A tese de doutorado "A emoção raivosa em motoristas de automóvel, caminhão, motocicleta, ônibus e táxi", aprovada em 26 de julho, é resultado de oito anos de trabalho do professor Luis Alberto Passos Presa. Ele é autor do livro "A mensuração da raiva em motoristas", sua dissertação de mestrado publicada em 2002 pela editora Vetor.
Presa submeteu 400 condutores de Manaus a testes divididos em cinco categorias, de acordo com os veículos que conduzem. Eles responderam a um teste psicométrico com 44 itens utilizado em psicologia chamado Staxi (Inventário de Expressões de Raiva) e ao formulário Situações de Raiva no Trânsito (SRT), com 20 itens, específico sobre situações de raiva no trânsito.
Neste segundo teste, cada entrevistado respondeu um, dois, três ou quatro para cada um dos 20 itens apresentados. Ante a expressão "quando estou dirigindo no trânsito e buzinam instantaneamente para mim quando abre o semáforo sinto...", o pesquisado respondia com uma dessas quatro expressões: "nenhuma raiva", "pouca raiva", "raiva média" e "muita raiva".
Veja o ranking completo das situações de maior raiva no trânsito:
1 - surgem buracos grandes e inesperados que agridem meu veículo
2 - passo por motoristas que estacionam em várias filas, chegando a fechar a fila
3 - à noite, motoristas me colocam luz alta nos olhos, dificultando a visão
4 - vans que param em local inadequado para pegar ou largar passageiros
5 - vejo carros da polícia cometendo infrações no trânsito, sem urgência
6 - veículos grandes cruzam a minha frente, obrigando-me a frear
7 - percebo que há guardas escondidos, multando motoristas
8 - pedestres atravessam arriscadamente, obrigando-me a frear
9 - há trânsito lento em fila única e motoristas avançam na contramão
10 - veículos lentos não saem da esquerda, obrigando-me a ir pela direita
11 - operários estão tapando buracos em horário de movimento intenso
12 - engarrafamentos e ou trânsito lento me fazem ficar atrasado
13 - motoristas andam próximos a mim com ruídos altos
14 - motoristas ficam muito próximos da traseira do meu veículo
15 - ciclistas andam pela contramão, obrigando-me a desviar
16 - passo diariamente por uma obra que dura meses
17 - motoristas em geral passam por mim quando abre o semáforo
18 - sou xingado por ter dado chance para pedestre ou veículo passar
19 - buzinam instantaneamente para mim quando abre o semáforo
20 - motoristas andam acima da velocidade permitida para o trecho
Segundo Presa, o estudo apontou cinco resultados: 1) motoristas mais calmos na vida em geral tendem a ter menos raiva no trânsito; 2) motoristas de maior idade apresentam menores médias de raiva no trânsito; 3) homens e mulheres não apresentam diferenças em termos de raiva no trânsito; 4) graus de escolaridade não influenciam em mais ou menos raiva; e 5) motoristas não infratores têm menos emoção raivosa dos que motoristas infratores.
O estudo mostra que no trânsito os pontos de vista sobre os outros mudam conforme o tamanho de quem vê e de quem é visto. Para os motoristas de caminhão, os maiores provocadores de raiva no trânsito são luz alta nos olhos e vans em qualquer lugar. Para os motoristas de táxi e os donos de carros de passeio, os maiores motivos de raiva são os buracos e os outros carros fechando a rua. Para os condutores de motocicleta, são os buracos e veículos que cortam a frente. Para os motoristas de ônibus, são os veículos que fecham a rua e a luz alta nos olhos.
"O que dá mais raiva são os buracos no chão, para os motoristas de motocicleta, auto e táxi, porque para estes ocorre um prejuízo material. Os motoristas de caminhão não têm tanta raiva porque são as empresas que arcam com o prejuízo", diz o professor Presa. A motorista de táxi Ana Maria Bazália de Godoy dirige seu Fiat Idea em São Paulo, mas viveu experiência idêntica à exposta por Presa.
"É o que me dá maior prejuízo. Perdi os dois pneus da frente há cerca de um mês", afirma. Ela também considera motivo de raiva o fato de o motorista acelerar quando é ultrapassado e o que não respeita o sinal de seta antes da convergência.
De acordo com Presa, os condutores de veículos grandes tendem a sentir menos raiva no trânsito, uma vez que são menos vulneráveis a riscos. É o oposto do que ocorre com os motociclistas, os mais desprotegidos em qualquer capital.
Do estudo pode sair uma sugestão de novas políticas públicas. "Os resultados sugeriram ser importante avaliar os níveis de emoção raivosa nos motoristas experientes e nos candidatos a motorista quando estes realizam a avaliação psicológica, visto que a emoção raivosa pode ser uma importante causa de infrações e acidentes de trânsito", afirma Presa.
Fonte: portal G1, 1º de agosto de 2010