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Estacionar de graça é missão quase impossível em Campinas

A expansão da cobrança de estacionamento em pontos comerciais e de serviços particulares está levando os motoristas de Campinas a buscar alternativas para fugir desse tipo de gasto extra. A mudança de comportamento pode ser sentida em áreas no entorno de shopping centers, clínicas, laboratórios, hospitais, hotéis, bancos, rodoviária e aeroporto da cidade. O aposentado Valdecir Garbin, de Americana, deixou o veículo na Rua Dr. Edilberto Luís Pereira da Silva, na Cidade Universitária, para não pagar o estacionamento em um hospital onde a sobrinha faz tratamento médico. "Até paguei uma vez. Depois, nunca mais. Não sei quanto tempo vou ficar e quanto isso vai custar", explicou. No caso desse estabelecimento de saúde, o estacionamento terceirizado cobra R$ 13 pela primeira hora e R$ 7 pelas demais. "O único desconforto é que tenho que andar um pouco", disse Garbin.

Uma novidade que também está se disseminando é a adoção do estacionamento rotativo em shopping centers, o que gera críticas dos clientes. Dos seis maiores centros comerciais da cidade, dois, um na Vila Brandina e outro no Jardim Nilópolis, adotaram recentemente esse modelo de cobrança. No primeiro, a tarifa é de R$ 14 por 5 horas e R$ 2 pelas horas adicionais. O segundo cobra R$ 12 por 4 horas e R$ 2 por hora excedente.

No centro de compras do Brandina, a diferença a ser paga pelo consumidor pode chegar a 100%. Antes, o estacionamento terceirizado cobrava a tarifa única de R$ 14 por 12 horas. Agora, o valor chega a R$ 28 pelo mesmo período. "Eu fui surpreendido pela mudança. Fiquei sabendo quando fui pagar. Não havia nenhum cartaz informando a alteração", reclamou o funcionário público João Carlos Tavares. "Acho um absurdo a cobrança, pois a gente vem aqui para consumir e não tem mais nada perto", completou.

Fonte de receita

Para o consultor empresarial Gilberto Rosso, a cobrança de estacionamento em locais particulares decorre do fato de as empresas se concentrarem em suas atividades essenciais e terceirizarem as "acessórias". O procedimento também ajuda a reforçar o caixa. "A tendência é transferir para terceiros as atividades que não fazem parte do negócio principal da organização. É uma tendência moderna que consiste na concentração de esforços nas atividades essenciais e que também gera uma nova fonte de renda", afirmou.

De acordo com a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrase), os 577 centros comerciais existentes no país disponibilizam quase 1 milhão de vagas em estacionamentos. Levando-se em conta uma ocupação média de 70% e uma tarifa de R$ 14, o faturamento diário é de R$ 9,8 milhões ao dia. Ao longo de um ano, o valor salta para R$ 3,57 bilhões. Isso representa apenas 1,86% dos R$ 192 bilhões que os shoppings movimentam por ano, mas o montante gerado transforma o estacionamento em um negócio interessante para os empreendimentos e empresas que terceirizam o serviço.

Outros locais

A Rua 1, lateral à Avenida Guilherme Campos, no Jardim Santa Genebra, é usada para deixar o carro por quem não quer pagar o estacionamento do shopping próximo, que cobra R$ 13 pelo período de 12 horas. "Eu paro sempre aqui, o estacionamento é muito caro", afirmou o jardineiro Valcir Clemente. Foi o que fez terça-feira (9) ao ter que ir até o local para fazer uma troca de produto.

Próximo a ele, o motorista de táxi Paulo Pereira de Santana, de São Paulo, estava estacionado à espera dos clientes que trouxe para visitar o empreendimento. "Se for pagar o estacionamento, fica inviável. Eu vi os carros parados aqui e também parei", justificou.

"Fui fazer exame e acabei surpreendia pela cobrança de estacionamento de R$ 10 na área demarcada no recuo, sem cobertura, sem manobrista. Nem paciente escapa", criticou a cliente de uma clínica na Rua Sacramento, no Centro, que pediu para não ser identificada. "Sendo assim, vou pagar a Zona Azul. Pelo menos, a gente acredita que o dinheiro vai ser usado em 'benefício' do cidadão campineiro", desabafou.

