Some-se a isso o total descaso da nossa sociedade com as camadas mais pobres, e o resultado é que ainda hoje os maiores investimentos em transporte - como as novas vias da Marginal do Tietê ou o Rodoanel - são voltados para o carro, e não para o transporte público, embora o uso do automóvel represente apenas 30% das viagens diárias feitas na cidade! Paris, por exemplo, iniciou a construção do seu metrô no final do século 19 e, por isso, constituiu uma cultura urbana voltada para a mobilidade por transporte público, uma solução hoje muito mais adequada aos novos desafios de sustentabilidade ambiental. Aqui, embora tenhamos começado nosso metrô junto com a Cidade do México, no início dos anos 70, hoje temos quatro vezes menos linhas do que eles.
A região do Morumbi não tem do que reclamar, já que para conectá-la melhor ao centro foram construídos um túnel sob o Rio Pinheiros e uma moderníssima ponte estaiada, pelos quais, pasmem, não podem passar ônibus! Mesmo assim, não há milagre que minimize o impacto de 6 milhões de veículos na cidade. Por isso, qualquer lançamento imobiliário vai carregar significativamente o trânsito, e soluções de melhoria viária serão apenas paliativas. A questão não é somente repensar e regular o ritmo de lançamentos imobiliários, em uma cidade em que o mercado atua com grande liberalidade, mas realizar um replanejamento da opção de transporte que São Paulo fez, pensando, a longo prazo, em uma cidade realmente mais justa, e não só voltada para os usuários de automóveis.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 19 de maio de 2010