Após o alto número de desistências na participação do Salão do Automóvel de São Paulo este ano, as montadoras decidiram por unanimidade adiar o evento para 2021, sem no entanto confirmar qual será a nova data. Segundo Luiz Carlos Moraes, presidente da associação dos fabricantes de veículos, a Anfavea, a decisão foi tomada em consenso de todas as empresas associadas, “as que iam e as que disseram que não iam”, levando em consideração a necessidade de mudar o evento diante das tendências globais que afetam o setor e, principalmente, para reduzir os altos custos do evento.
“O setor gasta de R$ 250 milhões a R$ 300 milhões em um salão. É legítimo discutir se faz sentido gastar valores tão elevados em um momento que precisamos fazer grandes investimentos em novas tecnologias, redução de emissões e eficiência energética. Temos ainda grande ociosidade nas fábricas, não alcançamos o crescimento que precisamos e as matrizes não podem mais enviar recursos para cá diante dos pesados investimentos que precisam também realizar lá”, afirma Luiz Carlos Moraes.
Nos custos mencionados, Moraes explica que estão envolvidos muitos gastos diferentes, que excedem em muito os valores pagos pelo aluguel do espaço da organizadora oficial do evento, a Reed Exhibitions Alcântara Machado, que cobra R$ 450 por metro quadrado locado no pavilhão São Paulo Expo, onde o evento vinha acontecendo desde 2016.
Moraes insiste que “o salão foi adiado, não cancelado”, embora a data de realização do evento em 2021 não tenha sido definida. “Mas queremos fazer isso logo. Já na semana que vem vamos nos reunir com as associadas e a Reed para estudar propostas para um novo salão, com novo formato e novo público. Esperamos anunciar o mais rápido possível”, promete. Ele acrescenta que a Oica, a Organização Internacional dos Construtores de Veículos, já foi informada sobre o adiamento, e não cancelamento, do salão brasileiro.
SALÃO GRANDE PARA CAIXA ESVAZIADO
No auge da mais recente crise econômica no Brasil, em 2016 foi realizado o primeiro salão no espaço do SP Expo com quase todas as fabricantes e importadoras presentes. Na edição seguinte do evento, em 2018, cinco marcas desistiram de montar seu estande, mas o salão continuou grande, talvez mostrando os últimos suspiros de uma pujança que o setor não tinha mais em seu caixa, esvaziado por anos de vendas em queda livre e rentabilidade baixa ou negativa. Não fosse por isso, é certo que ninguém estaria discutindo os custos deste salão – como não se discutiu em momentos piores do que o atual.
O fato é que o mercado não se recuperou na medida necessária para que todas as perdas fossem recuperadas no País, ao mesmo tempo em que as matrizes não podem mais socorrer as subsidiárias brasileiras como fizeram nos últimos 10 anos – período em que segundo a Anfavea enviaram US$ 24 bilhões às operações no Brasil, incluindo investimentos diretos ou empréstimos intercompanhias. Agora as multinacionais cobram o retorno do que já investiram aqui e precisam fazer investimentos bilionários em novas tecnologias para garantir sua própria sobrevivência no mundo em transformação disruptiva. Nesse dilema, o Salão do Automóvel de São Paulo “pagou o pato”.
SALÃO DEVE TER MAIS APOIO DA CIDADE?
Moraes afirma que o setor reconhece a importância do evento, que atrai cerca de 750 mil visitantes a cada edição e em 2018 gerou 30 mil empregos temporários trouxe impacto positivo de R$ 320 milhões para a cidade de São Paulo, incluindo gastos de turistas e impostos arrecadados, segundo cálculos da organizadora Reed Alcântara. “Em um momento difícil como o que estamos passando, com baixo crescimento e necessidade de altos investimentos, a discussão que precisamos ter é se podemos ter o mesmo resultado [do salão] com menos gastos”, destaca.
O presidente da Anfavea conta que “tudo está sobre a mesa” de negociação, desde o local – o SP Expo recebeu muitas críticas pela dificuldade de acesso que forma trânsito pesado no entorno do pavilhão – até a própria cidade. Em uma sutil alusão de que o município ou Estado deveria contribuir mais para a realização do evento, Moraes citou que três cidades na Alemanha (Berlim, Hamburgo e Munique) concorreram para sediar o salão automotivo do país, um dos maiores do mundo, que deixou de ser realizado tradicionalmente em Frankfurt e em 2021 passará a ser feito em Munique. “Certamente essas cidades entraram na concorrência porque o evento traz ganhos”, disse.
“Agora vamos nos fechar e rediscutir o formato do salão. Temos muitas propostas em estudo, inclusive a venda de carros no evento. O que não dá é fazer outro formato pelo mesmo preço”, afirma Luiz Carlos Moraes.
FONTE: AUTOMOTIVE BUSINESS, 06/03/2020