A versão atual do Plano Diretor Estratégico do município de São Paulo, sancionado em julho pelo prefeito Fernando Haddad, define, entre outros pontos, que nos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana, áreas bem servidas de infraestruturas de transporte público, não será mais obrigatório atender a um número mínimos de vagas de garagem por empreendimento. Ainda assim, não será toda área destinada a esta finalidade considerada não computável. As vagas de garagem que excedam os limites de uma vaga por unidade residencial e uma vaga para cada 100m2 de área construída computável dos empreendimentos não residenciais passarão a ser computáveis, portanto passíveis de cobrança de outorga onerosa.
O objetivo é atrair e estimular a população (residente e circulante) que prefere se locomover por meio de transporte público e coletivo e não motorizado, bem como aqueles que preferem se deslocar a pé. Mas especialistas indicam que muito possivelmente a maioria continue usando o carro devido a uma série de fatores. Na análise de Hamilton Leite, mestre em Engenharia Civil e Urbana e Diretor de Sustentabilidade do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), se num curto espaço de tempo a quantidade de vagas ofertada pelos empreendimentos imobiliários é drasticamente reduzida, a consequência é que as famílias que precisam de uma quantidade de automóveis maior do que seus apartamentos ou escritórios lhes oferecem, e estas pessoas não tem alternativas por elas aceitáveis de transporte que possa substituí-los, precisarão deixá-los em estacionamentos externos ao edifício ou na rua. Neste caso, os automóveis estacionados reduzirão o espaço de circulação nas vias, podendo interferir no espaço destinado ao tráfego. É preciso levar em conta ainda que o meio-fio vem perdendo espaço como “vaga de estacionamento” em muitos bairros, já que a prefeitura está ampliando o número de quilômetros destinados a ciclofaixas e vias exclusivas para ônibus. “Deveria ter sido previsto um longo período para a transição da mobilidade baseada no automóvel, para aquela pretendida, baseada no transporte público de massa, que ainda precisa melhorar muito e no transporte não motorizado. Para que o morador possa se deslocar de bicicleta ou a pé, antes de mais nada, é necessário que o Plano Diretor e as Leis de Uso e Ocupação do Solo estimulem uma ocupação equilibrada entre moradia, trabalho, estudo e lazer numa mesma microrregião, e mesmo havendo este direcionamento legal, são necessários décadas para que a cidade se transforme”, opina o especialista.
“A oferta de vagas nas ruas também está sofrendo redução, por isso ainda é uma incógnita como os usuários de veículos particulares irão se comportar com as mudanças”, aponta Marcelo Gait, presidente do Sindepark (Sindicato das Empresas de Garagens e Estacionamentos do Estado de São Paulo). Ele destaca ainda que estacionar na rua, além de mais difícil, vem ficando mais caro também. O preço da zona azul aumentou, assim como o quanto algumas pessoas cobram por ‘cuidar’ do carro. No caso da zona azul, a folha que permite utilizar a vaga na rua durante uma hora passou a ser vendida de R$ 3,00 para R$ 5,00 em 1º de agosto. Deixar o carro em estacionamentos privados vai sair mais caro? Na opinião de Hamilton Leite, é possível que sim, na medida em que haverá maior demanda por este tipo de serviço. “Mas só saberemos ao certo dentro de alguns anos.”
Já o presidente do Sindepark explica que não há uma relação muito forte entre a limitação de vagas nas garagens de novos prédios e preços dos estacionamentos privados. “O que mais impacta no valor cobrado pelos estacionamentos é o quanto eles pagam de aluguel para os proprietários dos imóveis onde o estabelecimento funciona, o que compromete grande parte do faturamento da empresa. Com a grande valorização imobiliária da cidade, os estacionamentos ficaram com tarifas compatíveis ao metro quadrado das regiões onde estão. Outros fatores, como mão-de-obra, seguro e impostos também pesam no cálculo”, esclarece. De acordo com Gait, por volta de 21% dos 6 mil estacionamentos em São Paulo são subterrâneos. “Porém, muitos deles estão embaixo de prédios residenciais e comerciais e este tipo de espaço também vai sofrer restrições com o novo Plano Diretor”, pondera. Isso porque a lei define que nas áreas dos eixos de transformação urbana, das subprefeituras da Mooca, Sé e nas Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis), os terrenos com áreas acima de 500m² considerados subutilizados ou ociosos, mesmo com uso de estacionamentos, podem ser obrigados ao parcelamento, edificação ou utilização compulsória, além de ficarem sujeitos a IPTU progressivo ou até mesmo desapropriação. Para Leite, a construção de estacionamentos subterrâneos pode resolver o problema de curto prazo. “Mas possivelmente (os estacionamentos subterrâneos) ficariam ociosos daqui alguns anos ou décadas, quando tivermos alcançado a almejada redução da quantidade de carros nas nossas cidades”, considera.
Fonte: Fecomercio, 22 de agosto de 2015