Parking News

Jorge Hori *

Matéria publicada na Folha de S. Paulo do dia 2 de março (veja a íntegra abaixo, em Acompanhe) mostra que pessoas madrugam para conseguir uma vaga não paga na região da Berrini. Uma nova saída de pessoas que não querem abandonar o automóvel para se locomover ao trabalho, mas não querem (ou não podem) pagar estacionamentos.
Uma saída tradicional era deixar o carro mais distante do seu destino e completar o percurso a pé. No caso, a escassez de vagas, mesmo distantes, leva as pessoas a "chegar primeiro" para assegurar a sua vaga. Que fica ocupada o dia todo, pois é de pessoas que chegam para trabalhar, com expediente completo.
Como é usual, a culpa é logo colocada na falta de planejamento. No entanto, a ocupação da Berrini se dá após o Plano Urbanístico Básico - PUB (1969), o Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado (PMDI) e, principalmente, depois do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PDDI), que veio resultar na Lei de Zoneamento, em 1971, definindo limites de ocupação e aproveitamento.
Por conta desses instrumentos, a região da Berrini não tem o adensamento em cada unidade que ocorreu no Centro tradicional, mas não evitou um adensamento coletivo da região. Nem, também, a falta de estacionamentos.
Mais uma vez, o problema não está na falta de planejamento, mas nas falhas do planejamento. Algumas delas não corrigidas até agora. A nova oportunidade está na revisão do Plano Diretor da Cidade, ora em nova discussão na Câmara Municipal.
O problema apontado de falta de estacionamentos na Berrini decorre do processo histórico (recente) de sua ocupação.
Fica no bairro do Brooklin, cujo eixo principal estava na atual Av. Vereador José Diniz, por onde passava o bonde e toda a região foi ocupada pelas residências unifamiliares, principalmente pelos conjuntos de casas com um único telhado e que os paulistanos chamam de "germinadas".
Com frentes de 5 metros (ou às vezes menos), não previam o espaço para o automóvel, então inacessível para o padrão da maioria dos moradores que ocuparam a região, sempre com algumas exceções de norte-americanos ricos que construíram algumas mansões. Esses, predominantemente, na faixa acima da Av. Santo Amaro (ou seja, entre essa e a linha do bonde), uma avenida já aberta para o tráfego de veículos automotivos, na trilha das carroças.
A faixa abaixo da Santo Amaro era "periférica", com a ocupação das tais "casas germinadas", em direção ao rio que, algumas vezes enchia, de tal forma que a sua várzea era reservada para "sítios". Ou por galpões industriais, ou de oficinas.
Com a retificação do rio Pinheiros e a reversão de suas águas para a represa Billings, através da Usina da Traição, essa várzea foi ocupada pela Marginal do Pinheiros e um pouco mais para dentro, em área plana (diferentemente da topografia acidentada do outro lado), foi construído o dreno do Brooklin. Cuja função era levar as águas do córrego Água Espraiada para depois da Usina da Traição, pois a cota do rio Pinheiros tinha ficado acima da sua foz.
Em torno do dreno foi construída uma via, criando uma faixa então pouco ocupada, com terrenos de porte (os então sítios ou propriedades da Light) entre a Marginal e a nova via, que veio a ser ampliada e se tornou a Av. Eng. Luis Carlos Berrini, em homenagem a um ilustre urbanista.
Roberto Bratke percebeu nessa área em torno da Berrini (dos dois lados) uma alternativa à Av. Faria Lima, para onde os escritórios estavam mudando após um estágio na Avenida Paulista. O sucesso inicial o levou a empreender novos prédios, até que a região "pegou" como um novo polo de escritórios.
Com mudança de padrão. Os edifícios de Bratke eram relativamente modestos, mas já atendendo às limitações da lei de zoneamento (coeficiente de aproveitamento máximo de quatro vezes).
O conjunto do World Trade Center foi o principal marco da mudança do padrão. O Robocop pontificou durante algum tempo, até ser cercado por outros edifícios de igual porte. E o maior dos empreendimentos é o conjunto da Torre Norte, com dois grandes edifícios de escritórios e o terceiro inteiramente tomado pelo Hotel Hilton.
