"Quem quer que seja o próximo prefeito, terá de olhar para esse dado, fazer uma política inteligente e tentar reduzir a desigualdade no uso das vias", diz Thiago Guimarães, especialista em mobilidade e professor da Universidade Técnica de Hamburgo, na Alemanha.
O levantamento foi feito pela reportagem com base em dados inéditos da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), obtidos com exclusividade. No quadro ao lado, é possível visualizar um retrato do trânsito na hora do rush. Trata-se da média da contagem de circulação ao longo de uma extensão total de 255 km. São as 32 rotas principais da cidade - algumas delas, com corredores de ônibus, caso das avenidas Rebouças e Santo Amaro. Depois, os veículos foram dispostos de acordo com o padrão adotado pelos engenheiros de trânsito (1 ônibus = 2 carros = 4 motos).
Segundo pesquisa do IBGE encomendada pela Rede Nossa São Paulo, no ano passado 82% dos paulistanos afirmaram que deixariam de usar o carro se tivessem uma boa alternativa de transporte público.
A Lei de Mobilidade Urbana, política federal para os transportes que entrou em vigor em abril, coloca a equidade no uso do espaço público como uma das diretrizes do planejamento. Para especialistas, criar dificuldades para os carros e facilidades para o transporte coletivo é a receita para resolver o problema crônico de trânsito da cidade.
Uma dessas dificuldades é restringir a circulação, lançando mão de medidas como o pedágio urbano e a redução de estacionamentos.
O prefeito Gilberto Kassab já declarou que São Paulo só pode aumentar as restrições aos veículos quando tiver linhas suficientes de metrô. Ao mesmo tempo, tramita na Câmara dos Vereadores um projeto de lei que cria a cobrança.
Preconceito
Por isso, embora a solução pareça tecnicamente simples, ela se mostra mais complicada política e culturalmente. "São Paulo tem classes média e alta elitizadas que acham que o ônibus não é para elas. Que é coisa de ralé", afirma Thiago Guimarães.
Por outro lado, o serviço oferecido pelos ônibus não tem nem qualidade nem velocidade suficiente para atrair mais pessoas, afirma. A velocidade média dos ônibus nos corredores da cidade foi de cerca de 15 km/h no horário de pico em 2011.
Para Flamínio Fichmann, urbanista especializado em transportes, "diminuir, com corredores bem projetados, o tempo de viagem dos ônibus pela metade teria o mesmo efeito que dobrar a frota". Com mais eficiência, o mesmo ônibus poderia fazer mais viagens por dia, levando mais gente.
Os corredores eficientes e velozes de que falam os especialistas tomariam parte do espaço dos carros por possuírem características que atualmente não são aplicadas em conjunto na cidade: têm espaço na pista para ultrapassagem nos terminais, pagamento do bilhete antes do embarque e parte dos cruzamentos com passagem sob a pista.
Para a gerente de planejamento da CET, Daphne Savoy, "incomodidades" do transporte coletivo, como o tempo de espera pelos ônibus e as trocas de veículos nos terminais, levam à opção pelo carro, que é um transporte "porta a porta".
"O transporte coletivo nunca vai lhe pegar em casa e deixá-lo onde você quer." Além disso, diz a gerente, "em qualquer país do mundo, você não tira o carro da pessoa. É uma coisa intrínseca, um objeto de desejo de qualquer ser humano".
Fonte: Folha de S. Paulo, 12 de agosto de 2012