O chamado realinhamento viário, necessário para o alargamento das vias que receberão os futuros corredores, foi aprovado pelos vereadores no início de junho e pode provocar a desapropriação de 7 mil imóveis pela cidade. Parte deles está em avenidas importantes, como Celso Garcia, na zona leste, e Moreira Guimarães, na zona sul. O plano de Haddad é entregar 150 km de vias exclusivas para ônibus até 2016.
Desenhados pelas Secretarias de Desenvolvimento Urbano e de Transportes, os traçados visam a possibilitar obras nos canteiros centrais das avenidas contempladas pelo projeto. Nessas vias, as calçadas deverão ser ampliadas, o que, de acordo com a região, vai demandar uma verdadeira "varredura" em algumas quadras.
É o que pode acontecer, por exemplo, em trechos da Avenida Washington Luís, nas proximidades do Aeroporto de Congonhas, na zona sul. Caso a nova legislação seja aplicada, parte do imóvel onde funciona há 26 anos o motel Disco Verde, na Chácara Flora, terá de ser desapropriado. No entorno dele, lojas de móveis, concessionárias e residências também estão na mira da Prefeitura.
Gerente de uma fabricante de móveis localizada na frente do motel, Tatiana Lago, de 29 anos, não sabia que o imóvel onde trabalha corre risco de sumir do mapa. "Ninguém por aqui sabe disso. Imaginávamos que a mudança pararia na implementação da faixa de ônibus, que, por sinal, já atrapalha bastante o comércio", afirma. Segundo ela, os clientes reclamam que não têm onde estacionar. "Mas, pelo visto, as coisas ainda podem piorar", completou.
Durval Guerra Júnior, de 33 anos, tem uma loja de som automotivo na mesma avenida e reclama da postura da gestão Haddad. "Aqui tem espaço de sobra para não mexer nos estabelecimentos. Se vierem desapropriar, não importa o preço que oferecerem, vamos nos manifestar na Justiça", afirmou.
Religião
Bem longe dali, na Avenida Celso Garcia, zona leste, muitos imóveis também são cortados pelo novo alinhamento viário. O traçado previsto para a via, porém, revela que algumas quadras foram quase que totalmente "protegidas". Elas servem de endereço de grandes templos evangélicos, como uma unidade da Assembleia de Deus e o Templo do Salomão, construído pela Igreja Universal do Reino de Deus.
Em ambos os casos, a Prefeitura não prevê desapropriação para viabilizar o corredor. Não é o que deve acontecer com os sobrados, lojas de roupas, lanchonetes e agências bancárias que ficam a poucos metros de distância dos templos.
Para o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Mello Franco, os estabelecimentos têm pesos diferentes. "A importância de um motel e de uma igreja é bem distinta", afirmou, ao explicar o motivo de o alinhamento desviar de igrejas e cortar estabelecimentos comerciais, como um motel. Segundo ele, seria difícil desapropriar um grande templo, de intensa circulação.
"São Paulo já está feita, e muito malfeita. Infelizmente, para dar o mínimo de estrutura, vamos ter de retirar alguma coisa", completou o secretário. Franco ainda assegurou que os traçados, apesar de parecerem "curiosos", respeitam a lógica. "Não é uma política de terra arrasada, é de conserto com relação às geometrias atuais, que não são totalmente racionais."
Fonte: O Estado de S. Paulo, 21 de julho de 2014