Puxado mais uma vez pela redução da gasolina, o IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) teve deflação (queda) de 0,37% em setembro, informou nesta terça-feira (27) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Trata-se da segunda baixa consecutiva do índice prévio de inflação, que havia recuado 0,73% em agosto. Para meses de setembro, a redução de 0,37% é a mais intensa desde 1998, conforme o IBGE. A baixa havia alcançado 0,44% naquele ano.
A nova deflação foi mais forte do que a esperada por analistas. Pesquisas da agência Reuters e da Bloomberg projetavam queda de 0,20% em setembro.
No acumulado de 12 meses, o IPCA-15 registrou alta de 7,96%. O avanço era de 9,60% até agosto. O acumulado não ficava abaixo de 8% desde maio de 2021 (7,27%).
Corte de ICMS impacta resultado
Mesmo com a deflação no índice geral, apenas 3 dos 9 grupos de produtos e serviços pesquisados caíram em setembro, ponderou o IBGE. A maior influência veio dos transportes, que recuaram 2,35%. O impacto do grupo foi de -0,49 ponto percentual no mês.
Os transportes voltaram a refletir a queda dos combustíveis (-9,47%), após os cortes de ICMS (imposto estadual) e a trégua dos preços nas refinarias. Etanol (-10,10%), gasolina (-9,78%), óleo diesel (-5,40%) e gás veicular (-0,30%) mostraram baixas. A gasolina, aliás, teve o impacto individual mais intenso para a deflação do índice geral (-0,52 ponto percentual). Se esse combustível tivesse registrado variação zero, o IPCA-15 subiria 0,15% em setembro, aponta a economista Claudia Moreno, do C6 Bank.
Ainda houve recuos nos grupos comunicação (-2,74%) e alimentação e bebidas (-0,47%). Os dois segmentos tiveram impactos de -0,14 ponto percentual e -0,10 ponto percentual, respectivamente.
Assim como os transportes, serviços de comunicação foram incluídos na lei que fixou teto para cobrança de ICMS.
Segundo o IPCA-15, houve redução nos planos de telefonia fixa (-6,58%) e móvel (-1,36%). Outras quedas vieram dos pacotes de acesso à internet (-10,57%) e dos combos de telefonia, internet e TV por assinatura (-2,72%).
Para Moreno, é preciso ter cautela para interpretar os dados, porque o IPCA-15 seguiu com efeitos dos cortes tributários. A economista do C6 Bank vê os núcleos de inflação em patamar ainda elevado.
"O resultado, melhor que o esperado, foi mais uma vez impactado pelo efeito da redução da alíquota do ICMS sobre combustíveis, energia e comunicação", disse.
Pressionado pela carestia às vésperas das eleições, o presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou o teto para a cobrança do imposto no final de junho.
ALÍVIO NOS ALIMENTOS PARA CONSUMO EM CASA
O grupo alimentação e bebidas, por sua vez, recuou pela primeira vez desde julho de 2020 (-0,13%). O resultado foi puxado pela alimentação no domicílio (-0,86%). Contribuíram para isso o óleo de soja (-6,50%), o tomate (-8,04%) e, principalmente, o leite longa vida (-12,01%), que havia disparado no país.
De acordo com economistas, o alívio nos preços da comida reflete melhores condições climáticas para a produção de parte dos alimentos nos últimos meses, além da baixa das commodities no mercado internacional.
A cebola (11,39%), o frango em pedaços (1,64%) e as frutas (1,33%), por outro lado, responderam pelas maiores pressões para cima. O grupo alimentação e bebidas ainda acumula inflação de 12,73% em 12 meses, o que castiga sobretudo o bolso dos mais pobres.
Vestuário e saúde sobem
Do lado das altas no IPCA-15, a maior variação foi registrada por vestuário (1,66%), que acelerou em relação a agosto (0,76%). Roupas femininas (1,83%), masculinas (1,78%) e infantis (1,52%) ficaram mais caras.
Outro destaque veio do grupo saúde e cuidados pessoais, que subiu 0,94%. Foi o principal impacto positivo no IPCA-15 (0,12 ponto percentual). A carestia atingiu higiene pessoal (1,28%) e planos de saúde (1,13%).
O índice oficial de inflação do Brasil é o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), também divulgado pelo IBGE. Como a variação do IPCA é calculada ao longo do mês de referência, o dado de setembro ainda não está fechado. Será conhecido em 11 de outubro.
O IPCA-15, pelo fato de ser divulgado antes, sinaliza uma tendência para os preços. O indicador prévio é coletado na segunda metade do mês anterior e na primeira metade do mês de referência da divulgação —neste caso, agosto e setembro. Para Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados, a nova deflação do IPCA-15 reforça as perspectivas de inflação mais baixa neste ano. Agora, ele vê chances mais claras de o IPCA ficar entre 5,5% e 6% no acumulado até dezembro, algo que não era cogitado até pouco tempo atrás.
Ainda assim, o economista menciona que os preços estão em patamar elevado, o que cria um cenário "desfavorável" para a reeleição de Bolsonaro. "O cenário segue complicado. Ainda temos uma inflação importante, apesar da queda nos últimos meses", diz Vale. "A inflação caiu de forma muito concentrada em alguns itens, como os combustíveis. Só agora isso está começando a chegar aos alimentos", completa.
Em 12 meses, o IPCA-15 está distante (7,96%) da meta de inflação perseguida pelo BC (Banco Central) para o IPCA. O centro da meta é de 3,50% em 2022, com intervalo de tolerância de até 5%.
A alta prevista pelo mercado financeiro para o IPCA é de 5,88% até dezembro, aponta a mediana do boletim Focus, publicado pelo BC na segunda-feira (26). Se a estimativa for confirmada, o Brasil terá o segundo ano consecutivo de estouro da meta. Em setembro, a expectativa para o IPCA é de deflação aproximada de 0,15%, segundo o economista Rafael Marques, da assessoria de investimentos Philos Invest. Seria o terceiro mês de queda em sequência. O IPCA, diz Marques, tende a voltar para o terreno positivo a partir de outubro.
Folha de S. Paulo, 27/09/2022