A classe média, tanto a tradicional como a nova, tem preferido o trânsito de massa ao transporte coletivo de massa.
A massa do trânsito é de veículos numa mesma via, provocando os congestionamentos. Mas os motoristas sentem-se mais cômodos sentados dentro do seu carro, ouvindo música ou o noticiário. Alguns até dispõem de ar condicionado. Apesar de ficarem parados no trânsito, muitas vezes com irritação, o preferem em vez da massa de gente nos carros ou ônibus do transporte coletivo de massa.
O metrô é a grande ilusão que permeia o imaginário popular: há muitos que acham que com o metrô, supostamente um transporte coletivo de massa de qualidade, eles poderão deixar o carro e usá-lo. Vã esperança. Os que precisam usar o metrô no horário de pico buscam sair dele o mais rápido possível, passando para o carro. Ou, para quem ainda não tem essa alternativa, para a motocicleta.
Por mais que se usem as experiências externas, o fato é que transporte de massa é contraditório com qualidade. Uma das qualidades essenciais do meio de transporte é o conforto. Esse item supera em muito a velocidade ou o tempo de viagem. Para alguns o fator custo pesa.
Alguns motoristas estariam dispostos a pagar mais pelo transporte coletivo, porém, a sua socialização impede. Assim como a alternativa de discriminação, com carros diferenciados de primeira e segunda classe como já odiosamente ocorreu no passado.
O transporte coletivo de massa não tem condição de substituir o trânsito de massa. Com a operação de novas linhas metroviárias em São Paulo, a maioria das transferências será do ônibus para o metrô. Haverá transferências do carro para o metrô, mas provavelmente em níveis próximos ou até menores que a entrada de novos carros em circulação.
O acesso da classe média emergente ao carro tem gerado mudanças no perfil do trânsito de massa em São Paulo e irá ocorrer em outras cidades, se é que em algumas também já não ocorreu. Da região do Morumbi em direção ao centro, o trânsito era tranquilo até às 7h00 da manhã, com exceção da Av. Rebouças, mesmo assim transitável. Depois das 9h00, quando o "Morumbi acorda", as vias de acesso ficavam todas congestionadas. Agora as vias ficam congestionadas antes das 7h00, com essas já lotadas de carros antes do Morumbi. No corredor da Av. Francisco Morato, vindo de Campo Limpo, do Taboão da Serra, do Embu e mesmo de Itapecerica.
A linha amarela do Metrô ainda tem qualidade para quem toma o carro na estação final Butantã. Já não tem na estação da Av. Faria Lima, depois de ter passado pela estação Pinheiros, onde há a integração com a linha da CPTM, que liga duas grandes periferias da região metropolitana. O público da estação Faria Lima já é de classe média acima da emergente, mas a lotação anterior os afasta, a menos fora do horário de pico. O mesmo ocorre na linha leste com a estação Tatuapé, onde há um grande público de classe média, mas que testou ou tentou testar e desistiu porque nem consegue entrar nos carros. Por mais preconceituosa e discriminatória que seja, a concepção de linhas metroviárias para atender às massas não será de qualidade efetiva, capaz de promover a transferência do carro para aquele meio. Continuará por "saecula saeculorum" no imaginário elitista (porque popular não é). Não só em São Paulo, como no Recife, e em Brasília. Neste, a classe média que se instalou em Águas Claras voltou ao carro, porque os trens já passam cheios na estação, vindo tanto de Samambaia como do outro ramal.
A substituição não sendo compensatória, entre os que deixam o carro para usar o transporte coletivo e os que saem do transporte coletivo para o carro, diante das dificuldades daquele e das facilidades de aquisição do carro, permanece ou aumenta a questão dos estacionamentos.
A mudança do perfil dos viajantes urbanos, com a transferência de parte da classe média tradicional para o metrô ou do "tipo", e aumento da classe média emergente terá impactos sobre os estacionamentos. Os primeiros usavam os estacionamentos pagos como opção. Passando para o metrô, reduzem a demanda nos locais de destino. Por outro lado, os novos não teriam recursos para pagar os estacionamentos, buscando solução nas vias públicas. Encontrando dificuldades nos locais próximos, vão se espalhando, reduzindo os espaços para os fluxos.
Se houver maiores restrições para os estacionamentos gratuitos em vias públicas, essas pessoas deixarão de usar o carro para o seu deslocamento diário? Provavelmente sim, e voltariam ao transporte coletivo. A questão dos estacionamentos junto às estações do metrô é mais grave nos pontos de destino do que de origem. Estacionamentos gratuitos em vias públicas próximas a essas estações atraem o carro. Estacionamentos pagos e caros junto a essas mesmas estações afastam os usuários dos carros e favorecem o transporte coletivo.
* Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica e foi contratado pelo SINDEPARK para desenvolver o estudo sobre a Política de Estacionamentos que o Sindicato irá defender. Com mais de 50 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.
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