Por Jorge Hori*
Até os anos 60, o centro de São Paulo era o centro da cidade, que a esta altura já havia se espraiado para outros municípios, formando a região metropolitana. A sua decadência, então, passa a ficar visível. Mas ela começa antes, sendo o principal marco do processo a inauguração do Conjunto Nacional, na nova Avenida Paulista, antes do Copan.
É uma história pouco contada a da disputa entre dois grandes empresários hoteleiros, cada qual investindo num megaempreendimento, um no centro e outro na nova área da cidade. Jose Tjurs ganhou, abrindo o Conjunto Nacional, antes do Copan, atraindo diversas empresas, até então instaladas no Centro e que se mudaram para o novo empreendimento.
A partir daí, seguiu-se uma sucessiva leva de migrações de escritórios de empresas para a Avenida Paulista e depois para a Faria Lima, Berrini e Chácara Santo Antônio, provocando o esvaziamento progressivo das atividades de maior renda do centro.
Para isso contribuiu o excesso de veículos nas vias e a falta de estacionamentos. Os edifícios mais antigos não tinham a oferta de vagas internas de estacionamentos e os empresários e executivos não podiam chegar com o seu carro nos prédios onde tinham escritório.
Este é ainda um problema do Copan, que teve de mudar a destinação dos imóveis, voltando-se inteiramente para o uso residencial, com muitas unidades minúsculas destinadas a pessoas sem carro.
O Conjunto Nacional também teve de desistir da destinação hoteleira, razão principal da construção pelo empresário do ramo Tjurs, convertendo os imóveis para escritórios. O Conjunto Nacional foi o primeiro grande empreendimento multiuso, concepção não aceita durante algum tempo, o que o levou à decadência, mas posteriormente conseguiu se recuperar.
O metrô estava em construção, os bondes haviam sido retirados e o transporte coletivo se resumia aos ônibus e às lotações.
Os anos 60 marcaram o grande crescimento da frota de automóveis, com a plena produção da indústria automobilística no Brasil. Diante da oportunidade de ter o seu carro, muitos moradores do centro, em edifícios sem garagens, foram migrando para outros bairros, com os novos apartamentos oferecendo as vagas. Itaim Bibi foi o principal polo receptor, seguido dos Jardins, onde era possível construir prédios, e de Moema.
Os bairros residenciais tradicionais do centro, como Santa Cecília, Liberdade, Bela Vista e outros foram se esvaziando, com uma vacância elevada dos imóveis, ou a ocupação por moradores com menor renda, determinando menor manutenção, resultando também na deterioração física dos imóveis e do ambiente urbano.
Esse processo seguiu ao longo de quatro décadas, apesar da implantação de diversas linhas e estações de metrô, até que a partir dos anos 2010 iniciou-se um processo de reversão, com diversos lançamentos de imóveis de pequena metragem, destinados a jovens com maior renda, "descolados", dispostos a viver no centro, sem carro, valendo-se mais do metrô.
A maturação da cultura de uso mais intenso do metrô levou mais de 30 anos, mas parece ter chegado.
O mercado imobiliário aproveitou a oportunidade para lançar diversos empreendimentos no centro, usando a alta valorização dos imóveis como atração para as novas vendas.
No entanto, o excesso de lançamentos parece ter criado uma bolha imobiliária no centro, que está prestes a estourar. O ritmo de vendas está cada vez mais longo, os investidores perceberam que não terão a rentabilidade e a valorização esperada - pois esta já cresceu demais - e estão deixando de comprar. Os usuários finais também estão reticentes.
Segundo a revista sãopaulo, da Folha, com base em pesquisa da Prefeitura Municipal, houve uma redução da vacância, o que não foi comprovado pela reportagem. Ao contrário, o acompanhamento durante uma semana de um prédio com 200 apartamentos de frente indicou que o número de janelas acesas nunca passou de 20.
A maior parte dos recentes lançamentos ocupou terrenos vagos, reduzindo a quantidade de vagas disponíveis. Somando-se a isso as ciclofaixas, as vagas foram reduzidas mais ainda no centro. Não há uma quantificação precisa sobre essa redução.
O que aconteceu com os carros que ocupavam essas vagas? Em alguns casos foram para outros estacionamentos, ainda com disponibilidades. Apesar das reduções, os estacionamentos disponíveis ainda não estão inteiramente tomados. Uma das razões seria o aumento de preços, diante de um aumento de demanda pontual.
Mas, pode-se supor que os motoristas deixaram o carro em casa e passaram a utilizar mais o transporte coletivo. Ou passaram a morar mais perto do trabalho, dispensando o carro. Como deseja a Prefeitura Municipal.
Não há, no entanto, impacto visível sobre o trânsito na região central, que continua intenso, com sucessivos congestionamentos. Somente a nova pesquisa origem-destino, prevista para 2017, irá confirmar (ou não) a eventual mudança na distribuição modal, ou da migração para outros locais.
A redução de vagas não teria determinado a substituição do carro pelo transporte coletivo (principalmente o metrô), mas, sim, a transferência dos escritórios ou residências para outras áreas da cidade.
Se assim for, a revitalização do centro teria sido apenas um "sopro de saúde", com uma nova recaída: porém, com menos vagas para estacionamento.
Conseguirá se recuperar novamente? Ou voltará a um processo continuado de degradação?
* Jorge Hori é consultorem Inteligência Estratégicae foi contratado pelo SINDEPARK para desenvolver o estudo sobre a Política de Estacionamentos que o Sindicato irá defender. Com mais de 50 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.
NOTA:
Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do SINDEPARK.