, tribunal de contas, MP.

Folha - E os lucros, com base na TIR (Taxa Interna de Retorno), não são altos?
Duarte - A TIR é compatível com o momento em que apresentou a proposta. E as concessões não foram implantadas pelo Fernando Henrique Cardoso, o primeiro decreto foi do José Sarney. As rodovias estavam acabadas. Os editais foram feitos em 94, 95, em ambiente completamente diferente do que é hoje. Agora melhorou muito.

Folha - As rodovias concedidas em na segunda fase têm pedágio baixo, mas enfrentam atrasos em obras. O que ocorreu?
Duarte - Os estudos para a concessão eram antigos. Deveriam ter feito tudo de novo, mas pegaram os estudos antigos e começaram a requentá-los. Quando chegou em 2007, fizeram licitação com base em estudos de dez anos. E foram atualizados meia boca, parcialmente, não se revisitou, foi se aos trechos, ver o que já tinha sido feito. E colocaram mais praças de pedágio por causa desse problema da Dutra. A Régis Bittencourt teve seis praças e a Dutra tinha quatro, no começo.
Faz licitação em ambiente diferente de 94, de 96, de momento de euforia, Brasil ia bem, situação mundial boa. E tiverem otimismo, trabalharam com TIR mais baixa. E esse ambiente propiciou aquelas propostas.
E começa a chegar ao local para fazer a obra e tinha problema. A serra do Cafezal não tinha licença ambiental. Contornos de Florianópolis, Niterói, Campos, tudo deu problema. Em um traçado de contorno já tinha um Minha Casa, Minha Vida. Em Niterói, no local onde haveria a duplicação, os estaleiros estavam desativados, e era para alargar por lá. Quando a concessionária chegou, os estaleiros estavam retomados. Não sei se, pelo valor da tarifa, a concessionária estava mais ou menos animada.

Folha - Esses atrasos são muito criticados.
Duarte - Tem político que quer transformar aquilo em bandeira. Em Florianópolis disseram aqui não pode. Muda e o Ibama manda refazer tudo. No mundo inteiro não faz licitação em cima de um parâmetro só, tarifa menor. Tem diálogo competitivo, escolhe dois ou três e chama para negociar, aprimora o projeto. Isso no Brasil é sonho de verão. O administrador brasileiro não tem autonomia para negociação. Mas a ANTT melhorou muito na questão da tomadas de subsídio, que passou a ouvir os investidores. Os estudos de viabilidade da terceira fase estão muito melhores.

Folha - A nova rodada de licitações pode ser prejudicada pela crise na economia?
Duarte - A terceira fase tem um volume de obras muito significativo, implica duplicação de 5.500 km de rodovias em cinco anos. Isso para os construtores é um mercado enorme. O que vai viabilizar essas licitações é esse interesse dos construtores. Normalmente o empreendedor de concessões são os construtores. Isso é no mundo inteiro. Tem dólar, essas contestações ao pedágio, mas vai começar a cobrar pedágio em 2015, fora do período eleitoral. Cria ânimo. Vejo que vai fazer. Tem problema de tráfego projetado.

Folha - Os engarrafamentos nas estradas que chegam às metrópoles vão acabar em algum dia?
Duarte - Se você pegar a qualidade das rodovias, é excelente. Nos EUA tem esse mesmo tipo de problema. Uma coisa é a rodovia rural, outra é nas áreas urbanas.
Tem problema conceitual, que as comunidades se apropriam das rodovias como via local. Os deslocamentos dos municípios e das regiões metropolitanas deveriam ter solução própria. Mas transformam a rodovia em avenida. Problema na Dutra, caminhoneiro reclama que ele paga e o que não paga está entupindo a rodovia. E aí faz marginal. Mas eu estou pagando marginal. E o município é que deveria fazer.
Nos EUA estão criando as vias expressas. Nas que não têm pedágio, estão criando faixa pedagiada. Quando já é pedagiada, cria uma faixa adicional com pedágio mais caro.
Estão fazendo esse tipo de experiência de terceira faixa com pedágio mais caro e o cara que quer paga.
Aqui, perdemos uma grande oportunidade quando foi feita a terceira faixa da marginal Tietê. Tinha tudo para fazer a via rápida. O motorista que está na Castello Branco e quer ir para a Dutra, ao aeroporto, paga e vai mais rápido. Mas vai alguém e diz aí e que é politicamente incorreta porque... Mas é uma questão de seriedade.
Um projeto do Instituto de Engenharia previa um elevado que ligava a Castello à Ayrton Senna com saída para a Dutra, de um lado só, seis faixas, e fazia isso, com poucos acessos. Se fizesse isso, era fácil vender a ideia do pedágio. Mas foi criada a terceira e o que acontece? Ela está entupida. E precisa modernizar o sistema de cobrança.

Folha - Qual é o caminho da modernização?
Duarte - A visão que tenho é que, num horizonte de cinco a dez anos, não vai ter mais praça de pedágio. E tem muita experiência nos EUA. Vejo o ponto a ponto [que o governo de SP vem testando] como uma experiência de tecnologia. Os aspectos tecnológicos estão resolvidos.
Vai ter dois fatos positivos com a cobrança totalmente eletrônica. Esse ato de meter a mão no bolso e pagar pedágio é um ato dolorido, sempre. Na hora em que você acaba com isso, tira aquele aspecto psicológico. E o segundo aspecto é que você vai pagar pela distância percorrida.
A grande vantagem é essa, você, todo mundo vai pagar e todo mundo vai pagar menos. A tendência é que quase todo mundo pague. Você vai cobrar praticamente de todo mundo. Vai melhorar muito.
Mas um problema para viabilizar isso, é aspecto institucional, o controle da frota. Espero que grande parte se cadastre e pague. Mas tem o problema do cara que não é cadastrado e não vai pagar. Mas o cara que não quiser pagar na rodovia, que procure outros caminhos. E precisa implantar o sistema de identificação automática de veículos. Nisso, o governo federal vem de adiamento em adiamento. Esse é o futuro da cobrança de pedágio.
Fonte: Folha de S. Paulo, 8 de setembro de 2013

Categoria: Geral


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