Um cicloativista, empresário bem nascido, bem sucedido no mercado financeiro, está disposto a arriscar o capital ganho numa inovação imobiliária, baseada em experiências externas. Um microapertamento de 19m2 de área livre, na Vila Olímpia, antecipando-se aos propósitos da Prefeitura na revisão do Plano Diretor de aproximar moradia do trabalho e também moradia da faculdade, vivendo sem carro. É provável que consiga vender rapidamente o que lançar no mercado, mas terá que fazê-lo rapidamente, antes que algum concorrente aproveite a ideia e coloque produto similar à venda, a preços mais baixos, aproveitando o bem sucedido marketing do inovador.
A demanda mais provável é de jovens executivos médios que trabalham em escritório em prédios AAA, morando bem no subúrbio rico da Região Metropolitana, como Cotia, Alphaville e outros, e não está disposto a enfrentar todos os dias os congestionamentos da Rodovia Raposo Tavares ou da Castelo Branco. Durante a semana ficariam num apartamento compacto, mas bem suprido e arrumado, locomovendo-se ao escritório a pé, e podendo deixar o seu carro estacionado na garagem do edifício onde está o seu escritório. Seria uma alternativa a ficar num hotel. Não seria um "sem carro, por opção", mas um "sem uso do carro" no dia a dia, deixando de contribuir para os congestionamentos.
O valor do m2, da ordem de R$ 14.000,00, equivalente a cerca de US$ 6.000,00, fica dentro do padrão imobiliário da região, porém, com pequena metragem o preço global do imóvel ficaria menor. Alugado, considerando também o condomínio, o custo mensal ficaria em torno de R$ 2.500,00, ou de US$ 1.200,00. Mas, para aceitar essa condição de moradia, tem que adotar um padrão ou rotina de vida similar à de outras grandes cidades mundiais, sendo Nova York a cidade-paradigma para esse tipo de cidadão. Faz todas as refeições fora de casa, trabalha o dia todo e ainda sai para as baladas, tudo em locais próximos, acessíveis a pé. Ou de bicicleta, para os cicloativistas mais radicais.
A Vila Olímpia é talvez o bairro de São Paulo que ofereça as melhores condições para esse estilo de vida. Tem muitos escritórios, diversos restaurantes, de todos os padrões, cafeterias, shopping center, lojas de conveniência, tudo o que precisa para uma vida no padrão "novayorkino". E é um polo de baladas. O apartamento só serve para dormir e durante poucas horas. Nada mais que dormir. Tudo o mais é "feito na rua?.
A demanda existe, porém pode ser muito pequena. Os primeiros serão facilmente vendidos. Dado o sucesso, logo outros viriam e haveria um excesso de ofertas e uma queda de preços. A demanda inicial seria uma "bolha imobiliária" movida pela curiosidade que não se sustentará com a realidade. Quem comprou inicialmente não conseguiria revender nem pelo mesmo preço, ainda que o mercado local se valorize ainda mais.
Segundo o "press release" bem colocado na mídia, seria inspirado num padrão japonês, de Tokyo e não de Nova York. Só que o modelo japonês tem o espaço reversível, usado tanto como sala e estar, como dormitório: o solo é levantado numa plataforma e revestido por um tatami. Para receber pessoas ou conviver, senta-se no chão. À noite tira-se o "futon" e a roupa de cama do armário, para dormir. Não tem cama. Não é o padrão da planta de apresentação, que está nos jornais e não dará certo no Brasil, apesar da esperança nos novos padrões dos jovens descolados como o do empreendedor. Uma tentativa foi feita em projetos do Ruy Ohtake em casa com quartos minúsculos, destinados apenas para dormir, deixando espaços maiores na sala. A concepção era de que as pessoas passam menos tempo no dormitório do que na sala. O proprietário, quando resolvia sair da casa, não conseguia revender, a concepção desvalorizava o imóvel e o arquiteto desistiu da inovação.
O brasileiro, quando melhora de padrão de vida, quer dormir em espaços maiores. Mesmo o jovem descolado, depois que se casa e tem filhos, não dispensa o carro.
* Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica e foi contratado pelo SINDEPARK para desenvolver o estudo sobre a Política de Estacionamentos que o Sindicato irá defender. Com mais de 50 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.
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