Uma mina de ouro. Assim muitos descrevem o negócio que envolve um estacionamento ou garagem. O que leigos na área não sabem é que o investimento não é o que se pode dizer de pequeno, a escolha pelo local depende de uma série de fatores, inclusive, barganha pelo valor do aluguel; o seguro para os veículos morde o faturamento e as margens geralmente são pequenas.
Apesar dos contras, quem investe na área afirma que é possível ter um retorno garantido quando há uma boa gestão do negócio. Há 16 anos, Paulo começou um SOS para alunos dentro do estacionamento de uma universidade em Canoas. Com o sucesso, em pouco tempo ele expandiu os negócios e, em parceria com um irmão, surgiu a sociedade com uma das maiores franquias na área de estacionamento no país. Após cinco anos de união, a sociedade se desfez, mas a parceria não.
Atualmente, Paulo é dono de 13 negócios em Porto Alegre e em Caxias do Sul. “Há tanto tempo no mercado, eu já aprendi algumas coisas e mesmo assim fiz muito negócio errado e, em alguns, tive sucesso”, afirma o empresário. Dono de estacionamentos em terrenos, hotéis e prédios comerciais, afirma que um dos pontos cruciais para o sucesso do negócio é a escolha do ponto. “Muitos podem pensar que um estacionamento vai atrair clientes. O que acontece é o contrário. É o cliente que faz a demanda surgir.” Diante desta lógica, locais com maior circulação de veículos e em áreas comerciais são os com mais chances de dar certo, mas também os com aluguéis mais elevados. “A locação do imóvel é um dos custos mais altos do negócio. Infelizmente, não existe uma análise precisa, tudo que diz respeito é subjetivo. Entretanto, ter um olhar atento sobre as peculiaridades da economia no entorno é vital”, aconselha. A forma de controle do acesso dos usuários é outro ponto importante para o sucesso financeiro de um estacionamento, onde as margens de ganho não são superiores a 10% ou 15%.
O sistema mais seguro, que garante até 99% da operação, também é o de custo mais elevado. Cada catraca automatizada – aquela onde uma câmara faz a leitura da placa do veículo sem precisar de interferência humana – custa entre R$ 90 mil e R$ 140 mil. Já a informatizada, onde é preciso que uma pessoa coloque no sistema a placa do cliente, o investimento inicial sai por algo próximo dos R$ 10 mil. “A diferença é absurda, mas vale a pena. Atualmente, tenho cinco estacionamentos automatizados contra oito informatizados e é possível ver a diferença.”
SEGURANÇA MORDE O LUCRO
Boa parte de estacionamentos e garagens espalhados pelo Brasil surge e gera receitas não só pela mobilidade urbana deficiente, mas também pela insegurança do usuário em deixar o veículo na rua. Roubos e furtos mexem com toda uma cadeia, inclusive a de seguros dos próprios locais onde o motorista busca segurança. “Como sou franqueado de uma grande empresa, consigo trabalhar com um valor mais baixo, mas que ainda assim é altíssimo e interfere no faturamento. Sem ele, no entanto, não dá para ficar”, destaca Paulo. A violência em Porto Alegre e Caxias do Sul também tem reflexos no modelo de negócio do empresário. Dos 13 estacionamentos, somente 20% atendem 24 horas e a maioria deles opera de portões fechados à noite. “O funcionário tem que reconhecer o usuário pela câmara. Sabemos que isso não é o melhor, mas é uma forma de garantir a segurança”, destaca.
INVESTIMENTO
Um estacionamento foi a oportunidade de investimento vista pelo administrador de empresas Leandro. Tendo experiências em áreas como a construção civil, ele nunca tinha tido contato com o setor e foi a partir de um segundo empreendimento que ele ajudou a tocar que surgiu o Le Garage em São Leopoldo. Há quase dois anos, o estacionamento funciona em frente à prefeitura de São Leopoldo e próximo à rodoviária do município. Mesmo tendo volume de rotatividade na área, 60% dos usuários são funcionários públicos mensalistas. “A área, mesmo já tendo sido aprovada, ainda não é zona azul, o que não limita o tempo de estacionamento nas faixas de rua. Tenho certeza de que se tivesse parquímetro como as demais vias, o movimento seria mais variado”, destaca.
