Em um esforço para fazer a reforma tributária avançar no Senado, o relator do texto, Eduardo Braga (MDB-AM), acolheu novas demandas setoriais e aumentou o Fundo Nacional do Desenvolvimento Regional (FNDR), um pedido dos governadores. O parecer foi visto como um avanço em relação ao que foi aprovado na Câmara dos Deputados, mas parlamentares já admitem novas mudanças e não descartam um adiamento da votação.
A meta do governo é votá-lo no Senado em novembro, para que o texto volte à Câmara e ainda seja promulgado antes do recesso. A expectativa é que em 2024 o Congresso possa se debruçar sobre as propostas de leis complementares que regulamentarão a reforma tributária do consumo.
Tendo como base a proposta aprovada na Câmara, o texto unifica ISS, ICMS, PIS, Cofins e IPI em três novos impostos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de gestão federal; o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), gerido pelo Conselho Federativo, composto por representantes dos Estados e municípios; e um Imposto Seletivo (IS), federal, que incidirá sobre bens e serviços prejudiciais à saúde. O projeto visa acabar com a guerra fiscal, e prevê um período de transição para a adoção do novo sistema.
“Os regimes diferenciados serão submetidos a avaliação quinquenal de custo-benefício, podendo a lei fixar regime de transição para a alíquota padrão, garantidos os respectivos ajustes nas alíquotas de referência”, disse Braga, durante apresentação do texto à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). “Por isso mesmo, fomos bastante seletivos diante das incontáveis demandas por novas exceções. Mas não perdemos de vista os princípios que motivaram a apresentação dessa PEC 45, entre eles a necessidade de desoneração dos bens de capital, como forma de assegurar investimentos para a modernização de alguns setores, como infraestrutura e saneamento.”
Braga propôs em seu parecer a criação de uma trava para o crescimento da carga tributária sobre o consumo, a ampliação do aporte anual do governo federal no Fundo Nacional do Desenvolvimento Regional (FNDR) para R$ 60 bilhões e a restrição do número de produtos da cesta básica que terão alíquota zero.
No caso da trava à carga, o texto institui um teto de referência com base na média da receita no período de 2012 a 2021, apurada como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). A alíquota de referência dos tributos será reduzida caso exceda esse limite. O teto para a carga tributária estaria hoje em 12,5% do PIB, informou uma fonte do governo. O ideal, do ponto de vista do Executivo, seria não ter essa limitação.
Em relação ao FNDR, cuja função é compensar Estados pelas perdas na arrecadação com as novas regras tributárias, a mudança significa um incremento de R$ 20 bilhões em relação ao texto aprovado na Câmara. A versão dos deputados estabelecia um aumento progressivo do fundo até atingir o teto de R$ 40 bilhões em 2033. Já os Estados pleiteiam um aumento entre R$ 75 bilhões e R$ 80 bilhões.
Pela proposta de Braga, o aumento extra será distribuído ao longo de dez anos. A partir de 2034, haverá um incremento de R$ 2 bilhões ao ano, até alcançar os R$ 60 bilhões anuais em 2043.
Braga também inseriu uma nova proposta de divisão do fundo, com 70% dos recursos distribuídos segundo os critérios do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e 30% com base nos Estados mais populosos. Outra mudança foi transformar o conselho federativo em comitê gestor, que ficará sem a possibilidade de ter iniciativa de lei. Esse era um dos principais pontos de atrito na Casa.
O relatório prevê redução de 60% das alíquotas dos tributos incidentes sobre itens como produtos de limpeza e higiene pessoal consumidos majoritariamente por famílias de baixa renda. A alíquota reduzida beneficia, ainda, serviços de transporte coletivo de passageiros.
Braga manteve os produtos e insumos agropecuários entre os itens que terão redução da alíquota, algo que já estava previsto na versão que veio da Câmara dos Deputados e era um dos principais pleitos da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
Os profissionais liberais, por sua vez, terão desconto de 30% na alíquota. A medida deve beneficiar advogados, dentistas, médicos e engenheiros.
Braga também cedeu e incluiu novos setores entre as exceções, como agências de viagem, concessão de rodovias, missões diplomáticas, serviços de saneamento e telecomunicações, que terão regimes específicos.
No geral, a avaliação no governo é que o saldo do relatório é positivo, especialmente a limitação da isenção da cesta básica e a forma como parte do setor de transportes foi retirado da alíquota favorecida para um regime específico.
Mas, diante das concessões, técnicos avaliam se vão atualizar o estudo que apontou para uma alíquota-padrão para a soma do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) entre 25,45% e 27%.
Uma novidade no relatório apresentado foi a possibilidade de cobrar Imposto Seletivo sobre a extração de petróleo e minérios, a uma alíquota de até 1%. O governo ainda não tem estimativa de quanto poderá ser arrecadado. Mas o fato de o Seletivo ter ficado maior do que estava na versão aprovada pela Câmara poderá contribuir para reduzir a alíquota da CBS, comentou uma fonte. A tributação será um novo custo para a Petrobras, admitiu.
Relator da reforma tributária na Câmara, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) gostou do parecer apresentado por Braga. Ao Valor, Aguinaldo ele disse que o parecer contempla quase 90% dos pontos defendidos pela maioria dos deputados e demonstrou confiança de que o texto será aprovado no Senado no início de novembro.
Valor Econômico - SP - 26/10/2023