Uma política pública de (ou para) estacionamentos, segundo a perspectiva do trânsito, deve ter como diretriz básica a internalização nos imóveis das vagas para estacionamento dos veículos.
A via pública deve ser destinada prioritariamente para o trânsito de veículos e não para o estacionamento dos mesmos.
Essa diretriz fundamenta a exigência de uma quantidade de vagas por imóvel, como regra geral, e específicas no caso de Pólos Geradores de Tráfego. Exigência para aprovação das plantas e concessão de Habite-se.
Não tem sido suficiente para garantir uma oferta adequada de vagas internas, evitando os estacionamentos na via pública, por diversos motivos:
- a primeira é o aumento do índice de motorização das famílias, no caso de residências e das características do trabalho:
- há um aumento da motorização por m2 de escritórios, em função da graduação dos trabalhadores, voltados para atividades de serviços, de maior uso intelectual e, conseqüentemente, de maior renda e maior propriedade de automóveis;
- isso faz com que alguns índices estejam subavaliados e a demanda efetiva seja muito superior à oferta, incluindo os visitantes;
- a segunda está na possibilidade de indicação de vagas fora do imóvel para atender aos índices:
- pode ocorrer que as mesmas vagas sejam indicadas para mais de um empreendimento;
- as vagas oferecidas em terrenos podem ser eliminadas pela construção de edifícios no local, sem que sejam oferecidas novas, em compensação;
- a fiscalização é insuficiente para verificar o cumprimento das obrigações.
- a terceira e, mais importante, está nos preços cobrados nos estacionamentos internos.
Isso tem se verificado em dois dos principais Pólos Geradores de Tráfego: os hospitais e faculdades.
Ainda que na aprovação da construção da edificação sejam oferecidas vagas suficientes, a cobrança pelo estacionamento faz com que os usuários prefiram deixar os seus automóveis na via pública. Com os "flanelinhas" tomando conta.
Um fenômeno urbano ocorre com os shopping centers e hipermercados. Seja por conta das exigências regulatórias, como pela concorrência do mercado, esses grandes estabelecimentos comerciais criam grande quantidade de vagas, oferecidas, inicialmente, sem cobrança, pela facilidade. É uma condição para atração do público. Uma vez conquistado, passam a cobrar pelo estacionamento e a conseqüência imediata é a ocupação das vias públicas no entorno.
A instalação de um shopping center tem capacidade de desenvolver a área em torno, com novas lojas, restaurantes, edifícios residenciais e comerciais, que se aproveitam do estacionamento gratuito do shopping. Quando esse começa a cobrar o estacionamento, até como forma de desestimular os "invasores", esses buscam alternativas na via pública.
Cada qual quer ter a facilidade de um estacionamento junto ou próximo ao destino, preferencialmente, sem o pagamento pelo uso da vaga. As pesquisas mostram que o principal motivo do demandante do estacionamento é a proximidade com o destino. Se encontram uma vaga na via pública, estacionam. Alguns, mesmo quando proibida. Assumem o risco, contando com a deficiência da fiscalização.
Outros estão dispostos a pagar pela segurança e comodidade e aceitam até mesmo desembolsar um custo adicional pelo uso de serviços de valet.
Outros buscam um preço menor e, se possível, o gratuito (ou quase gratuito, no caso dos "flanelinhas") na via pública, percorrendo a pé uma distância maior.
Internalizar as vagas é desejável, mas as exigências urbanísticas não são suficientes, pelos motivos acima indicados.
Os preços são um elemento importante no funcionamento do sistema, mas é discutível se uma gestão de preços pode ser incluída numa política pública. Os serviços internos de estacionamento são atividades tipicamente privadas, com preços definidos pela dinâmica do mercado.
Será que cabe ao Poder Público interferir nessa dinâmica, seja para subsidiar determinadas operações de forma a evitar o estacionamento na via pública, ou promover aumentos, como forma de inibição ou seletividade?
Digo que não, mas há os que entendem ser o estacionamento um serviço de interesse público, cabendo ao Poder Público regular a sua cobrança. Um caso concreto ocorre na Bahia, com a proibição de cobrança no estacionamento do novo Shopping Salvador, lotado com os empregados dos edifícios vizinhos.
*Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica do Sindepark. Com mais de 40 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.