O Pix completa um ano hoje (16) e já acumula 112,6 milhões de usuários. Segundo o Banco Central, foi o sistema de pagamentos instantâneos com adesão mais rápida no mundo. Entre erros e acertos, a nova ferramenta facilitou transferências e viabilizou novos modelos de negócio. Desde o lançamento, o sucesso do Pix foi consolidado entre pessoas físicas, que respondem por 93,4% dos usuários cadastrados atualmente. Já entre empresas, a adesão foi mais lenta, com 7,4 milhões (6,57% dos usuários). Segundo a autoridade monetária, isso ocorre porque os comerciantes precisam adaptar os sistemas para receber com Pix. Ainda assim, em números absolutos, o número de empresas cadastradas cresce a cada dia. Em janeiro, eram 3,98 milhões de estabelecimentos registrados.
De acordo com pesquisa feita pelo Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), oito em cada dez negócios pequenos usam o novo meio de pagamento. "Negócios menores tiveram mais facilidade para implementar recebimento com Pix porque os sistemas de gestão de caixa são menos complexos. A adoção por trabalhadores autônomos, por exemplo, foi quase instantânea", avalia Carlos Netto, presidente da Matera, empresa de tecnologia para o mercado financeiro. Vivaldo Gonçalves dos Santos, 60, vende água de coco na área central de Brasília e adotou o novo sistema dois meses após o lançamento. "Fiquei desconfiado e quis esperar para ver se ia dar certo. Hoje, metade das minhas vendas são feitas com Pix", conta. Santos afirma que teve benefícios com o sistema porque é gratuito e o dinheiro fica disponível na hora. "Uma vez um cliente disse que ia fazer o Pix, me mostrou a tela, mas acabou não fazendo e saiu sem pagar. Esse foi o único problema que tive", lembra.
Kayllan Jorge Rodrigues, 26, é dono de uma loja de eletrônicos no Sudoeste, bairro na região central de Brasília, e relata que 20% das suas vendas são feitas com Pix. Em contrapartida, desde o lançamento da nova ferramenta, caíram em 30% os recebimentos em dinheiro. "O principal meio de pagamento ainda é cartão, mas acredito que a tendência é de crescimento do uso do Pix, porque tem vantagem para quem paga e para quem recebe", afirma.
Até outubro, 348 milhões de chaves estavam cadastradas no Pix. Uma pessoa pode fazer até cinco chaves por conta e uma empresa, até 20. Na prática, quem faz o cadastramento das chaves não precisa informar todos os seus dados na hora de transferir dinheiro ou pagar pelo Pix. A pessoa precisará apenas falar a chave cadastrada (CPF, email ou número de celular, por exemplo).
Ao todo, o sistema tem 227 milhões de contas cadastradas. Em pouco tempo, o Pix se tornou um dos meios mais usados para transferências de recursos e ultrapassou os tradicionais DOC (Documento de Ordem de Crédito) e TED (Transferência Eletrônica Disponível). Desde o lançamento, o Pix movimentou R$ 3,9 trilhões. Netto atribui a adoção rápida do modelo pela população a uma série de fatores. "Até ter um nome ajudou [na adesão]. Em alguns países criaram um sistema centralizado, mas sem nome. Então as pessoas não sabiam como pedir porque cada banco nomeou o seu. Além disso, foi primordial ter obrigado os grandes bancos a oferecerem o serviço", diz.
Para Marcelo Martins, diretor da ABFintechs (Associação Brasileira de Fintechs), o saldo do primeiro ano do sistema de pagamentos instantâneos é positivo. "Tivemos um ano agitado para o setor, desde o início deste ano, o Pix passou por 51 mudanças regulatórias e muitas inovações. Para atender a todas as necessidades, é preciso colocar em prática todas as funcionalidades previstas no cronograma", ressalta.
Desde novembro do ano passado, o Pix tem integrado novas funcionalidades, como o Pix cobrança, que é semelhante ao boleto, com vencimento futuro. A ferramenta, que teve implementação adiada três vezes, começou a ser oferecida em 14 de maio.
O cronograma para inclusão de outras utilidades é extenso. Em 29 de novembro, o Pix saque e o Pix troco vão começar a funcionar.
Ambos possibilitarão a retirada de recursos em espécie, mas o Pix Saque é uma transação exclusivamente para saque e o Pix Troco está associado a uma compra ou prestação de serviço. No último caso, ao adquirir um produto, por exemplo, o cliente passa um valor superior para receber o restante em dinheiro. Outras funções, como débito em conta e pagamento offline, também devem ser lançadas nos próximos meses.
Para Martins, é impossível prever as futuras inovações que deverão surgir dentro do novo modelo. "Vai depender muito das necessidades dos usuários, da demanda dos estabelecimentos. A agenda de inovação não tem fim", destaca. No início, o Pix ganhou funções inusitadas, como de rede social e de paquera. Muitos passaram a usar o sistema para envio de pequenos valores como forma de mandar mensagem. "Não imaginávamos, por exemplo, que as pessoas usariam um meio de pagamento para esse fim", afirma o diretor da ABFintechs.
A agilidade do novo sistema de pagamentos, entretanto, abriu caminho para que criminosos pudessem aprimorar golpes –com o Pix, eles conseguem pulverizar rapidamente o dinheiro entre várias contas, dificultando o trabalho da polícia. O Pix também facilitou a ação de criminosos em sequestros e assaltos. Muitas dessas contas utilizadas por bandidos são de laranjas, que são alugadas ou emprestadas por terceiros. Com o boom de crimes envolvendo o Pix, recentemente o BC implementou medidas de segurança para reduzir a vulnerabilidade dos sistemas às ações de criminosos em fraudes, sequestros e outros crimes.
Foi determinado, por exemplo, o limite de R$ 1.000 para operações em canais digitais, como Pix e TED, entre pessoas físicas à noite, que começou a valer em 4 de outubro. A aposentada Dirlene Fiel dos Santos de Souza, 63, moradora da Asa Norte, em Brasília, foi vítima de um golpe aplicado pelo WhatsApp em que o criminoso pedia dinheiro por meio do Pix. Por causa da nova regra, ela conseguiu transferir apenas R$ 1.000, mas acabou enviando mais R$ 9.000 por meio de TED, canal pelo qual tinha limite maior. "A pessoa disse que era a minha filha e tinha a foto dela no perfil. Ela me pediu para transferir o dinheiro e não pensei duas vezes, até porque ela tinha viagem marcada, pensei que podia ser por isso. Tirei dinheiro até da poupança. Só percebi que era golpe quando mandei uma mensagem para o número que eu já tinha perguntando se havia recebido e ela não sabia do que se tratava", lembra. Souza conta que fez boletim de ocorrência e pediu ajuda ao seu banco. "O dinheiro foi enviado para uma conta em um banco digital, mas quando fui atrás o dinheiro já tinha sido transferido para outras contas e foi inclusive sacado", afirma. Em meio a polêmicas de segurança, em setembro o BC registrou o primeiro caso de vazamento de chaves Pix. Segundo a autarquia, a base de dados do Banese (Banco do Estado de Sergipe) foi usado para expor 395 mil chaves de clientes de outras instituições por "falhas pontuais em sistemas dessa instituição financeira". Logo depois, a autoridade monetária afirmou ter adotado mecanismos complementares de monitoramento dos sistemas das instituições financeiras participantes do Pix. De acordo com a autarquia, uma das iniciativas foi reforçar o tratamento de consultas no sistema de chaves em volumes atípicos.
Fonte: Folha de S. Paulo, 14/11/2021