Aporte de indústrias em controle de impactos na natureza cresceu 86% em 5 anos;setor de combustíveis se torna principal investidor
Desastres ambientais apontados como decorrência do aquecimento global, escassez de recursos naturais essenciais -como a água- e a alta do petróleo conseguiram alçar a preocupação com a preservação do ambiente ao posto de prioridade para a iniciativa privada, mais de uma década depois da Eco-92, marco da conscientização sobre o problema.
Do evento, realizado no Rio, surgiram iniciativas como o Protocolo de Kyoto (compromisso de redução das emissões de gases pelos países signatários) e combativas organizações não-governamentais.
O que diferencia a nova onda verde é a participação de um "novo" protagonista: a iniciativa privada. Investimentos em tecnologias limpas, economia de recursos, reciclagem e substituição de matérias-primas entraram na pauta de empresas como a AmBev, que, de 2001 a 2005, investiu R$ 260 milhões em gestão ambiental (manutenção e controle das estações de tratamento de água e efluentes e dos processos de reaproveitamento de resíduos).
Além disso, hoje a preocupação com a natureza é abordada no bojo da sustentabilidade, conceito que envolve também o impacto social da atividade econômica e a capacidade de sobrevivência da companhia.
Ou seja, a otimização do uso dos recursos na produção pode representar ganhos econômicos para a companhia. Por exemplo, para reduzir o uso de combustíveis não-renováveis, a AmBev substituiu parcialmente o uso de óleo -30 mil toneladas por ano- e de gás natural -2 milhões de metros cúbicos- por biomassa e biogás, o que evita a emissão de quase 100 mil toneladas de gás carbônico por ano e representa economia de R$ 5,7 milhões. Já o reaproveitamento de 96,7% dos resíduos sólidos economiza R$ 51 milhões.
Os tópicos que mais chamam a atenção dos empresários são preservação da biodiversidade, uso racional de energia e água e mudanças climáticas, diz o professor Cláudio Boechat, do Núcleo de Sustentabilidade e Responsabilidade Corporativa da Fundação Dom Cabral, que pesquisou 33 empresas.
Indicativos de interesse
Os indicativos do interesse do setor privado, aponta Boechat, são a consolidação de índices de sustentabilidade nas Bolsas de Valores -como o Dow Jones Sustentability Index, na Bolsa de Nova York, e o Índice de Sustentabilidade Empresarial, na Bovespa- e a participação de empresas na criação de uma norma ISO para empresas guiadas pela sustentabilidade.
No Brasil, o debate ganhou atenção em boa parte por conta da polêmica sobre a obtenção de licenças ambientais. Alguns setores, em especial o de infra-estrutura, vêem "entraves ao crescimento econômico" nos processos de liberação de grandes obras.
Hoje, há duas obras de usinas hidrelétricas paralisadas por questões ambientais, conforme a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica)."A legislação e o processo de licenciamento têm problemas, como foco excessivo em detalhes e análise restrita a fatores de impacto direto, mas são muito bons", avalia Rubens Mazon, professor de sustentabilidade da FGV (Fundação Getulio Vargas).
Mais investimentos
No Brasil, os dados mais atuais são os do IBGE, divulgados no mês passado. Conforme o estudo, o investimento em controle ambiental das indústrias passou de R$ 2,2 bilhões em 1997 para R$ 4,1 bilhões em 2002 -alta de 86,4%.
O número de empresas que aportam recursos nesse tipo de projeto subiu de 3.823 para 6.691, com incremento de 75%, num período em que o crescimento do total de companhias privadas foi de 26,4%.
Em 1997, o setor de alimentos concentrava os investimentos. Em 2002, o posto ficou com empresas industriais ligadas às produções de coque, álcool e combustíveis nucleares e ao refino do petróleo.
A lei é a principal razão desse empenho, diz Mazon. "Há exceções, mas a maioria das empresas ainda vê questões ambientais como custo -e não como investimento em sustentabilidade. Para elas, isso é problema do governo."
Outro responsável pela popularização do assunto foi o ex-vice-presidente americano Al Gore, que, no ano passado, emprestou seu prestígio à problemática ao lançar o livro "Uma Verdade Inconveniente" e o documentário homônimo (premiado com o Oscar neste ano), que apontam as conseqüências funestas do aquecimento global.
Neste ano, o interesse pelo tema alcançou outros líderes mundiais. A preocupação ambiental surgiu como segundo assunto mais importante do Fórum Econômico Mundial, realizado no mês passado em Davos, atrás apenas do crescimento econômico.
Neste mês, a ONU (Organização das Nações Unidas) convocou uma cúpula de emergência para tratar do aquecimento global. E, há poucos dias, os membros da União Européia concordaram em reduzir em 20% as emissões de dióxido de carbono até 2020.
Ação sustentável busca o "melhor para o futuro"
Cada vez mais recorrente, o termo "sustentabilidade" implica realizar o melhor para as pessoas, o ambiente e a empresa tanto agora quanto para o futuro indefinido. A sustentabilidade é o objetivo e responsabilidade social é o meio para alcançá-lo, diz Claudio Boechat, da Fundação Dom Cabral.
Para Ricardo Young, presidente do Instituto Ethos, falta às empresas brasileiras a costura entre práticas adotadas na produção, no fornecimento e na distribuição dos itens.
Fonte: Folha de São Paulo (São Paulo) 27 de fevereiro de 2007