São Paulo, o paciente mais terminal entre as cidades afetadas, buscou soluções. Em 1997, botou nas ruas o rodízio de carros. Em 2008, estendeu a proibição aos caminhões. E, em julho, vetou a entrada de ônibus fretados no centro expandido da cidade. Adiantou Mais ou menos. Hoje, 20%, das famílias paulistanas que possuem carro contam com um segundo automóvel, a grande tática pra driblar o rodízio. A restrição aos caminhões tirou 100 mil veículos pesados das ruas. Só que o vácuo criado foi preenchido rapidinho, porque equivale a um espaço para 400 mil carros - o número de automóveis que entram na frota da cidade em 11 meses. E a medida contra os fretados? Pode fazer mais mal do que bem. De acordo com pesquisa da Folha de S. Paulo, 30% dos passageiros estão migrando do fretado para o carro. Se isso se confirmar, esse pessoal ocupará três vezes mais espaço do que os fretados.
É claro, as medidas deram uma aliviada no problema. Mas não atingiram o grande vilão da história: o transporte individual. Só de carros, a cidade de São Paulo tem o equivalente à população do Paraguai, mais de 6 milhões. Somados a outros meios de transporte individual - motos e táxis -, tomam um pedaço assustador das avenidas: 88%. E só transportam 49% das pessoas em trânsito. É como se carros, motos e táxis usassem três faixas e meia de uma avenida com quatro faixas. O transporte coletivo, que carrega 50,9% das pessoas, ficaria espremido em meia faixa. "O carro ocupa um espaço perverso", diz Horácio Augusto Figueira, especialista em engenharia de transportes e autor desses cálculos.
Está mais do que na cara: sem mexer nos carros, a coisa não anda (literalmente). É por isso que uma proposta antes tida como o Belzebu tem ganho adeptos: o pedágio urbano. Mas cobrar para que os carros entrem no centro da cidade é uma medida impopular. E, por isso mesmo, evitada por políticos. "Acham que vão perder os votos dos motoristas", diz Nazareno Affonso, coordenador da Associação Nacional de Transportes Públicos. O cenário pode estar mudando: no Estado de São Paulo, um projeto de lei em tramitação prevê a aplicação de restrições à circulação de veículos para controlar a qualidade do ar - o que pode abrir uma brecha para o pedágio. Mas por que a ideia daria certo? Porque estimularia as pessoas a abandonar os carros. "Seremos incentivados a usar o transporte coletivo. E quem não quiser abandonar o carro vai topar pagar por avenidas mais livres", diz o urbanista Candido Malta, coordenador de um estudo sobre o deslocamento da população de São Paulo.
A chave para a explicação do trânsito de São Paulo é econômica. Os empregos estão concentrados no centro da capital, e é por isso que uma enxurrada de carros entope as principais avenidas. É gente que vem principalmente da zona leste e da zona sul, regiões com um índice de empregos por habitante quase cinco vezes menor do que a região central. Esse pessoal demora a chegar ao trabalho - e carro na rua por mais tempo é igual a mais congestionamento. Para o futuro, as projeções indicam que os empregos continuarão a aparecer principalmente no Centro.
Há argumentos contra o pedágio. Como o de que só os pobres seriam afetados pela medida. Ou o de que deveríamos investir em ônibus e metrô antes de uma medida tão radical. "Masquem tem renda baixa usa transporte coletivo, não será afetado", diz Malta. "E o investimento em ônibus e metrô é um complemento". Em Londres foi assim. Apesar de ter uma das maiores redes de metrô do mundo, a cidade recorreu ao pedágio. Em 2008, arrecadou com a cobrança o equivalente a R$ 420 milhões. O dinheiro é investido em transporte público. Estima-se que a implementação do pedágio em São Paulo custaria R$ 90 milhões à cidade. Uma expansão do metrô, como a que ampliará a rede paulistana de 61 para 240 km até 2010, sai por RS 20 bilhões. Esse é um dos poucos casos em que o produto mais barato pode ser também o mais eficiente.
Fonte: Revista Super Interessante (SP), setembro de 2009