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Quarenta e dois flanelinhas do Guarujá abandonaram seus postos de trabalho ontem e passaram a manhã aprendendo, pela primeira vez na vida, lições sistematizadas de estratégia profissional. Projeto oficial da prefeitura do município, o "Guardador Solidário" ofereceu uma espécie de curso teórico sobre a função de flanelinha com aulas de membros da polícia, guardas de trânsito e servidoras da Secretaria de Assistência Social do Guarujá.

Alguns procedimentos foram repassados à turma, cadastrada nos pontos tradicionais da categoria, como corredores de vagas da Avenida Puglisi, portas de supermercados e calçadas da orla. O primeiro mandamento era não obrigar o motorista a dar gorjeta. Mas também foram abordadas a proibição de estacionar na esquina, a ilegalidade de se aliciar crianças e a impertinência de beber em serviço.
 
Noções de segurança no trabalho também foram ensinadas, como não "se jogar" na frente do trânsito para dar espaço para quem sai da vaga. Sentados em roda, quase todos com boné e camiseta regata, os alunos se mostravam curiosos.
 
A Prefeitura informa que o projeto, similar ao tentado em São Sebastião e Caraguatatuba, tem cunho social e beneficiará o turista. Como a partir de hoje os flanelinhas cadastrados de Guaiúba à Pitangueiras terão crachás com foto e nome, o visitante ganharia a chance de saber quem está cuidando de seu carro. "Enquanto garantimos maior segurança para as pessoas, queremos treiná-los para que saiam das ruas", explicou Regina Rodrigues da Costa, chefe da divisão de medidas preventivas e educativas da Secretaria de Assistência Social do Guarujá.
 
Uma das coordenadoras do projeto, Regina assumiu que foram usados critérios pouco rígidos de cadastro – "Só tem que morar aqui, mesmo se for na rua" - e não soube dizer exatamente como os rapazes seriam inseridos no mercado de trabalho formal. "Primeiro, vamos criar um vínculo, para depois começar um processo de capacitação para outros setores", disse.
 
O crachá tem validade de 3 meses, mas ainda é incerto o que acontecerá no vencimento. "Quem tiver bom comportamento, poderá revalidar", alegou. Questionada se, ao deixar o trabalho clandestino, o guardador não seria substituído por outro, Regina afirmou: "É, é complicado. Mas o problema está aí, alguém tem de fazer alguma coisa". Ela negou que a atitude irá institucionalizar o ofício.
 
Apesar dos conteúdos passados, a prática frustrou. Antes do encerramento, pelo menos metade dos presentes saiu para fumar, deixando a oradora quase sem platéia. No momento, o foco da conversa era como abordar o turista. Logo depois, alguns flanelinhas foram embora, nervosos com a demora para pegar o crachá. Alguém jogou no chão o lanche oferecido. A atitude foi repreendida. Houve um bate-boca, depois as pazes. Tudo na aula inaugural.
 
Especialista critica modelo adotadono Guarujá
Presidente da Comissão de Assuntos e Estudos sobre o Direito de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), explica motivos de sua contrariedade ao projeto organizado no Guarujá
 
Cyro Vidal, presidente da Comissão de Assuntos e Estudos sobre o Direito de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), é totalmente contra o projeto organizado no Guarujá Segundo ele, ser flanelinha não é uma atividade com caráter oficial.
 
"Fica na irregularidade. A não ser o próprio governo, ninguém pode legalmente obrigar o pagamento para uso de um espaço público, mesmo que a cobrança seja facultativa. Isso é coação", argumenta o especialista.
 
Para ele, outra questão grave é o suporte que a Prefeitura oferecerá em caso de algum acidente. "E se ele for atropelado? E se alguém for roubar o carro com um revólver e o acertar? O governo faz o quê nesses casos? É inadequado incentivar uma prática sem dar respaldo nenhum", afirma o advogado.
 
Como explica Vidal, o correto seria selecionar e contratar os rapazes, capacitá-los de forma correta e usá-los como guardas de trânsito. "É possível, isso é o que diz a legislação. O Código Nacional de Trânsito prevê que o agente que orienta o tráfego deverá ser um servidor", explica.
Fonte: Jornal da Tarde (São Paulo), 12 de janeiro de 2007

Categoria: Geral


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