Haddad apresentou nesta segunda-feira a minuta do Plano Diretor a integrantes do Conselho da Cidade. O plano é a legislação que determina o planejamento da cidade. A lei de São Paulo é de 2002 e deve passar por uma revisão até o final do ano. A redução das vagas, segundo Haddad, foi mal compreendida.
Não vale para todos os terrenos da cidade. Vale para aqueles próximos a estações do Metrô, próximos a corredores de ônibus. "Em segundo lugar, não há uma proibição, há um desincentivo de que a pessoa ocupe esses lotes com empreendimentos com número excessivo de vagas na garagem."
Fernando Haddad,
prefeito de São Paulo
Segundo Haddad a regra sobre garagens só vale para lotes próximos a sistemas de transporte coletivo de média e alta capacidade. "Não vale para todos os terrenos da cidade. Vale para aqueles próximos a estações do Metrô, próximos a corredores de ônibus", afirmou.
"Em segundo lugar, não há uma proibição, há um desincentivo de que a pessoa ocupe esses lotes com empreendimentos com número excessivo de vagas na garagem", afirmou.
"Do mesmo jeito que estou tentando levar empresas para a Zona Leste dando incentivo estou desincentivando construir empreendimentos com muitas vagas por unidade habitacional próximos a esses eixos de mobilidade", afirmou.
A limitação citada por Haddad consta no novo Plano Diretor no capítulo V, artigo 62, e diz que "novos empreendimentos imobiliários residenciais (...) devem ter, no máximo, uma vaga de estacionamento com 25 metros quadrados para cada unidade residencial autônoma".
De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Urbano, a construção de mais vagas é possível desde que o empreendedor esteja disposto a incluir a área do estacionamento extra dentro do limite permitido para construção (área computável). Assim, os empreendimentos terão menos apartamentos para que possam oferecer vagas extras às unidades habitacionais construídas.
"Desincentivo é considerar [a garagem] como área computável. É só esse o desincentivo. Então inibo essa voracidade por vaga. Nos locais onde a cidade é desadensada, os projetos são livres, inclusive desse ponto de vista", explicou Haddad.
O plano também coloca restrições a construções de vaga em outras regiões fora dos corredores e das imediações do Metrô. Nesses casos, a área máxima destinada a garagens não pode ultrapassar 25% da área construída.
DESTAQUES DO PLANO PROPOSTO
Isenção fiscal para empresas na Zona Leste
Hoje
Empresas que se instalam na cidade pagam IPTU e outros tributos, inclusive 5% de ISS.
Plano
Isenção fiscal de 100% no valor do IPTU, ISS da obra para construção civil e aquisição do terreno para prestadoras de serviço. O empresário terá que pagar 2% do ISS, o valor mínimo permitido.
Aviões fora do Campo de Marte
Hoje
Aeroporto opera exclusivamente com aviação geral, executiva, táxi aéreo e escolas de pilotagem como o Aeroclube de São Paulo.
Plano
Local iria funcionar apenas como heliporto para região abrigar grandes empreendimentos que trariam oportunidades de emprego.
Levar moradores para áreas com infraestrutura
Hoje
Grande parte da população vive nas periferias, longe dos eixos estruturais da cidade.
Plano
Adensamento populacional vertical em áreas próximas a estações de trem e de metrô.
Vagas de estacionamento
Hoje
As vagas não são computadas como área edificada no pagamento da outorga onerosa.
Plano
Perto dos corredores urbanos, fica limitado o número de vagas nas garagens. Caso o edifício tenha mais de uma vaga por morador, será preciso pagar uma outorga onerosa por vaga adicional.
Prédios antigos do Centro
Hoje
Imóveis são reformados.
Plano
Adotar o retrofit total, que permite que prédios sem valor histórico sejam demolidos e construída uma edificação nova com a mesma volumetria do prédio antigo e o mesmo número de apartamentos.
Oferta de trabalho
Hoje
Maioria das vagas está concentrada nas regiões Central e Oeste da cidade. Zona Leste é a que mais sofre com a falta de emprego.