Todos esses novos empreendimentos obedeceram (ou deviam ter obedecido) as limitações da lei de zoneamento, as exigências de vagas em função da metragem construída e, em alguns casos, compensações por serem Pólos Geradores de Tráfego.
O resultado que se vê é um bairro moderno, com grandes edifícios, uma ampla movimentação de pessoas e congestionamentos permanentes e falta de vagas para estacionar.
Uma recente pesquisa feita pelo Sindepark indicou a existência de 17.921 vagas em estacionamentos pagos. Só o conjunto da Torre Norte, comporta cerca de 3.700 vagas.
As vagas existem, mas seriam caras. O que faltaria seriam as vagas não pagas, em vias públicas. O que decorre do processo de ocupação.
As vias laterais são estreitas, não comportando o estacionamento em ambos os lados.
Nas áreas ainda não verticalizadas, cada uma das "casas germinadas" usou o seu "jardinzinho" para fazer uma garagem para o seu carro e a sucessão de guias rebaixadas não deixa espaço para o estacionamento de um veículo, ainda que permitido. Muitas delas se transformaram em lojas, reservando a área frontal para os seus clientes.
A carência na área não é de estacionamentos, mas de vagas gratuitas.
O que leva a novas discussões, como transformar as vagas existentes em rotativos, construir garagens subterrâneas, melhorar o transporte público ou ainda mudar as relações obrigatórias entre área construída e oferta de vagas.
Transformar vagas existentes em rotativos resolve o problema dos visitantes, mas não dos trabalhadores permanentes. Esses precisam de vagas durante todo o seu expediente e não por duas horas. Têm que buscar o estacionamento pago, vagas mais distantes do seu local de trabalho ou usar o transporte coletivo.
A região é servida por um transporte de massa (ou de amassa, nas horas de pico). Existe a infraestrutura, mas faltam trens e sistemas de controle para ampliar a oferta. Os novos trens já estão encomendados e em fabricação (apesar de pendências em relação às (não) licitações). A Av. Luis Carlos Berrini faz parte do corredor metropolitano de ônibus, mas a infraestrutura não foi completada.
Garagens subterrâneas são tecnicamente viáveis, mas economicamente discutíveis, em função das proteções adicionais em função de a região estar ao lado do rio, até mesmo em áreas aterradas. Uma garagem subterrânea pública não teria preços inferiores aos praticados na região. Não resolveria o problema daqueles que buscam vagas gratuitas ou a custo de "flanelinhas".
A mudança dos índices de vagas por área construída é necessária, mas já tem pouco efeito sobre a área já ocupada. Terá influência maior sobre a Operação Urbana Água Espraiada.
O problema da Berrini é a falta de vagas gratuitas na via pública, o que deverá se agravar e não melhorar com a complementação da sua ocupação. Além da eliminação, a tendência é que os remanescentes sejam transformados em rotativos (Zona Azul).
A solução está na alternativa às movimentações com o carro próprio para ir ao trabalho.
Uma delas, já em andamento, é a oferta de residências de médio e alto padrões na área, possibilitando o acesso a pé no trajeto casa-trabalho.
A melhoria do transporte de média capacidade, seja com o trem metropolitano ou o corredor de ônibus, poderia reduzir a demanda para os estacionamentos não pagos. O que poderia ser associado ao uso da bicicleta.
E uma solução adicional está em vans circulares, com tarifa zero, patrocinadas por uma associação de empresas instaladas na região.
Como é comum, o problema do estacionamento é apenas um efeito que não pode ser resolvido combatendo-o. Mas buscando interferir nas causas.

* Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica do Sindepark. Com mais de 40 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.

Categoria: Fique por Dentro


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