Em Houston, uma casa de três quartos com sala de jogos, escritório, piscina e banheira quente sai por US$ 225 mil. Em Manhattan, o mesmo dinheiro compra uma vaga de estacionamento. Sem janelas. Sem vista. Sem paredes.
Enquanto o preço dos imóveis despenca na maioria dos Estados Unidos, os preços em Manhattan continuam sua escalada, e isso inclui o estacionamento. Alguns dos compradores nem mesmo têm carros, mas adquirem os espaços como investimento e os alugam para recuperar o dinheiro gasto.
O espaço está em tamanha demanda que existem listas de espera de compradores. Oito pessoas disputam a chance de adquirir, ao preço de US$ 225 mil, uma das cinco vagas de estacionamento disponíveis no subsolo de um edifício de 34 apartamentos na rua 17, cuja construção deve ser concluída em janeiro do que vem.
A incorporadora, nesse meio tempo, solicitou licença à prefeitura para acrescentar mais quatro vagas de estacionamento.
As vagas em edifícios novos vêm sendo vendidas por preço duas vezes superior ao que tinham cinco anos atrás, disse Jonathan Miller, avaliador de imóveis e presidente da Miller Samuel.
Ainda que as vagas nos bairros mais procurados de Manhattan sejam as mais caras, até mesmo vagas nos estacionamentos a céu aberto nas garagens de Queens, Brooklyn, Riverdale e Harlem vêm atingindo preços próximos aos US$ 50 mil, e existe pelo menos um novo edifício no Brooklyn que oferece vagas por US$ 125 mil.
Escassez X preços
A escassez tem papel importante na escalada dos preços. Miller estimou que menos de 1% dos edifícios de apartamentos da cidade disponham de vagas privativas de estacionamento. A cidade também limita a área para guardar os veículos dos moradores que os edifícios novos ao sul da rua 96 podem oferecer, requerendo que um máximo de 20% dos apartamentos disponham de vagas.
"É um conforto bastante raro", disse Miller. "E, no mundo de spas para animais de estimação e de sommeliers que atendem em domicílio, é um conforto realmente funcional."
Em outras cidades densamente povoadas onde o espaço e as vagas de estacionamento também passam por forte demanda, as vagas de estacionamento em edifícios de apartamentos tendem a custar caro. Em Boston, elas chegam a custar US$ 175 mil, e, em Chicago, o preço atinge os US$ 75 mil. Mas, em cidades como Los Angeles e Dallas, a maior parte dos edifícios oferece vagas de estacionamento como parte do preço dos apartamentos.
Para os incorporadores de imóveis em Nova York, estacionamento é o melhor uso para espaço abaixo dos padrões residenciais ou comerciais e oferece preço semelhante por metro quadrado ao que se pode obter por espaço residencial, cujo custo de incorporação é muito mais alto.
De acordo com a Miller Samuel, a vaga média de estacionamento na cidade custa US$ 165,019, ou US$ 10 mil por metro quadrado, o que fica bem perto do preço médio do espaço residencial. Estamos falando de valores médios, claro. Uma vaga de US$ 200 mil quer dizer custo de US$ 12 mil por metro quadrado.
Se as vagas de estacionamento no Onyx Chelsea, um novo condomínio de 52 apartamentos na esquina da rua 28 com a Oitava Avenida, servem como indicação, a demanda é imensa. As duas primeiras foram vendidas por US$ 165 mil, a terceira, por US$ 175 mil, e as duas últimas, por US$ 195 mil. Cada vaga envolve custo mensal de manutenção de cerca de US$ 50. Ainda assim, há três compradores em lista de espera.
Lista de espera
Cynthia Habberstad ocupa a primeira posição na lista. Ela optou por não comprar uma vaga quando elas estavam à venda por US$ 165 mil, mas mudou de idéia em seguida, e logo descobriu que todas as vagas já haviam sido vendidas.
"No começo, eu achei que era pesado demais e não queria gastar tanto dinheiro", disse Habberstad. "Mas agora estou com raiva de mim mesma, pode ter certeza."
Ela e seus três filhos, de 7, 9 e 11 anos, moram em Long Island, mas o trabalho das crianças como modelo faz com que precisem ir à cidade pelo menos duas vezes por semana; por isso, a família adquiriu um apartamento no edifício, para suas estadias em Manhattan.
"Se estamos chegando tarde, de um jantar, ou se houver muita coisa no carro, será que queremos andar alguns quarteirões até em casa?", disse Habberstad. "Agora que não tenho a vaga, vejo como comprá-la fazia sentido."
Os incorporadores estão cientes da demanda. "Nós estamos incluindo vagas de estacionamento em todos os projetos nos quais trabalhamos", disse Shaun Osher, presidente-executivo do Core Group Marketing, responsável pelo edifício da rua 17 e por uma dúzia de outros novos condomínios residenciais.
Estacionamento no edifício permite que os moradores da cidade equipados com carros reproduzam o ideal suburbano de estacionar, fechar o carro e entrar em casa, ele diz.
No Fifth Street Lofts, em Long Island City, Queens, um condomínio cuja construção deve ser concluída até o final do ano, Jackie e Lee Freund compraram um apartamento e três vagas de garagem, ao preço de US$ 50 mil cada uma, ainda que só tenham um carro.
Investimento
"Compramos três porque sabemos que a situação de estacionamento já é ruim e só vai piorar", disse Jackie Freund.
O casal, que tem um filho de dois anos, morou por três anos em um apartamento alugado, na vizinhança. Depois de enfrentar todas as dificuldades de estacionar na rua, conseguiram uma vaga em uma garagem próxima.
"Nosso carro foi guinchado, e minha irmã também teve o carro guinchado quando veio nos visitar e estacionou do lado errado da rua", conta Freund. "O pessoal adora guinchar nesse bairro, porque o pátio de carros recolhidos fica por perto."
Os Freund planejam vender uma das vagas adicionais em seu novo condomínio e alugar a segunda.
Compradores e corretores de toda a cidade estão confiantes em que os preços continuarão a subir e que encontrar vaga para estacionar se tornará cada vez mais difícil. De fato, 40 estacionamentos e garagens fecharam na cidade, nos últimos nove meses, e apenas 23 foram abertos, disse Margot Tohn, editora de "Park It! NYC 2007", um guia de estacionamentos.
"Ainda que a escala da queda não seja grande, estamos claramente perdendo vagas", afirmou a editora.
Tom Postilio, corretor no Core Group Marketing e diretor de vendas para o condomínio da rua 17, diz que "muita gente que procura apartamentos acredita que recebê-los implica receber seus carros. E, para essas pessoas, caso não haja vagas para estacionar na rua, comprar uma vaga por US$ 225 mil é praticamente uma pechincha".
Fonte: Folha de São Paulo (São Paulo), 14 de julho de 2007