Plano
Criar pólos regionais nos bairros redistribuindo as oportunidades de trabalho no território.
Transporte/mobilidade
Hoje
Os investimentos eram focados à construção de ruas e avenidas para veículos.
Plano
Melhoria das condições de mobilidade, priorizando o transporte coletivo público, fortalecimento dos modos não motorizados de deslocamentos e desestímulo ao uso de automóveis individuais privados.
Entenda o Plano Diretor
O prefeito vai enviar à Câmara Municipal o projeto de lei que trata da revisão do Plano Diretor Estratégico (PDE). Antes disso, moradores podem opinar sobre a minuta do texto em reuniões e audiências públicas. Uma das principais dificuldades, no entanto, é entender o que é, para que serve o Plano Diretor e quais os principais impactos que deve ter sobre a cidade nos próximos anos.
Veja abaixo os destaques do plano proposto, a explicação do que é a lei, a opinião de especialistas sobre as mudanças e um glossário dos principais termos:
Plano: lei exigida pela Constituição
A Constituição Federal determina no artigo 182 que a política de desenvolvimento urbano das cidades deve ser executada pelas prefeituras municipais, conforme diretrizes gerais fixadas em lei. O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, é obrigatório para cidades com mais de 20 mil habitantes.
Esse artigo da Constituição é regulamentado pela lei federal 10.257/2001, conhecida como Estatuto das Cidades. Segundo o Estatuto, o plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal. Outros instrumentos de planejamento obrigatório, como o plano plurianual (PPA), as diretrizes orçamentárias (LDO) e o orçamento anual devem incorporar as diretrizes e as prioridades contidas no plano diretor.
O Estatuto das Cidades também diz que a lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos. São Paulo tem um plano diretor aprovado durante a gestão Marta Suplicy (PT). É a lei 13.430/02. Houve tentativa de revisão em 2006, mas o processo de discussão da proposta foi considerado pouco transparente e paralisado por causa de inúmeros questionamentos judiciais.
Ao assumir o cargo, em janeiro de 2013, o prefeito Fernando Haddad ressaltou a necessidade de promover uma reforma urbana. A revisão do Plano Diretor é uma de suas promessas de campanha.
"São Paulo está pronta para uma reforma, para repensar seu desenvolvimento. Eu penso que o maior legado que a Câmara dos Vereadores pode oferecer é um conjunto de leis capazes de dar uma visão de longo prazo para a cidade de São Paulo. A maneira como a cidade se desenvolveu em 80 anos, desde Prestes Maia, se esgotou", disse Haddad, na época.
Além do Plano Diretor, Haddad também quer revisar outros instrumentos de planejamento, complementares ao plano diretor, entre os quais, a lei de parcelamento, uso e ocupação do solo e os planos regionais estratégicos, previstos na lei 13.885/2004.
Plano: especialistas comentam intenções
Especialistas consultados pelo G1 consideram positivas as principais diretrizes do Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo, apresentado pelo prefeito Fernando Haddad dia 19, mas ressaltam que não bastam boas intenções para viabilizá-lo e implementá-lo.
Basicamente, o documento, de 84 páginas, no entender destes especialistas, traz as propostas para tenta equacionar algumas das demandas históricas da capital, como qualificar, com mais saúde, educação e cultura, e levar mais emprego às periferias, ocupar mais intensamente a região central e dar prioridade para o transporte coletivo.
Para Maria Lúcia Refinetti, professora do Departamento de Projetos da Área de Planejamento Urbano e Regional da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), conceder isenção fiscal de uma série de tributos municipais, como prevê o Plano Diretor, pode não ser suficiente para que empresas prestadoras de serviço decidam se transferir para bairros de algumas regiões específicas, como a Zona Leste de São Paulo.
?Como plano, está todo correto. A dificuldade é no fazer. A grande dificuldade é que você não lida com a ação direta; você lida com as circunstâncias?, ressaltou.
