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IBS pode encarecer feijão e baratear carro

Mesmo que não traga aumento de carga tributária agregada, a reforma na tributação sobre consumo deve ter efeitos heterogêneos sobre preços dos diversos bens e serviços. Tudo depende, claro, do tamanho da alíquota e de questões que ainda serão definidas, como forma de cálculo do imposto e existência de incentivos fiscais. Considerando certas premissas, como um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) efetivamente não cumulativo, com alíquota uniforme de 25%, mantidas as atuais taxas de lucro das empresas, o preço do arroz e feijão, por exemplo, pode subir praticamente 20%. O do automóvel, porém, pode cair 38,3%.

O aumento ou queda do preço de algum produto pode ser compensado ou amenizado pelo efeito em outro, dentro da cesta de consumo total de uma pessoa ou família. A mensalidade escolar, excetuando as de empresas do Simples e as entidades imunes, pode pesar 13% a mais no orçamento. Roupas podem ficar 13,7% mais baratas. Mecanismos como o cashback ou alíquotas diferenciadas para setores restritos, porém, podem alterar efeitos de aumento de preços.

De forma mais agregada, o IBS deve elevar a progressividade na tributação sobre consumo. Ou seja, pessoas com renda mais alta pagarão mais. No decil mais alto de renda - ou seja, entre os 10% de maior ganho -, a fatia na arrecadação total de tributos sobre consumo deve subir quatro pontos percentuais, considerando IBS de 26,9%. Em todos os demais decis de renda abaixo há redução de participação.

Essas são algumas das conclusões de diagnóstico do sistema tributário sobre consumo feito para o Banco Mundial pelos economistas Gabriel Lara Ibarra, Eduardo Fleury e Rafael Macedo Rubião. O estudo teve como objetivo calcular a carga tributária de cada bem e serviço levantado na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Considerou-se a POF de 2017/2018. O impacto nos preços também foi medido para se calcular o efeito do novo imposto segundo a renda das famílias.

Fleury lembra que o impacto do IBS nos preços de bens e serviços não deve ser analisado de forma isolada, porque o IBS deverá ter efeitos heterogêneos para o consumidor. O efeito líquido em termos de carga tributária para uma pessoa ou uma família depende do que se consome. O impacto calculado nos preços, lembra, considerou manutenção das margens de lucro. Ou seja, para se fazer o cálculo do efeito sobre preço, considerou-se que o produtor ou vendedor não mexeriam na sua taxa de lucro, independentemente do impacto do fim da cumulatividade no custo. Por força das condições de mercado, demanda e oferta, as taxas de lucro também podem variar, mas não seria possível projetar como os agentes econômicos vão reagir, explica.

O efeito sobre preços, lembra, também não deve acontecer de uma hora para outra, já que as propostas em discussão preveem prazo de transição para as empresas, na adoção do IBS. Os prazos de transição dos últimos textos das PECs 45/2019 e 110/19 vão de seis a dez anos. O período de transição é considerado importante para adaptação à mudança de preços relativos que o IBS deve trazer e também para a calibragem da alíquota do novo imposto à medida que os tributos originais são eliminados (ver Contexto abaixo).

Para medir o impacto efetivo da tributação no sistema atual, o estudo para o Banco Mundial considerou não somente o tributo na venda ao varejo, mas também o incidente nos custos das empresas e nos fornecedores, diz Fleury, que também é tributarista e sócio da FCR Law.

No sistema tributário atual há “os impostos invisíveis”, diz. “O consumidor olha a nota fiscal, mas muitas vezes o que está lá é uma pequena parcela do imposto cobrado sobre o bem ou serviço. “É como um iceberg tributário, porque há uma parte da carga tributária que não se consegue ver, que está abaixo da superfície. O que se vê na nota é somente o que se consegue enxergar da superfície.”

O arroz e feijão, por exemplo. Atualmente alimentos considerados essenciais são isentos ou têm tratamento tributário mais ameno de PIS, Cofins e ICMS. Quando o consumidor compra algum item isento, por exemplo, pensa que não está pagando nenhum imposto, explica Fleury. Mas a embalagem é tributada, assim como ações contratadas para promoção e marketing dos produtos, por exemplo. Além disso, nem todo o tributo pago pelo fornecedor gera crédito, tornando o imposto cumulativo. Isso faz com que a carga efetiva atual sobre arroz e feijão seja de 3,8%, mesmo que sua tributação na venda no varejo seja zero.

No café a tributação na venda ao consumidor final também é zero, mas a carga efetiva, considerando a parte escondida do “iceberg”, é de 10,6%.

No IBS, considerando a não cumulatividade efetiva, diz ele, os tributos pagos pelo fornecedor passam a ser integralmente compensados. Por isso, com um IBS de 25%, segundo o estudo realizado, o efeito no preço dos diversos produtos seria heterogêneo. Porque, mesmo para produtos que não pagam impostos no varejo, a carga tributária escondida é muito diversa.

