O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou ontem, véspera de um debate no Senado que reunirá governadores que vão discutir a reforma tributária, estudo indicando que 18 Estados e o Distrito Federal vão ampliar sua participação no bolo tributário se as mudanças já aprovadas pela Câmara dos Deputados forem ratificadas pelos senadores. Segundo o levantamento, seis Unidades da Federação perderão espaço e duas devem ficar como estão.
Segundo o trabalho, 82% dos municípios do País vão arrecadar mais e o grau de desigualdade cairia 21% entre as cidades, segundo o índice de Gini – indicador que mede a concentração de renda. O estudo apontou ainda que municípios com menor Produto Interno Bruto (PIB) per capita ganhariam com a mudança. Por volta de R$ 50 bilhões, ou 21% das receitas municipais, chegariam aos cofres das prefeituras beneficiadas. Essas cidades correspondem a 67% da população do País.
De acordo com o Ipea, o estudo Impactos Redistributivos da Reforma Tributária: Estimativas
Atualizadas simulou quanto cada Estado e cada um dos 5.568 municípios brasileiros estariam arrecadando se a reforma já estivesse vigorando no ano passado.
O que explica o efeito redistributivo dos Estados e municípios mais ricos para os mais pobres, segundo os pesquisadores, é a unificação do ICMS e ISS em um novo imposto sobre bens e serviços, cuja arrecadação pertenceria ao local de consumo e não ao em que estão instaladas as empresas, como hoje.
“Se o imposto incide sobre o consumo e é pago pelos consumidores, nada mais justo e natural que esse imposto retorne para o local em que vivem as pessoas que pagaram por ele”, afirma Sergio Gobetti, um dos autores do estudo ao lado da economista Priscila Monteiro.
ENCONTRO
A reunião com os 27 governadores do País foi marcada para hoje pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no plenário da Casa. A sessão deve durar todo o dia e é aguardada com grande expectativa em razão do embate entre os Estados das regiões mais ricas e pobres que começou a ser travado ainda na Câmara em torno da divisão dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional, previsto na reforma. Prefeitos das capitais e maiores cidades também estão insatisfeitos com o texto.
Segundo o economista do Ipea, a sistemática atual de distribuição das receitas gera extrema desigualdade entre os municípios de praticamente todas as unidades federadas. Em Goiás, por exemplo, a diferença de receita per capita entre a cidade mais rica (Alto Horizonte) e a mais pobre (Santo Antônio do Descoberto) chega a 127 vezes. Com a reforma, cairia para quatro vezes.
DIVISÃO
Em alguns Unidades da Federação, pode haver perda de receita, mas os municípios ganham mais, o que explica por que o porcentual de Estados ganhadores ser menor do que o dos municípios ganhadores.
O estudo aponta seis Unidades da Federação (Amazonas, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Rondônia) como os potenciais “perdedores”, mas apresenta simulações segundo as quais nenhum (e também nenhuma capital) terá queda de arrecadação em razão da regra de transição que vai durar 50 anos.
No levantamento, os dados de cada Unidade da Federação foram representados pela soma das receitas dos Estados e dos seus municípios. No caso de São Paulo, a redução ocorre devido, principalmente, à perda de participação da sua capital e alguns municípios. O governo de São Paulo também teria uma perda relativa de 7%.
COMPENSAÇÃO
A queda de arrecadação é evitada, segundo os pesquisadores, porque a regra de transição prevê que, nas primeiras décadas, a maior parte das receitas continue sendo distribuída pelas regras atuais. Daqui a 25 anos, por exemplo, no meio da transição, metade dos recursos continuaria repartida como hoje e outra metade seria entregue para a localidade de consumo.
Além disso, o fundo de compensação constituído com 3% da receita do novo imposto também reforçaria o caixa dos Estados e municípios “perdedores”. “Na maior parte dos casos, a menor fatia do bolo de alguns entes federados será compensada pelo crescimento do próprio bolo, mesmo em cenários mais pessimistas de crescimento da economia”, diz Gobetti.
Sem mudanças
Senador diz que Casa vai manter isenção de itens da cesta básica aprovada pela Câmara
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu a fixação de limite para alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), discutido na reforma tributária como forma de unificar tributos sobre consumo praticados atualmente. Para ele, não se pode dar “um cheque em branco” em relação ao tema, e o Brasil não deve se “contentar em ter o maior IVA do mundo”.
“Não me parece que tenham países muito além de 25% na nossa alíquota. (Se devemos ter) essa preocupação com ser o País com maior taxa de juros do mundo, não podemos nos contentar em ter o maior IVA do mundo. Não podemos aceitar um cheque em branco para qualquer tipo de alíquota”, disse Pacheco durante encontro organizado pelo Lide, ontem, em São Paulo.
Pacheco disse, porém, que a decisão sobre o teto para o IVA será do relator do projeto no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM).
A equipe econômica tem dito que, quanto mais exceções forem aprovadas no Congresso, mais alta será a alíquota do IVA. Se não houvesse nenhuma exceção e todos pagassem a mesma alíquota, o cálculo é que o imposto ficaria entre 20% e 22%. Mas, apenas com as exceções já aprovadas na Câmara, essa alíquota ficaria entre 25% e 27%.
Ao falar sobre benefícios tributários, Pacheco afirmou que o Senado vai manter a isenção de impostos para a cesta básica, aprovada pela Câmara. “Baratear alimentos é uma preocupação na tramitação da reforma tributária. Não deverá ter retrocesso na reforma quanto à isenção da cesta básica”, afirmou.
O presidente do Senado disse também que não haverá “retrocessos” para as micro e pequenas empresas na proposta discutida na Casa. Ele afirmou ainda que o prazo de transição para aplicação do novo sistema tributário, discutido na Câmara, é “razoável”, mas pode sofrer modificações durante a tramitação no Senado.
EQUILÍBRIO.
O presidente do Senado pregou equilíbrio entre os Poderes, afirmou que o Legislativo também estimula a “insegurança jurídica” no Brasil e disse que Judiciário e Executivo terão de respeitar as novas regras para tributação chanceladas pelo Congresso. “Isso se aplica ao Poder Executivo desde todas as instâncias do Poder Judiciário, para que possamos ter um sistema tributário simplificado e que possa estar insuscetível a questionamentos que comprometam a higidez do processo.”
O Estado de S. Paulo - Economia & Negócios - 29/08/2023