O programa de campanha do prefeito reeleito Gilberto Kassab pinçou os pontos de maior impacto eleitoral, mas se baseia num plano para 2025, que no Brasil pode ser considerado longo prazo, mas ainda é médio prazo. Envolve quatro mandatos, o que significa que uma cidade que queríamos em 2009 deveria ter sido formulada pelo então prefeito eleito Paulo Maluf em 1992.
Embora Maluf não tenha definido um plano de longo prazo, estabeleceu rumos. Alguns continuados, outros revistos. Recapitulando os 16 anos anteriores para a projeção dos 16 anos futuros, podemos verificar que a questão não está nos rumos, mas nas prioridades e ênfases dadas às diversas dimensões. O que é natural, pois, dada a existência de demandas reprimidas, o que é preciso fazer é evidente - sem necessidade de grandes diagnósticos, cujos resultados dão o óbvio. A questão política está na escolha das prioridades.
Uma das demandas pior atendidas dentro da cidade é a da mobilidade. Que cresce com o aumento da população e o índice de mobilidade (viagens urbanas per capita). Aumentam demais as viagens (ou deslocamentos) motorizadas, o que resulta nos sucessivos e grandes congestionamentos.
O rumo perseguido pelos sucessivos governos municipais tem sido o de buscar o atendimento à demanda, com obras viárias e ampliação dos serviços de transporte coletivo. O Município iniciou a implantação do metrô, mas, depois que o passou à responsabilidade do Estado, deixou de investir. Concentrou-se nas obras viárias (rumo Maluf) e mais recentemente nos corredores de ônibus (rumo Marta). Agora com Kassab voltou a investir no metrô, com a promessa de seguir nesse rumo.
Um plano de longo prazo não significa apenas alongar os prazos do que se pretende fazer ou alcançar, mas consolidar rumos, a partir do entendimento das raízes dos problemas. Das causas originais.
A mobilidade urbana decorre, em primeiro lugar, da existência de uma população urbana e sua necessidade de movimentação.
Os governos municipais têm pouca interferência sobre a evolução demográfica, mas, para esses, a pressão demográfica vem diminuindo, seja pela redução da natalidade, como dos movimentos migratórios. Uma aceleração na redução fará com que 2014 seja o ano do pico da população da cidade, passando a partir daí a decrescer. Um cenário de redução mais moderada poderá levar esse pico para 2025. As estimativas indicam que o Município de São Paulo não passará de 12 milhões e, ao longo do tempo, os demais da RMSP (Região Metropolitana de São Paulo) terão população maior que a Capital.
A necessidade de movimentação urbana pode ser contida em função dos avanços tecnológicos, principalmente da tecnologia da informação. A movimentação de dados, por meios eletrônicos, economiza a movimentação de pessoas.
Trabalhos de escritório podem ser realizados em casa, com a transação de informações pela internet. As pessoas não precisam se locomover de casa para o escritório e vice-versa. Trabalhos industriais também podem ser realizados em casa, como o de facção nas confecções. O princípio, no caso, é de aumentar a movimentação de cargas, reduzindo a das pessoas.
A adoção desse conceito implica uma mudança na concepção das unidades imobiliárias. Que deveriam deixar de ser exclusivamente residenciais, para serem mistas, de moradia-trabalho. Rompe com o conceito ainda hegemônico de separação entre a casa e o trabalho.
A tecnologia da informação permite ainda o desenvolvimento de serviços básicos, à distância. Um deles é a aprendizagem à distância. Que não cabe na educação fundamental, mas pode ser desenvolvida nas atividades complementares e nos níveis mais avançados. Poderá ser um mecanismo para ampliar a inclusão educacional superior.
O grande avanço próximo está na saúde, mais especificamente na telemedicina. Os avanços são impressionantes, permitindo, por exemplo, a realização de cirurgias complexas assistidas à distância. O especialista não precisa estar na sala de cirurgia, mas pode orientar a cirurgia acompanhando por monitores e equipamentos como se lá estivesse.
Do ponto de vista da mobilidade urbana, a principal aplicação está nos exames laboratoriais, cada vez mais com o uso de equipamentos, como a ultra-sonografia, a tomografia, ressonância magnética etc. Os dados captados são transmitidos para um computador. Que pode estar a poucos metros de distância, ou a quilômetros. O médico especialista que analisa os dados não precisa estar junto ao paciente, mas em centros especializados. Há sempre o risco da perda do senso de humanidade. O que faz com que o seu uso não deva ser radicalizado.
O uso da tecnologia da informação é um dos meios para atender ao problema da mobilidade, reduzindo-a.
A estratégica pública e social deve se orientar no sentido da redução da mobilidade, com a redução das viagens, da redução das distâncias e a desmotorização das viagens.
Que, ao final, se traduz no aumento da movimentação a pé. A qual não pode ser tratada romântica e nostalgicamente.
Deve ser uma concepção básica do viver na cidade. Com a maior aproximação entre a moradia e o trabalho, entre a moradia e a educação, os serviços médicos, entre a moradia e os locais de compra. Quanto maior o uso misto do solo, melhor seria para a cidade. Não o é, em absoluto. E os prós e contras devem ser amplamente discutidos.
A proposta de um plano com horizonte amplo (2025) é uma grande oportunidade para a discussão pela sociedade do modelo de cidade em que quer viver.
E a necessidade maior ou menor de estacionamentos decorre desse modelo.
* Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica do Sindepark. Com mais de 40 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.