A Lei nº 8.213 determina a contratação de 2% a 5% do quadro de pessoal de empresas com mais de cem funcionários de portadores de deficiência - acima de 500, o percentual é de 5% dos empregados. Nos últimos anos, com o aperto da fiscalização das Delegacias Regionais do Trabalho (DRTs), as empresas têm conseguido estender o prazo para o cumprimento da lei por meio de termos de ajuste de conduta (TACs) estabelecidos com o Ministério Público do Trabalho (MPT). Até agora, o único argumento aceito pelo Judiciário para anular multas aplicadas às empresas que se tem notícia é a comprovação de que elas ocorreram durante a vigência do TAC.
Mas, no caso da empresa de telecomunicações, a decisão do TRT considerou outros fatores para anular a autuação. A empresa precisava contratar mais 211 portadores para cumprir a cota prevista na lei e chegou a estabelecer termos de ajustamento de conduta com o Ministério Público do Trabalho e criar um programa de qualificação profissional para facilitar a inserção dos portadores de deficiência em seus cargos. De acordo com o acórdão do TRT, o sistema de cotas para deficientes não veio precedido nem seguido de nenhuma providência de órgãos governamentais no sentido de cuidar da educação e da formação dessas pessoas. Além disso, conforme o acórdão, as funções de tele-atendimento não comportam deficiências como o comprometimento cognitivo, de fala, auditivo e visual.
Para o advogado Ricardo Pereira de Freitas Guimarães, do escritório Freitas Guimarães Advogados Associados, que representa a empresa na ação, tanto o Decreto nº 3.298, de 1999, que regulamenta a política nacional de integração de deficientes, quanto a própria Lei nº 8.213 em questão prevêem o auxílio governamental nas contratações. "É inconstitucional inserir deficientes em locais inadequados só para cumprir a cota", diz Freitas. O mesmo argumento foi utilizado pelo advogado Alexsander Fernandes de Andrade, da banca Duarte Garcia, Caselli, Guimarães e Terra Advogados, na defesa de uma empresa do setor aéreo. Após ser multada por não conseguir contratar 400 deficientes, a empresa alegou que não poderia cumprir a cota pois a maioria dos seus funcionários trabalha nos aviões e o próprio regulamento brasileiro de aeronáutica proíbe a contratação de pessoas que tivessem qualquer deficiência. A empresa contestou a multa na esfera administrativa e aguarda uma decisão na segunda instância.
A alegação da falta de profissionais qualificados no mercado pelas empresas também é comum. Este é um dos principais argumentos utilizados pelo advogado Rodrigo Takano, do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice, na defesa de empresas que não atingiram a cota em dez ações civis públicas movidas pelo Ministério Público do Trabalho. Segundo Takano, apenas uma já foi julgada em primeira instância, e a empresa perdeu. "Não questionamos a validade da lei, mas sua forma ideal de aplicação". Para a advogada Lilian Dal Secchi Bento, do escritório Dantas, Lee, Brock & Camargo Advogados, outro problema apontado pelas empresas é que muitos portadores de deficiência preferem trabalhar no mercado informal para não perder o benefício previdenciário.
A lei que estabelece cotas para deficientes nas empresas tem enfrentado ainda outros questionamentos, em âmbito administrativo e judicial. A advogada Cláudia Brum, do escritório Siqueira Castro Advogados, tenta uma negociação com o Ministério Público do Trabalho para reduzir a base de cálculo da cota conforme o valor de risco de acidentes da atividade da empresa - no caso, uma indústria metalúrgica. O advogado Marcello Della Mônica Silva, sócio do escritório Demarest e Almeida Advogados, diz que outra contestação das empresas tem sido o critério para definir os graus de deficiência aceitos pela lei que, segundo ele, ficou mais rígido com o Decreto nº 5.296, de 2004. Ele atua na defesa de uma empresa que havia cumprido a cota com base em critérios anteriores, e que recentemente foi autuada.
Fonte: Valor Econômico, 15 de abril de 2008