Por Jorge Hori*
As garagens em edifícios comerciais se transformaram num importante negócio imobiliário no qual prestadores de serviços de estacionamento geram receita, apresentam baixa vacância e garantem rendimento seguro aos investidores.
Ao longo das últimas décadas anteriores à atual, o "boom" imobiliário na cidade de São Paulo gerou um grande volume de edifícios para escritórios e afins, todos com amplas garagens, aproveitando uma vantagem proporcionada pelas leis urbanas, particularmente a de zoneamento.
O gasto do investimento com a incorporação de edifícios comerciais envolve o valor do terreno e o custo da construção. Embora ambos se refiram à metragem, o valor do terreno não é dado pela superfície do solo, mas pelo potencial construtivo. Ou seja, pela metragem construível, segundo o chamado coeficiente de aproveitamento. Pela lei, pode ser de duas até quatro vezes. Portanto, se num terreno de 1.000 mpode ser edificado um prédio de 2.000 m2e o metro quadrado é - aqui apenas para efeito de demonstração - de R$ 10.000,00, o terreno entra com um valor de R$ 20.000.000,00. Se a legislação permitir construir quatro vezes, ou seja, 4.000 m2, o valor do terreno passaria a R$ 40.000.000,00. Assumindo também um custo médio de construção de R$ 1.000,00 o m2, o custo total seria de R$ 4.000.000,00, elevando o Capex (capital expenditure, em português, despesas de capital ou investimento em bens de capital) para R$ 44.000.000,00.
Parte do valor a mais decorrente do aumento do coeficiente de aproveitamento deve ser repassada para o Município como outorga onerosa do direito de construção.
A legislação anterior permitia que se pudessem construir áreas de garagem não computadas no limite do coeficiente de aproveitamento. A política urbana era de estimular a oferta de vagas de estacionamento em edifícios, de forma a reduzir a demanda nas vias públicas.
Com 50% a mais de construção, com garagens o incorporador aumentaria o volume de área locável, com um investimento adicional apenas do custo da construção e sem custo adicional do terreno.
O estímulo foi eficaz e a cidade aumentou substancialmente o volume de áreas de garagens, dentro dos edifícios comerciais.
Porém, diferentemente da locação de salas - que são em blocos maiores e por um certo período de tempo, o proprietário pouco gasta com a gestão da área, a não ser com a cobrança e vistorias de tempo em tempo -, nas garagens o proprietário tem a oportunidade de elevar a sua renda, com a utilização dos espaços por curto prazo e alta rotatividade.
Uma alternativa básica é construir o espaço, demarcar e deixar aos condôminos o uso com autoestacionamento, como ocorre na maioria das garagens dos edifícios residenciais.
Dada, no entanto, a ocorrência de um grande volume de população flutuante nos edifícios comerciais, empresas de estacionamento ofereceram aos proprietários um serviço de estacionamento, de curta permanência, caracterizado como avulso, gerando receita adicional, com contrapartida em custos operacionais com cobranças, segurança, vaga gratuita para os condôminos e outros. Em muitos casos as empresas de estacionamento passaram a oferecer serviços de manobristas. Com isso o usuário passou a ganhar em comodidade e a pagar por isso.
Com a carência de estacionamentos em vias públicas, reduções sucessivas para aumentar as área de fluidez do trânsito e a persistência de muitos em manter o uso do carro para as suas movimentações cotidianas, a demanda por vagas de estacionamento em edifícios comerciais manteve-se crescente.
E cada novo edifício criava a sua própria demanda.
Uma parceria bem-sucedida, com demanda crescente, produziu uma inflação de valores locatícios. Os aluguéis subiam, os estacionamentos repassavam os aumentos no valor da hora estacionada e os usuários continuavam usando.
A concorrência entre as empresas contribuía para os aumentos. Se um operador não aceitava os aumentos, o concorrente aceitava. Os lances foram subindo e a felicidade era geral. Só os usuários reclamavam sempre, mas continuavam usando. A comodidade oferecida justificava o pagamento.
Mas aí o belo dia, cheio de sol e vento fresco, virou com a chegada da tempestade. Com ventania, trovões, raios e chuva forte.
A crise econômica é o elemento fundamental. Com agravamento sucessivo, reduzindo a capacidade de consumo das pessoas. O setor já passou por outras crises, mas de menor duração, e se recuperou. A mortandade empresarial foi pequena.
Desta vez não. Será maior.
E muitos ainda não se deram conta da doença que os aflige. Mas eles mesmos foram responsáveis pelo "monstro" criado que agora está fenecendo.
A estratégia de repassar os sucessivos aumentos de aluguel para a tarifa de estacionamentos avulsos gerou muita reclamação, mas efetivação dos pagamentos. Na prática o usuário aceitos os preços altos.
Agora que o usuário não quer mais pagar os mesmos preços, seja por conta da crise, mas porque tem alternativa de menor custo para chegar de carro aos locais desejados, como o uso dos aplicativos, os locadores relutam em reduzir os preços. Por encontrarem quem está disposto a pagar os valores mais elevados. Mesmo que seja o "zezinho parking" operando informalmente, sem os devidos pagamentos tributários e previdenciários.
Sem o equacionamento do desequilíbrio estabelecido entre as duas pontas, o setor de estacionamento pago se debilitará e os locadores ficarão com espaços cada vez mais vazios.
O resultado serão "garagens-fantasmas".
* Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica e foi contratado pelo SINDEPARK para desenvolver o estudo sobre a Política de Estacionamentos que o Sindicato irá defender. Com mais de 50 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.
NOTA:
Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do SINDEPARK.