Com a segunda maior frota de automóveis do mundo, 6 milhões de veículos, São Paulo avança rumo a um colapso em seu sistema viário. E, mais grave, a tendência não é nada animadora. Na última década, a frota paulistana aumentou 2,5 vezes mais do que a população. São licenciados diariamente 800 automóveis na cidade, número superior à média de 500 nascimentos por dia. A frota nacional também está em franca expansão. Nos últimos dez anos, passou de 30 milhões para 50 milhões de veículos.
Urbanistas e engenheiros de trânsito, ouvidos por Carta Capital, indicaram cinco alternativas mais drásticas que a capital paulista poderia adotar para evitar o caos. Mais do que mero exercício intelectual, medidas extremas como essas são cada vez mais necessárias. A seguir, uma discussão, ponto a ponto, da viabilidade dessas propostas.
Cinco vezes mais corredores de ônibus
Em muitos pontos da cidade, não vale mais a pena aumentar a frota de ônibus em circulação. Inevitavelmente, eles ficariam parados no trânsito. De acordo com o Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de São Paulo, a velocidade média dos ônibus na cidade é de 12 km por hora, metade da média de 20 anos atrás. Para garantir maior agilidade aos ônibus, é inevitável tomar parte do espaço disponível aos carros para a criação de novos corredores exclusivos e vias preferenciais. "A população só deixará o automóvel quando o ônibus for mais rápido e oferecer conforto aos usuários", explica o consultor Paulo Sérgio Custódio. "Em São Paulo, todas as expectativas repousam sobre o Metrô, mas os usuários precisam chegar até as estações de alguma forma. Um corredor de ônibus de alto desempenho pode ser tão eficiente e confiável como um trem", comenta Custódio.
Proibição do estacionamento nas ruas
Ponto raramente mencionado no discurso dos gestores públicos, os estacionamentos em vias públicas têm um peso nada desprezível nos congestionamentos. O espaço ocupado pelos carros parados poderia permitir a circulação de outros veículos ou mesmo a delimitação de vias preferenciais para a passagem de ônibus. Essa é a razão que levou algumas capitais européias, a exemplo de Londres, a proibir o estacionamento diante das calçadas em extensas áreas, em geral no centro.
Como contrapartida, o engenheiro Eric Ferreira, coordenador do Instituto de Energia e Meio Ambiente, uma ONG dedicada à mobilidade urbana, defende a construção de bolsões de estacionamento próximos a terminais de ônibus, estações de trem e de Metrô.
Pedágio no centro da cidade
O pedágio urbano é, talvez, a medida mais polêmica. Os defensores argumentam que o mecanismo poderá reduzir o número de veículos no centro da cidade e gerar recursos para investir em transporte coletivo. Os opositores criticam a falta de alternativas de transporte e o fato de pesar mais para os de menor renda. Londres, Oslo, Estocolmo e Cingapura já adotaram o mecanismo.
Num debate realizado em julho de 2007, na Austrália, o secretário-geral do Fórum Internacional do Transporte, Jack Short, apresentou os avanços obtidos nessas capitais. Londres registrou queda de 30% na circulação de carros no centro. As viagens de ônibus e bicicletas aumentaram 20%. E os atrasos atribuídos aos congestionamentos caíram 30%. Em Estocolmo, o fluxo de carros caiu 22% no período de testes. Kassab rejeitou a possibilidade de a Prefeitura adotar a medida durante sua gestão.
Tarifa zero no transporte coletivo
No início da década de 90, o então secretário municipal dos Transportes, Lucio Gregori, apresentou o projeto de tarifa zero para os ônibus à Câmara, que foi rejeitado. Na avaliação de Gregori, a tarifa zero é um diferencial imbatível para fazer os paulistanos abandonarem os carros e migrarem para o transporte coletivo. "A intenção da Prefeitura era aumentar o IPTU nas áreas mais valorizadas da cidade para bancar o custo", explica.
Limite ao licenciamento de carros
Talvez a solução mais drástica para conter a proliferação dos carros tenha sido a adotada em Cingapura. Além de criar elevadas tarifas para a aquisição de veículos, o governo instituiu o Certificado de Propriedade (COE, na sigla em inglês). Trata-se de leilão de licenças que limita o número de automóveis na cidade-Estado, uma ilha com pouco mais de 4,6 milhões de habitantes.
O sistema é semelhante ao aplicado aos taxistas do Brasil, que possuem um número limitado de placas para rodar. "Trata-se de uma medida muito dura, mas necessária. Em Xangai, por exemplo, um trajeto de 15 km pode levar mais de três horas e meia", comenta o engenheiro Paulo Sérgio Custódio, hoje em Pequim, na China, onde dá consultoria em projetos locais.
Fonte: Revista Carta na Escola (SP), maio de 2008