O preço do arroz feijão subiria 19,8%. Do café, 11,2%. Do requeijão, que também é tributado a zero no varejo, cairia 2,4%. O efeito do novo imposto nos preços de alimentos é um dos pontos polêmicos da reforma tributária, lembra Fleury. No caso do efeito disso para as famílias de menor renda, nas quais o gasto com alimentos tende a ser mais representativo dentro da cesta total de consumo, a proposta é fazer o cashback, diz ele, que é o ressarcimento ao menos de parte do tributo pago.

Bernard Appy, secretário especial de reforma tributária, tem dito que o governo estuda modelos internacionais de cashback. Ressaltando sempre que a decisão final é do Congresso, Appy tem falado da possibilidade de essa devolução ser imediata, “no caixa do supermercado”, com determinadas condições, como limites de valor.

O efeito não será somente de aumento de preços, aponta o estudo do Banco Mundial. Em roupas, pode haver redução de 13,7% nos preços. Em sapatos e artigos de couro, de 14,2%. Vários itens importantes de materiais de construção, que têm carga tributária efetiva alta atualmente, devem ter redução de preços. Cimento e tijolo, por exemplo, podem pesar 9,2% a menos no bolso do consumidor. Para automóveis, nos quais há carga tributária efetiva atual de 49,6%, o estudo indica redução de 38,3% no preço. Motocicletas podem ficar 48,9% mais baratas.

Fleury lembra que o estudo considerou as alíquotas de ICMS em São Paulo. No caso de automóveis, por exemplo, a situação pode ser diferente levando em conta que outros Estados possuem benefícios fiscais diversos para o setor. Nesse caso, diz, a carga tributária efetiva atual pode ser um pouco menor e o impacto nos preços do IBS também será um pouco menor.

Nas mensalidades escolares, outro ponto sensível da discussão de reforma tributária, deve haver aumento de preços, segundo o estudo, de 13%. Há diferença se a escola estiver no Simples Nacional, lembra Fleury. Nesse caso o aumento é bem menor, de 0,6%. Já nas instituições de ensino imunes, a alta é de apenas 0,04%. Segundo dados da Receita Federal, diz Fleury, as escolas do Simples Nacional correspondem a 15% total do faturamento auferidas pelo setor. As instituições imunes, a 53%. As escolas que serão atingidas com aumento maior, de 13%, portanto, correspondem a 32% do total de receitas. “Não estamos falando de número de alunos, estamos falando em total de receitas”, salienta.

Em relação ao impacto da reforma em serviços de saúde e educação, Fleury destaca que, no âmbito das PECs em discussão, benefícios temporários ou reduções de alíquotas para alguns setores estão em debate. Appy defende que o ideal é que o IBS tenha apenas uma alíquota, mas na terça, dia 21, em conversa com parlamentares, reconheceu que isso provavelmente não ocorrerá. Para o secretário, o “importante é ter o mínimo possível de exceções” e saúde e educação foram citados entre setores que podem ter tratamento diferenciado.

No conjunto, diz Fleury, a reforma tributária com adoção do IBS deve trazer um sistema tributário mais transparente e com maior progressividade, que irá resultar em maior eficiência. Segundo estudo do Banco Mundial, que considerou alíquota de IBS de 26,9%, o grupos dos 10% de maior renda da população brasileira vai avançar de atuais 32,9% para 36,9% na participação da arrecadação de tributos sobre consumo, após a reforma. Nos outros nove decis abaixo, essa fatia irá cair após a reforma, em quedas que variam de 0,2 ponto percentual a 0,8 ponto percentual.

Contexto

O estudo “Diagnóstico do Sistema Tributário” foi apresentado na última semana em reunião do Grupo de Trabalho formado na Câmara dos Deputados para debater a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45/2019. Foi com base em premissas dessa PEC que o estudo foi realizado, considerando um IBS que irá reunir os atuais PIS, Cofins e IPI, federais, ao ICMS estadual e ao ISS municipal. Para medir o impacto nos preços o estudo considerou alíquota de 25% em IBS não cumulativo.

A PEC 45/2019 e a PEC 110/2019 são consideradas pelo governo como as propostas que devem servir de base para a discussão da reforma tributária sobre consumo. Uma das grandes diferenças entre as duas propostas é que, em seu último relatório, a PEC 110/2019 estabelece uma tributação sobre consumo também no destino e não cumulativa, mas com dois impostos: um IBS federal, juntando tributos federais, e um IBS subnacional, reunindo ICMS e ISS.

Como a legislação atual do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do Imposto sobre Serviços (ISS) é diversa entre Estados e municípios, respectivamente, o estudo considerou as alíquotas no Estado de São Paulo, para o caso do tributo estadual. No caso do ISS considerou-se alíquota de 2%. Veja resumo das principais premissas consideradas no estudo no quadro acima. (Imagem: divulgação)

Valor Econômico - Brasil - SP - 23/03/2023

Categoria: Geral


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