A preferência pelos deslocamentos nas cidades por automóvel, em vez do transporte coletivo, tem como uma das razões principais a possibilidade de realizar essa movimentação "porta a porta", saindo da garagem na mesma edificação onde se mora e chegar ao local de destino, seja para trabalho, compras, educação, saúde ou outra finalidade deixando o carro estacionado num local próximo, completando o trajeto a pé ou de elevador. Com a verticalização, um dos principais modos de transporte coletivo, embora não captado pelas estatísticas de mobilidade, é o elevador. A viagem é feita, na sua maior parte, por automóvel e complementada a pé.
O que aconteceria nas grandes cidades se o usuário do carro não dispusesse de uma vaga para estacionar o carro próximo ao seu destino, sendo obrigado a longos trajetos que requereriam o uso de um meio de transporte?
Podemos considerar quatro reações e comportamentos alternativos do motorista. Três seriam de continuar indo de carro até uma vaga, ainda que distante do seu destino, e:
- seguiria o seu trajeto a pé, dispondo-se a andar a mais de 2 km, seja por economia, seja sob a racionalização de fazer um exercício necessário;
- passaria para um transporte individual, seja uma bicicleta, se houver disponibilidade, ou um táxi;
- buscaria um transporte coletivo para completar a sua viagem; ou
- deixaria o carro em casa, passando já para o transporte coletivo.
Uma quinta alternativa seria ir de carro até a estação (ou ponto) do transporte coletivo, seguindo por esse.
Na expectativa de mudança de comportamento do motorista para a quarta ou quinta alternativa, os "anticarro" querem proibir ou restringir os estacionamentos junto aos locais de destino, invertendo a lógica e as políticas atuais. Estas exigem que as edificações usadas para destino (escritórios, lojas, consultórios, escolas e outros) tenham uma quantidade mínima de vagas, de forma a evitar que os carros fiquem estacionados na via pública. Supõe-se que não havendo facilidade de vagas nas proximidades do seu destino, sendo as pessoas obrigadas a longos percursos a pé ou a se utilizarem de outro meio de transporte, deixariam de ir de carro, passando a usar meios coletivos.
A maior mudança provável não seria por nenhuma das alternativas anteriores, mas a de mudar de local de destino, onde os motoristas tivessem facilidade de estacionar o seu veículo, próximo ao destino final. Uma das mudanças seria - desde que possível - mudar-se para próximo do local de trabalho, usando a vaga de moradia para deixar o carro e fazer o trajeto até o trabalho a pé ou de bicicleta.
Isso poderá ser feito em muitas cidades, mas não em Brasília. Na capital federal, os empregos estão concentrados no plano piloto e mais especificamente na Esplanada dos Ministérios. A cidade foi planejada com a segregação dos locais de moradia e de trabalho. Levar os edifícios comerciais que abrigam os trabalhos para junto dos locais de moradia seria difícil pela reação dos moradores, mas poderia ser feita pela verticalização maior das entrequadras. No entanto, não haveria garantia de que os moradores das respectivas quadras fossem trabalhar nesses locais e também que os trabalhadores nesses imóveis tivessem condições de morar nas proximidades.
Colocar moradias junto aos centros comerciais também - em tese - seria possível, pelo menos do ponto de vista da engenharia. Mas quem iria morar lá? Os custos seriam compatíveis para os trabalhadores de menor renda?
As teses são bonitas, mas a sua efetivação não é nada simples.
* Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica e foi contratado pelo SINDEPARK para desenvolver o estudo sobre a Política de Estacionamentos que o Sindicato irá defender. Com mais de 50 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.
NOTA:
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