Depois de mexer com o mercado dos táxis, os aplicativos de transporte afetam agora outro serviço: o de valets. Funcionários de estacionamentos já passam noites sem trabalho, enquanto donos de restaurantes veem suas vagas vazias, apesar de terem clientes. Empresários dizem manter o serviço porque os concorrentes também continuam, mas não lucram com isso. Por outro lado, com a população voltando para casa de Uber, 99, Easy ou Cabify, os flagrantes de embriaguez ao volante vêm registrando quedas mesmo com aumento das blitze.
Na capital paulista, em geral os valets são serviços oferecidos pelos próprios restaurantes, que fazem convênios com empresas que contratam estacionamentos e manobristas. O serviço não fica barato. Na Vila Madalena, o bairro badalado da zona oeste, não se acha um deles por menos de R$ 25. E esse é também um dos fatores que tornam os apps atrativos.
“O preço do valet acaba sendo quase o preço de ir e voltar de Uber. E, além disso, tem aquela coisa de poder beber sem a preocupação de dirigir”, afirma o empresário Fabio Saez Salomão, dono de bares, na Vila Madalena. “Tenho de ter esse serviço, até porque meus concorrentes oferecem. Mas não me dá nenhum centavo.”
Dados da Polícia Militar, que faz as blitze da Lei Seca, indicam que, de fato, as pessoas estão bebendo menos ao volante. Em 2015, foram 350 flagrantes – ou um resultado positivo a cada 181 testes feitos pelos PMs. No ano passado, foram 226 – um a cada 539 testes. E o número de exames quase dobrou: de 63,4 mil em 2015 para 121,8 mil no ano passado.
“Temos um estacionamento para 120 carros, que ficava lotado sempre. Agora, nos almoços de domingo, a ocupação varia de 80 a 100 carros. E posso dizer que o consumo de vinho aumentou”, afirma Leonel Generale, de tradicional restaurante da Rua Pamplona, nos Jardins.
Comparando os três primeiros meses deste ano com o mesmo período de 2016, o uso de aplicativos de transporte na cidade subiu 15%. As empresas do setor não revelam seus dados.
No bolso
Na porta dos bares e restaurantes, preço competitivo e possibilidade de beber sem preocupação também são as respostas dadas por quem espera, segurando o celular, o carro pedido pelo app chegar. “Os valets custam R$ 25, R$ 30. Hoje, paguei R$ 11 no Uber”, diz a engenheira de sistemas Paula Ivoglo, de 33 anos.
“Antes, ia de táxi, de carro. Mas tem uma tranquilidade: que é poder beber à vontade sem se preocupar em dirigir depois, estar sujeito a um acidente. Passei a evitar dirigir depois da Lei Seca. Com os aplicativos, ficou mais fácil”, diz, com chope na mão, a bancária Alexandra Bruno, enquanto conversava com amigas.
Essa mudança de hábitos se faz notada em comércios de diferentes perfis. “Nunca tive valet porque estou em uma rua ampla, fácil de estacionar. Mas não faço nenhum plano para ter. Hoje, vejo que uns 80% dos meus clientes voltam para casa de Uber”, diz a empresária Luisa Ines Saliba, de Santa Cecília, na região central. Ela conta que, antes de os aplicativos chegarem, parte dos clientes vinha de carro e outra parcela, menor, usava táxi.
Para os bares, a redução da demanda tem outra vantagem. Historicamente, os valets são alvo de ações de fiscalização da Prefeitura, de olho no recolhimento de impostos do setor.
Os manobristas são o lado que perde na história. Nas portas dos restaurantes, são comuns as histórias de demissões e ameaças de fechamento. “Não está bom. Tem noite em que a gente pega cinco carros. É o serviço que uma pessoa faria sozinha. E nós estamos em quatro”, relata o funcionário de um valet da Rua Aspicuelta, na Vila Madalena.
Em números
13 milhões é o total de usuários do Uber, segundo a empresa. No País desde 2014, o app chegou a 1 milhão de clientes em janeiro de 2016.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 17 de abril de 2017
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