Para ilustrar o seu ponto de vista, a professora relatou um episódio no qual pode acompanhar de perto envolvendo empresários que pleiteavam a construção de um pólo industrial em Itaquera. Uma lei municipal permitia a instalação das indústrias, enquanto que uma lei estadual as vetava.
GLOSSÁRIO DO PLANO DIRETOR
Plano Diretor é uma lei que serve para dirigir o planejamento do desenvolvimento da cidade em uma década.
Código de Obras e Edificações define as regras para construção em cada região da cidade, quais as dimensões e características mínimas que os imóveis devem apresentar para ter o projeto aprovado pela Prefeitura
Zonas Especiais são porções do território com diferentes características ou com destinação específica e normas próprias de uso e ocupação do solo, situadas em qualquer macrozona do Município. No plano diretor podem ser: Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), Zonas Especiais de Ocupação Restritiva (ZEOR), Zonas Especiais de Preservação Cultural (ZEPEC), Zonas Especiais de Preservação Ambiental (ZEPAM) e Zonas Especiais de Desenvolvimento Econômico (ZEDE).
Operações urbanas consorciadas são mecanismos por meio dos quais a Prefeitura busca financiar projetos de reestruturação, recuperação e melhoria ambiental e de espaços urbanos de setores da cidade com efeitos positivos na qualidade de vida, no atendimento às necessidades sociais e na efetivação de direitos sociais.
Cota de Solidariedade - Grandes empreendimentos poderão ter que doar áreas ao município para produção de habitação de interesse social (HIS).
Área construída computável - soma das áreas cobertas de todos os pavimentos de uma edificação, que são consideradas para o cálculo do coeficiente de aproveitamento.
?Quando houve a revisão da lei estadual e a aprovação para que o polo fosse criado, houve uma supervalorização dos terrenos na região, o que passou a inviabilizar o investimento por parte destes pequenos empresários?, afirmou Maria Lúcia.
A mobilidade seria a principal demanda a ser atendida em São Paulo, segundo a professora da USP. ?O padrão do que era a cidade industrial mudou inteiramente. A implementação do modo de produção just in time pelas indústrias obrigou a uma maior circulação de mercadorias. E estas mercadorias circulam de caminhão. Além disso, não se trata mais daquele funcionário de uma linha de produção, que fazia a mesma coisa todo dia. Agora, é um prestador de serviço que se desloca de carro para atender aos seus clientes, prestar consultorias, levar as mercadorias etc.?, disse.
Falácia da verticalização
Já na visão da professora de Arquitetura da FAU Raquel Rolnik a principal novidade do Plano Diretor refere-se às diretrizes que propõem o adensamento da região central da cidade. Segundo ela, a verticalização por si só, com a construção de prédios, não significa necessariamente levar mais moradores para essa região. ?Essa é a falácia da verticalização. Uma construtora pode erguer um prédio com apartamentos com 350 metros quadrados e apenas uma família vir a morar nele?, explicou.
O Plano Diretor proposto por Haddad impediria que ocorresse esta distorção. ?Essa é a novidade do plano. Além da proposta de adensamento, têm mais dois pontos que mudam o jogo, que é o máximo de uma vaga de garagem por unidade e o coeficiente de aproveitamento da área?, disse.
Com base neste coeficiente, Rolnik estima que um apartamento nestas regiões deverá chegar no máximo a 130 metros quadrados. ?É muito diferente do que é a verticalização que é feita hoje. Quem irá morar nestes eixos é porque vai usar o transporte coletivo. A transformação se dará em torno destes eixos de transporte de massa?, conclui.
Para acelerar o adensamento, ela defende a utilização de instrumentos de políticas fundiárias, como o IPTU progressivo para áreas vazias ou subutilizadas. ?Como crítica, eu incluiria no Plano Diretor uma cota de habitação de interesse social, para atender a uma classe mais baixa. Isso seria possível, aliando às propostas os instrumentos de políticas fundiárias?, completou.
Fonte: portal G1, 26 de agosto de 2013