Hotéis de Campinas também cobram estacionamento de frequentadores que não estão hospedados, como ocorre com estabelecimentos no Distrito de Nova Aparecida e Jardim Califórnia, que recebem muitos eventos. Para o motorista de aplicativo Ernesto Carvalho, a alternativa é usar a tolerância de 15 minutos para deixar os clientes e ficar estacionado nas proximidades à espera de outra corrida. "Muitos locais estão cobrando para estacionar, é um absurdo. Deveriam liberar para a gente", defendeu.

Todos os dias, ele vai ao menos a quatro locais de grande fluxo de pessoas que cobram estacionamento. "A cada dia aumentam os estabelecimentos que adotam a cobrança", disse. O também motorista de aplicativo Sandro Sacardo é outro que busca opções sem custo para parar o carro. "A gente tem que procurar economizar", justificou. Isso porque o custo do estacionamento reduzirá o ganho, já que os clientes evitam assumir a despesa. Agências bancárias em bairros de grande movimento, como o Centro e o Taquaral, também cobram para parar o carro. "A tolerância que dão muitas vezes não é suficiente para ser atendido", critica o metalúrgico Afonso Pereira dos Santos.

De carona

Há locais, porém, onde não há opção para estacionar nas proximidades e fugir do estacionamento pago, como ocorre no terminal rodoviário e no Aeroporto Internacional de Viracopos. Nesses casos, muitas pessoas evitam ir com o carro próprio e buscam de carona. "Aqui por perto não tem lugar para parar, não é seguro. A solução é pedir para alguém me trazer e me deixar", disse o contador Luiz Aparecido Pontes, pouco antes de pegar ônibus para ir para São Paulo. Essa é a alternativa usada pelo advogado Jonas Paes de Barros para viajar por Viracopos. "Deixar o carro no aeroporto ou perto sai caro", disse.

O tempo de permanência no estacionamento do local custa R$ 18 por 1 hora e chega a R$ 59 por 9 horas. A partir de 10h, é cobrado o preço único de R$ 63 por dia. Nas proximidades, há outros estacionamentos que cobram diária de R$ 20 por vaga descoberta e R$ 27 na coberta.

Tentar parar em locais proibidos para tentar escapar da cobrança dos estacionamentos sai mais caro. A infração é considerada média, a multa é de R$ 130,16, o condutor leva quatro pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e o veículo pode ser guinchado.

Direitos do consumidor

O advogado Pedro Quagliato, especialista em direito do consumidor, disse que a cobrança de estacionamento em locais particulares é legal, mas os clientes têm que ficar atento às responsabilidades da empresa. "O estabelecimento que disponibiliza estacionamento é responsável por qualquer problema que houver com o carro, seja clínica, shopping ou loja", explicou. A responsabilidade está definida pela súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que prevê indenização até mesmo para locais que fornecem estacionamento gratuito e inclui casos de furto do veículo.

De acordo Quagliato, o natural é que a pessoa lesada processe o proprietário do estacionamento e não a empresa terceirizada responsável pelo serviço. O advogado apontou ainda que os clientes podem fazer reclamações junto ao Procon quando considerarem que houve práticas abusivas, como em casos de valores altos ou cobrança de tarifa cheia quando perdem o tíquete de controle do estacionamento.

O advogado lembra que a lei municipal 15.809/2019 estabelecia que os shoppings centers e hipermercados de Campinas deveriam fornecer estacionamento quando os clientes gastassem a partir de dez vezes o valor da tarifa. Porém, acrescentou que a aplicação da legislação foi suspensa provisoriamente no mesmo ano pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e depois em caráter definitivo em 2020. A sentença foi proferida em função de ação movida pela Associação Brasileira de Shopping Centers, com o TJ entendendo que houve vícios formais de constitucionalidade. Os desembargadores entenderam que a lei deveria ser criada pela União, não cabendo ao município tratar do assunto.
Correio Popular - Campinas - SP - 10/08/2022

Categoria: Geral


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