Ao menos é o que pensam especialistas na área de transporte e urbanismo. Para eles, a ocupação do espaço público por veículos particulares está relacionada a uma série de fatores.
Um deles é a falta de um sistema de transporte público de qualidade. "Sem conforto e segurança, a classe média tem optado pela compra do carro, que facilita o seu deslocamento", analisou o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Oswaldo Lima Neto.
Amélia Reynaldo, professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), atenta para o crescimento da frota da capital.
Nos últimos 15 anos, o crescimento anual médio ficou m 5,97% e a frota da capital ultrapassou em março os 407 mil veículos. "O transporte público precisa criar condições para atrair a classe média. Mas percebemos o contrário. Os ônibus com ar-condicionado praticamente desapareceram", exemplificou.
A seu ver, é necessário planejar melhor a cidade. Não apenas no campo do transporte, mas na ocupação do solo. "O que vemos são prédios cada vez com maior número de apartamentos, que se reflete no fluxo de veículos de algumas vias", pontuou.
Para ela, os terrenos estão sendo utilizados em demasia pelas construtoras, com o aval do poder público. Sem planejamento, Amélia Reynaldo e Oswaldo Lima Neto enxergam nos planos diretores, uma luz no fim do túnel. "A legislação não tem acompanhado o ritmo de crescimento da cidade", avaliou Oswaldo.
Segundo ele, o problema pode ser visto especialmente no Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes. O especialista acentuo ser preciso repensar o número de garagens para as famílias de classe média, que vêm aumentando o poder aquisitivo.
Do mesmo modo, os professores afirmam que sem o aprimoramento das leis de uso e ocupação do solo, o problema tende a se ampliar. "Existem vários sinais disso. Algumas ruas e avenidas já estão saturadas, sendo preciso inibir a construção de grandes edifícios", completou Oswaldo.
O plano diretor do Recife, finalizado há cerca de um ano, está sendo analisado pela Câmara de Vereadores.
Para Amélia Reynaldo, a resolução do problema passa por um amplo debate. "Os estacionamentos em vias, como mostram cidades como Barcelona, não significam caos. Falta planejamento. Repensar aspectos do trânsito, do transporte e do traçado urbanístico da cidade", resumiu.
A professora inclui no rol de problemas até as faixas amarelas pintados nos meio-fios. "Elas são essenciais, mas talvez estejam em lugares desnecessários", ilustrou, salientando que a permissão de estacionamentos pode dinamizar determinados pontos das cidades.
Problema tem solução?
As saídas para algumas ruas, com duplo estacionamento, já começam a ser planejadas pela Companhia de Trânsito e Transportes Urbanos (CTTU).
Segundo o diretor de projetos, Manoel Damasceno, a lista de possíveis alterações incluem a rua Rui Batista, em Boa Viagem, onde estabelecimentos comercias e moradias sofrem os efeitos do excesso de carros. "Cada caso está sendo discutido em separado, pois é preciso analisar aspectos como o comércio", disse.
Os estudos para desafogar o tráfego passam também pela Rua Ada Vieira, em Casa Forte, onde moradores reclamam de dificuldades até para entrar nos prédios. "Trafegar por aqui é um desafio", desabafou o motorista Reginaldo Alves, 38.
As reclamações têm sentido. A rua possui apenas seis metros de largura, mas é permitido estacionar carros dos dois lados da via.
Uma das saídas, adiantou Damasceno, é transformá-la em mão única, criando um binário na área. Soluções estão sendo analisadas para a Rua Padre Lemos, em Casa Amarela.
A exemplo da Rua do Futuro, a Padre Lemos mede apenas oito metros e é tomada por estacionamento. Para a Rua do Futuro, a CTTU planeja uma campanha de sensibilização dos motoristas.
A longo prazo, a prefeitura analisa a implantação de edifícios-garagem. Segundo a diretora municipal de Urbanismo, Maria José de Biaze, um grupo técnico vê a possibilidade de transformar imóveis antigos em edifícios-garagem e ainda estuda formas para incentivar a iniciativa privada a investir nesse tipo de imóvel. "A preocupação maior é com o centro expandido da cidade, onde os bairros são antigos e os imóveis quase sempre não têm vagas de garagem", considerou.
O centro expandido se estende da Avenida Agamenon Magalhães ao Marco Zero. Maria José entende que, aliada às ações de planejamento, se faz necessário assegurar as mudanças previstas no plano diretor, que reduziriam o impacto do adensamento em alguns bairros e despertar na população a consciência de que é preciso respeitar as regras do trânsito. "Para resolver problemas particulares, como ir a um banco, algumas pessoas não se inibem em infringir as leis para ganhar tempo", justificou.
Fonte: Diário de Pernambuco (Recife), 29 de abril de 2007