O candidato que vencer a eleição de novembro para a Prefeitura de São Paulo deve assumir sob pressão de dois temas de forte impacto popular na área de mobilidade: os custos represados do serviço de ônibus no pós-pandemia da Covid-19 e a volta da polêmica na mudança de velocidade das marginais, que dominou a campanha anterior.
Como a pandemia da Covid-19 afetou o transporte na cidade e quais os desafios do próximo prefeito?
O medo da contaminação pelo coronavírus, o fechamento de comércios durante parte do ano e a opção de trabalho a distância para uma parcela da população fizeram despencar o número de passageiros no transporte público municipal.
Mesmo com a retomada das atividades econômicas nos últimos meses, o número de passageiros transportados no sistema de ônibus na capital paulista estava neste mês próximo de 5 milhões em dias úteis, em torno de 40% a menos que a média de passageiros em dias úteis no ano passado, que foi de 8,6 milhões, segundo dados da Sptrans (órgão municipal).
Assim, caiu também a receita das empresas de ônibus, que, para não interromper ou diminuir o serviço, passaram a contar com um repasse maior da prefeitura, os chamados subsídios.
A proposta orçamentária de 2020 para compensações tarifárias no ano todo era de R$ 2,25 bilhões. Segundo o TCM (Tribunal de Contas do Município), no entanto, só até julho a prefeitura já havia repassado R$ 1,7 bilhão. O tribunal teme que chegue a R$ 4 bilhões até o fim do ano.
Pesquisa do Ibope contratada pela Rede Nossa São Paulo, feita em julho, mostra que 30% dos paulistanos dizem querer usar menos os ônibus quando a pandemia passar e o isolamento social não for mais necessário.
Isso acontece em um momento em que o sistema já vinha perdendo passageiros há anos. Em 2017 houve média de 238,7 milhões de viagens por mês nos ônibus paulistanos. Em 2019, 19 milhões a menos.
Uma opção para equilibrar esse custo da queda de demanda é aumentar a tarifa, hoje em R$ 4,40, mas que terá maior resistência com a crise e o desemprego provocados pela pandemia. Outra é reduzir a gama de passageiros que têm direito à gratuidade —parte dependeria de mudanças em lei. Segundo o Spurbanuss (sindicato das viações), hoje só 47% dos passageiros são pagantes.
Que investimentos em infraestrutura o prefeito pode fazer?
Para as empresas de ônibus e boa parte dos especialistas, o principal investimento que a prefeitura pode fazer para tornar o sistema mais eficiente é investir em vias exclusivas.
Em 2019, os ônibus circularam a 20 km/h no horário de pico da manhã nas faixas exclusivas, compartilhadas com os carros e segregadas apenas por uma pintura no asfalto. No pico da tarde, a velocidade média foi de 17 km/h —menos do que a máxima permitida para patinetes.
Mais eficientes são os corredores, que são mais caros, com asfalto mais resistente, e ficam à esquerda da via. Os veículos andaram em média a 22,2 km/h no pico da manhã e a 19,8 km/h no da tarde no ano passado.
Acontece que a ampliação de vias exclusivas emperrou. Há, hoje, 500 km de faixas exclusivas e 129,1 km de corredores. Quando a gestão Doria-Covas assumiu, em 2017, colocou como meta a construção de 72 km de corredores, mas Covas reviu a meta no ano passado e baixou a previsão para 9,4 km. A gestão anterior, de Fernando Haddad (PT), também não entregou os 150 km de corredores prometidos (culpou a falta de repasse de verbas federais), e apostou nas faixas exclusivas, que são mais baratas.
O prefeito também pode atuar para aumentar a velocidade dos carros?
Um dos principais temas da última eleição municipal em São Paulo foi o limite de velocidade. Isso porque, um ano antes, o então prefeito Haddad havia baixado as máximas permitidas. As primeiras vias afetadas foram as marginais Tietê e Pinheiros, cujos limites na via expressa baixaram de 90 para 70 km/h e, na local, de 70 para 50 km/h.
A marginal Tietê é, historicamente, a via com maior número de acidentes fatais na cidade. Em 2014, um ano antes da redução, houve 37 acidentes com mortes. Em 2015, quando as velocidades baixaram, foram 26. No ano seguinte, 14.
Doria foi eleito em 2016 e assumiu em 2017 com a promessa de que restabeleceria os limites anteriores. Pressionado, manteve os 50 km/h em uma das faixas da pista local e aumentou para 60 km/h nas outras. Na expressa, voltou a 90 km/h. Na pista central, que existe na marginal Tietê, o limite também foi restabelecido para 70 km/h.
No primeiro ano de mudança, o número de acidentes fatais na marginal Tietê subiu para 18. No ano seguinte, baixou para 14. Mas ele cresceu de novo e bateu recorde desde a redução: 21 em 2019.
A alta velocidade é tida por especialistas em trânsito e transportes como um dos principais fatores que aumentam a letalidade dos acidentes.
O próximo prefeito pode se ver obrigado a alterar de novo a velocidade das marginais. Neste ano, a Procuradoria-geral da República deu um parecer contrário à mudança que foi feita por Doria, num processo que questiona a medida e que está hoje no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
O prefeito eleito pode restringir o transporte por aplicativos como Uber e 99?
As corridas por aplicativos, que causaram polêmica entre taxistas quando começaram a operar no país, foram regulamentadas pela prefeitura da capital paulista em 2016.
Em 2018, virou lei federal, e no ano seguinte o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que os municípios não podem contrariar essa lei e proibir esses serviços.
O que as cidades podem fazer é colocar regras específicas. Há projetos na Câmara de São Paulo, por exemplo, que tentam limitar o número de motoristas na cidade, impedir a criação de pontos fixos (como em aeroportos) e obrigar que os carros sejam licenciados em São Paulo —o que impediria carros alugados com placas de Belo Horizonte, por exemplo, comuns em locadoras de veículos onde os impostos são menores, entre outras coisas.
Se aprovados pelos vereadores, esses projetos seguem para sanção ou veto do prefeito.
Fonte: Agora São Paulo - Destaque do Dia - SP - 21/09/2020