Como gerenciar um ativo intangível como sustentabilidade? Como definir relações entre responsabilidade social, crescimento, consolidação de marca, excelência e práticas de gestão?
Será que responsabilidade social está apenas na discussão ou já está enraizada nas práticas e negócios das empresas? Qual é o papel das corporações na construção de uma sociedade mais justa e na preservação do meio ambiente?
Esses são alguns questionamentos que oito profissionais se propuseram a discutir no encontro promovido pela Consumidor Moderno, cujo tema era "Sustentabilidade Corporativa e Impacto nos Negócios das empresas".
A grande discussão se formou no contraponto dos interesses entre sustentabilidade versus crescimento. Será que realmente esses pontos competem entre si? Jaime Troiano, sócio-diretor da Troiano Consultoria e Estratégia, levantou a questão. "Inserir o conceito de sustentabilidade em uma corporação dá a impressão de que se irá inibir o processo de crescimento, pois se cria novos focos de preocupação. Como conciliar a idéia de sustentabilidade com a necessidade de crescimento?".
A definição de sustentabilidade já é uma resposta para a indagação. " Um mundo sustentável é um mundo equilibrado, nos aspectos sociais, ambientais e econômicos. Um mundo com planejamento, para que as futuras gerações dêem continuidade, por isso não pode ser uma visão imediatista, não dá para pensar em crescimento imediato sem conseqüências.
A pergunta é: O que a minha empresa está fazendo vai causar que tipo de impacto daqui a 20,30 anos?", reflete Leno Silva, gerente de comunicação do Instituto Ethos.
E é exatamente por essa visão imediatista social chegou com tanta urgência. O modelo de crescimento adotado pelas empresas precisa realmente ser revisto. Rosa Alegria, diretora executiva do Mercado Ético, define sustentabilidade como sobrevivência. "É preciso redefinir o conceito para sobrevivermos. Existe um sentimento de urgência muito grande e não é apenas uma questão de se perguntar o que podemos fazer. É preciso mais, fazer a diferença".
Rosa defende que há um "fetichismo monetário" no qual as empresas só pensam em crescimento e lucro no curto prazo. "Precisa-se redefinir o que é riqueza. A água está sumindo, 23% da capacidade do planeta já foi, e não há como recuperar. As empresas precisam mudar o significado e desenvolvimento para serem, de fato, socialmente responsáveis".
"Uma empresa pode crescer, pode gerar lucro e recursos com sustentabilidade. A vantagem é fazer crescer sua reputação, que é seu maior ativo intangível. Há uma frase famosa que diz assim: "Se você pedir dinheiro da companhia, serei compreensivo, mas se você riscar a imagem serei implacável", completa Ciro dias Reis, diretor da Imagem Corporativa e presidente da Abracon - Associação Brasileira das Agências de Comunicação.
Real Papel
Outra questão que foi pauta na discussão é o real papel das corporações. Será que construir um mundo melhor e preservar a natureza não seriam um papel apenas do governo?
A maioria respondeu que não. "Sabemos que as empresas sozinhas não têm capacidade de transformar muita coisa. Precisa haver uma interação com setores públicos, governos, organizações da sociedade civil, em nível globol", explica o gerente de comunicação da Ethos.
Bons exemplos
Elton Brasil, gerente - executivo da FNQ Fundação Nacional da Qualidade, organizadora do Prêmio Nacional da Qualidade - que visa estimular o desenvolvimento cultural, político, científico, tecnológico - , diz que o Brasil ainda não apresenta exemplos emblemáticos de empresas que se prejudicam por não serem socialmente responsáveis, como em outros países. "No Brasil temos uma faca no pescoço para apresentar resultados em curto prazo".
Além disso, continua, "o consumidor brasileiro não tem a maturidade da população européia. O caso mais clássico é o da Nike, que nunca mais vendeu como antes depois de constatado que indiferentemente trabalhava com mão-de-obra escrava"."A equação é complicada para a empresa, que precisa crescer protegendo o meio ambiente. Mesmo assim,vemos soluções criativas vindas de setores como o dos bancos. A criação dos "Princípios do Equador", pelo Banco Mundial, é bom exemplo.
Os bancos que aderirem às regras não vão financiar - acima de 50 milhões de dólares - , projetos que não sejam absolutamente defensáveis do ponto de vista social e ambiental", acrescenta Ciro Dias. Entre os bancos brasileiro que aderirem aos princípios estão Itaú, Bradesco e ABN Amro Real.
Cada setor tem de procurar sua maneira de contribuir. Ainda não foi inventada uma cartilha ou lista de procedimentos, mas, por outro lado, existem instituições que ajudam as empresas a implementar programas de sustentabilidade. É comum encontrar corporações que querem entrar para o time das sociedades responsáveis e não sabem exatamente como.
Elton Brasil deu dois exemplos de empresas que melhoram seu faturamento, diminuindo a emissão de poluentes e reduzindo também o desperdício de bens não-renováveis como a água.
"Trabalhei durante 15 anos no mercado de bebidas. A cerveja é 80% água e 20% aditivos como malte, cevada e outros. Adotar a redução de água não significa reduzir a água da cerveja, mas, sim, a água usada para lavar garrafas e maquinário".
Outro exemplo foi o caso de um hospital que adotou diversos processos de responsabilidade social. "Eles pensaram: o que faço com o óleo que uso na minha cozinha? O que faço com as sobras das refeições servidas? Como controlar melhor as salas de raios-X para não haver vazamento? Como melhoro as taxas de ocupação nos centros de cirurgia já que estamos prestando um serviço para a comunidade? Com esses questionamentos, o hospital elaborou sua estratégia e melhorou não só a produtividade como o uso do centro de cirurgia", explica.
Existem outros avanços importantes como a ISSO de Responsabilidade Social. " A ISO não será somente uma norma, será uma soma de princípios, e o processo de construção é fantástico. Primeiro, há dois países inusitados na liderança, Suécia e Brasil. Todos os setores do mundo inteiro estão sendo ouvidos para que as diretrizes reflitam os anseios e desejos da sociedade. É muito bom saber que o Brasil está na liderança disso", finaliza Silva.
Fonte: Consumidor Moderno, dezembro/janeiro de 2007