O Le Garage oferece 78 amplas vagas, cada uma com três metros de largura, seguindo padrão norte-americano. O piso é intertravado e toda a área de garagem é coberta. Em dias de chuva, os usuários ainda têm direito a um guarda-chuva, que deve ser devolvido na retirada do veículo. “São detalhes e até algum mimo que busca dar conforto e qualidade ao nosso cliente. Isso faz a diferença no preço também”, afirma.
Atualmente a hora cobrada pelo Le Garage fica em R$ 7. Mas viabilizar o negócio não tem sido fácil. Além da burocracia com prefeitura e bombeiros, também é alto o custo com funcionários. “Trabalhar certinho, com todo mundo legalizado, assim como para qualquer empresa, é um valor alto. Mas também necessário para não ter incômodo futuro”, afirma Leandro, destacando que o Le Garage funciona apenas em horário comercial. Para complementar o faturamento, ele também loca espaços para publicidade e para food trucks durante a semana. “Aos finais de semana, o estacionamento vira local para promover encontro de carros antigos.” Outro ponto que, segundo o empresário, prejudica o negócio é a clandestinidade.
Não existe um número certo, mas a estimativa de entidades do setor é que cerca de 20% dos estacionamentos ou garagens atuem de forma irregular no Estado. “O cara tem um terreno e quer monetizar. Aí entra ele ou a esposa e começam a operar um estacionamento sem nenhum dos custos que nós, legalizados, temos. Isso prejudica o setor e motiva que o usuário pense que quem trabalha certinho só quer explorá-lo”, reclama.
TEMPO E PREÇO PRATICADO
Os valores praticados no mercado de estacionamento variam de cidade para cidade e de negócio para negócio. Em Passo Fundo, por exemplo, a média da hora cobrada fica em R$ 7. Valor semelhante às duas maiores cidades do Vale dos Sinos, Novo Hamburgo e São Leopoldo, onde a hora fica entre R$ 6 e R$ 10. Já em Pelotas, 60 minutos custam por volta de R$ 4. Na Capital, o valor pode chegar a R$30 ahora, conforme o local. Não existe um regulador de preço.
O empresário é livre para praticar o valor que mais fica justo ao seu negócio, considerando custos como aluguel, sistema automatizado ou informatizado e funcionários, entre outros aspectos. “Aqui em São Leopoldo, onde a problemática da mobilidade ainda não é tão gritante, tenho que ter uma margem bem baixa para pode girar. Tive que aumentar em R$ 2 meu valor/hora por conta do aluguel e ouvimos muitas reclamações. O usuário não consegue ver um estacionamento ou garagem como um negócio”, destaca Leandro. No Rio Grande do Sul, é de praxe a cobrança por hora do usuário. Em alguns locais, o tempo mínimo pode ser de meia hora. Em Porto Alegre, uma lei municipal que ainda precisa ser sancionada pelo prefeito Nelson Marchezan prevê que todos os estacionamentos cobrem para cada 15 minutos — inclusive shoppings, onde a cobrança é feita por quatro a seis horas, na maioria. “É uma lei inconstitucional, que desrespeita a livre iniciativa. Estamos em um livre mercado. É pior para o usuário, pois a tendência é de que as empresas cobrem o mesmo valor por um tempo menor”, salienta Francisco Nora, presidente do Sindicato das Empresas de Garagens, Estacionamentos, Limpeza e Conservação de Veículos do Estado do Rio Grande do Sul (Sindepark-RS). Lei semelhante já existe em Santa Maria.
Por lá, desde 2014, os empresários devem cobrar em frações de 15 minutos, além de colocar relógios na entrada e cartazes com os valores. Muitos conseguiram na Justiça o direito de operar de forma independente. A judicialização também será uma medida do Sindepark-RS caso a lei seja aprovada na Capital. “Há 18 anos derrubamos uma lei assim na Justiça. Se precisarmos vamos novamente para a briga.”
Fonte: Revista Bens & Serviços (publicação da Fecomercio/RS) - 01/03/2017