Por Jorge Hori*
Os flanelinhas são uma praga que assola os usuários de carros que se destinam a áreas de concentração de atividades econômicas, sem disponibilidade de vagas em estacionamentos pagos.
Ocorrem em áreas de cidades onde os edifícios comerciais, por serem mais antigos, não previram vagas para automóveis. São da fase pré-automóvel. Brasília é uma exceção, pois é uma cidade moderna, da era do automóvel, mas cometeu um erro de planejamento: foi planejado para o carro, com um amplo sistema viário, mas não previu adequadamente as áreas de estacionamento.
Nas áreas de ocupação antiga, até por não terem garagens, o custo dos aluguéis é menor e acaba atraindo empresas cujos funcionários e visitantes chegam à área e encontram dificuldades de achar uma vaga. Aí chega um solícito flanelinha disposto a arrumar "uma vaginha para o dotô": cobrando pelos seus serviços. Em alguns casos o motorista acha uma vaga, mas chega o flanelinha se oferecendo para tomar conta do carro. Se o motorista se recusar a contribuir, corre o risco de ter o seu carro danificado.
São práticas ilegais, contravenções ou crimes sujeitos à prisão e penalidades pecuniárias, mas que persistem a partir de dois comportamentos primários: em primeiro lugar, a pessoa, no caso o motorista, deseja ou persiste em ir de carro ao local onde há escassez de vagas e há flanelinhas dispostos a arrumar uma vaga. Em segundo lugar, o motorista está disposto ou aceita contribuir. Há um fato pré-primário: a instalação de atividades que atraem o motorista. A existência e a exploração do flanelinha é um fato secundário ou derivado. Significa que não adianta combatê-lo, sem ir às causas primárias.
Ou seja, o fenômeno flanelinha não é generalizado, mas ocorre em áreas com concentração de atividades urbanas atratoras de pessoas e cuja capacidade de estacionamento é desequilibrada em relação à demanda.
Nessa perspectiva o flanelinha presta serviços, tanto ao empresário que se instalou nas imediações, como ao motorista, o que promove a sua persistência ou resiliência, apesar de toda a repressão. Sem a sua presença, os clientes das atividades localizadas na área tenderiam a evitá-la, ocasionando, ao longo do tempo, o seu esvaziamento ou empobrecimento. Sem clientela, as lojas fechariam e os escritórios mudariam. O empobrecimento decorreria do perfil dos usuários. Os de maior renda, que usam o carro, se retirariam e abririam o espaço para atividades de menor valor adicionado, frequentado pelas pessoas que chegariam à região usando exclusivamente o transporte coletivo.
Para o motorista que persiste em ir à região, o flanelinha lhe oferece a opção de chegar próximo ao seu destino, em vez de ter que andar muitas quadras entre o local onde encontra uma vaga e o seu destino.
O sonho dos idealistas é que os de maior renda permaneçam indo à região, acessando-a por meio do transporte coletivo. Sonho irrealizável, dada a contradição entre as duas condições.
O que vai resolver o problema dos flanelinhas será a tecnologia. Serão os aplicativos que permitirão que as pessoas de maior renda cheguem aos locais próximos do trabalho de carro, sem ter necessidade de deixá-los estacionados.
* Jorge Hori é consultor em Inteligência Estratégica e foi contratado pelo SINDEPARK para desenvolver o estudo sobre a Política de Estacionamentos que o Sindicato irá defender. Com mais de 50 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.
NOTA:
Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do SINDEPARK.