A supersafra agrícola brasileira derrubou os preços dos alimentos no varejo em fevereiro, fazendo a inflação voltar a surpreender positivamente o mercado. Com a alta de 0,33% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no mês passado, o menor resultado para o mês desde 2000, analistas do mercado começam a apostar em um corte de 1 ponto porcentual na Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, marcada para os dias 11 e 12 de abril.
O resultado foi inferior às expectativas mais otimistas do mercado, que esperava, em média, um resultado superior a 0,4% no mês. Com isso, alguns analistas já começaram a prever um IPCA abaixo de 4% no fim do ano (o centro da meta traçada pelo Banco Central é de 4,5%).
Segundo levantamento feito pelo Projeções Broadcast com 34 instituições, cinco já preveem inflação abaixo de 4% este ano. Outras 25 acreditam que o IPCA ficará entre 4% e 4,5%, e outras quatro projetam o índice acima do centro da meta. As estimativas variam de 3,70% a 4,80%, gerando mediana de 4,20%, abaixo da previsão do último boletim Focus, do BC, que previa 4,36% de inflação.
O arrefecimento mais forte que o esperado do IPCA também aumentou as expectativas por um corte maior na taxa básica de juros, a Selic, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, nos dias 11 e 12 de abril. “Muita gente está revendo projeção de IPCA 2017 para abaixo da meta e criando expectativa de corte maior da Selic”, afirmou o diretor da Mapfre Investimentos, Carlos Eduardo Eichhorn.
Dos 33 participantes consultados pelo Projeções Broadcast, 27 esperam que o BC reduza o juro básico em 1 ponto porcentual em abril. Seis ainda estimam que a Selic será cortada em 0,75 ponto porcentual no encontro de abril, passando de 12,25% para 11,50% ao ano. Para o fim de 2017, as expectativas para Selic vão de 8% a 10%.
A equipe econômica do Banco Bradesco já espera que a inflação fique abaixo de 4% no fim de 2017. “O resultado reforçou nossa expectativa de variação de 3,9% do IPCA. A descompressão dos preços foi generalizada”, avaliou o Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do banco, em nota. “A continuidade do processo de desinflação também fortalece nossa expectativa de continuidade de flexibilização da política monetária, que deverá levar a taxa Selic a 8,50% ao final deste ano.”
Nos cálculos da gestora de recursos AZ Quest, a Selic, hoje em 12,25%, deve ter dois cortes consecutivos de 1 ponto porcentual. A despeito de eventuais pressões de energia elétrica ou do câmbio, o processo de queda da inflação persistirá, permitindo ao IPCA encerrar em 4,15% este ano, prevê André Muller, economista da gestora.
O impacto da demanda fraca ainda está presente no arrefecimento do IPCA, mas foi abafado pela força da redução nos preços dos alimentos, segundo Fernando Gonçalves, analista da Coordenação de Índices de Preços do IBGE. “A safra está mais favorável. Isso favorece a queda nos preços dos produtos.”
Os preços da alimentação no domicílio caíram 0,75% em fevereiro, enquanto o custo da alimentação fora de casa subiu 0,11%. A principal pressão sobre a inflação partiu de educação, com alta de 5,04%, mas ainda menos acentuada que no mesmo período de anos anteriores.
A perda de força da inflação oficial deve continuar pelo menos até o fim do terceiro trimestre, segundo estimativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “A partir de setembro é quando começam as variações menores no IPCA (de 2016), então é possível que, por efeito estatístico, a taxa em 12 meses volte a subir no fim do ano. Mas o 4,5% está virando teto”, previu a pesquisadora Maria Andréia Lameiras, do Grupo de Conjuntura do Ipea.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 10 março 2017