Pelo menos oito em cada dez recursos interpostos contra multas de trânsito em Campinas são indeferidos. De acordo com dados da própria Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec), a média de recursos acatados ficou abaixo de 20% nos anos de 2019 (18,67%) e 2020 (19,75%). Curiosamente, conforme informações da Emdec, este percentual teria atingido a impressionante marca de 99,48% em 2021, mas a empresa não explicou os motivos para tamanha discrepância em relação aos períodos anteriores.
De acordo com a Emdec, em 2019 foram registrados 4.771 recursos contra as autuações realizadas pela empresa, sendo que somente 874 foram deferidos - um percentual de 18,67%. As demais 3.880 contestações (81,33%) foram indeferidas, para contragosto dos motoristas reclamantes. Em 2020, o número de recursos caiu para 1.463. Destes, apenas 289 (19,75%) foram acatados.
A surpresa em relação ao levantamento divulgado pela Emdec foram os dados relativos a 2021. De acordo com a empresa responsável pela gestão do trânsito da cidade, das 3.899 contestações apresentadas por motoristas multados, 3.879 teriam sido deferidas, o que representaria um índice de 99,48%. Pelos números apresentados, apenas 17 reclamantes não teriam obtido êxito ao reivindicar a anulação das penalidades.
O advogado especialista em trânsito e professor de curso de formação de agente de trânsito, Renato Campestrini, explicou que, excluindo 2021, os demais anos estão dentro do padrão de deferimentos de recursos. "O percentual está dentro do padrão. Normalmente, a média de deferimentos nos municípios gira em torno de, enquanto que no Estado esse percentual sobre para 20%", comentou.
Questionada, a Emdec não explicou porque os dados de 2021 são tão diferentes dos anos anteriores A empresa informou que não comenta os recursos, já que ela é o órgão que realiza as autuações. A Junta Administrativa de Recursos de Infrações (Jari), órgão ligado ao Departamento de Estradas e Rodagens DER, foi procurada, mas informou que o Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran-SP) é que iria se posicionar sobre o assunto. O Detran, entretanto, não fez qualquer comentário até o fechamento desta edição.
Como recorrer
Ao pagar a multa até o vencimento, que ocorre 35 dias a partir da data da postagem da notificação da penalidade, o motorista tem direito a um desconto de 20%. Dentro desses mesmos 35 dias, é possível enviar recurso em primeira instância à Jari, apontando possíveis erros ou questionando o mérito (motivo, justificativa) da infração. A partir da data da publicação ou notificação da decisão da Jari, o proprietário tem mais 30 dias corridos para entrar com recurso em segunda instância junto ao Conselho Estadual de Trânsito (Cetran).
Por outro lado, se o recurso for aceito em primeira instância, a autoridade de trânsito também pode discordar e recorrer em segunda instância. Caso o condutor consiga reverter a situação, o valor pago é restituído. "Via de regra, os argumentos são repetitivos. Quem é membro da Jari normalmente trata sempre a mesma defesa. Então, há a alegação de que o agente de trânsito não observou o uso do cinto porque o condutor trajava camisa preta. Há também a alegação de que o motorista estava trabalhando em local fechado, mas não consegue provar que o carro estava estacionado no momento da infração. O próprio julgador consegue ter o discernimento", afirmou Campestrini.
As multas
Os agentes de mobilidade urbana da Emdec e os radares de fiscalização registraram, entre o segundo semestre de 2020 e o ano de 2021uma média de 103 multas de trânsito por hora na cidade. Foram aplicadas, nesses 18 meses, 1.362.055 penalidades no município. Em média, isso equivale a quase duas multas (1,74) por motorista, uma vez que Campinas tem 785.148 condutores habilitados, de acordo com o Detran-SP. Em 2019, foram aplicadas 677.806 notificações de infração de trânsito.
Em decorrência da pandemia da covid-19, as multas aplicadas no segundo semestre de 2020 somente foram entregues aos autuados em 2021. Por isso, as 1.362.055 penalidades registradas no ano passado incluem também as aplicadas no período de julho a dezembro de 2019. De acordo com a Emdec, mudanças na legislação, por conta da pandemia, impactaram, de forma direta, o cronograma de envio das multas e postergaram o recebimento dos valores devidos.
Em relação à arrecadação com multas, o aumento percentual, segundo a Emdec, foi de 8,2% em 2021 em relação a 2019. A cidade arrecadou R$ 102,5 milhões em 2019 contra R$ 111 milhões no ano passado. "O aumento na arrecadação observada na comparação dos anos de 2019 e 2021 se deve à suspensão das emissões das notificações durante o período de pandemia, quando o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) suspendeu os prazos dos procedimentos relacionados ao Sistema Nacional de Trânsito", afirmou a Emdec por meio de nota oficial.
Na última semana, o presidente da Emdec, Vinícius Riverete, revelou que a empresa iniciou estudos para unificar o limite de velocidade nas vias da cidade. A determinação foi feita pelo prefeito Dário Saadi, atendendo a uma demanda antiga dos motoristas, que consideram as diferentes velocidades máximas em vigor uma armadilha que estimula o que classificam como "indústria das multas" no município.
Carro espião
A Emdec conta, além de agentes de mobilidade urbana, com um veículo para fiscalizar, de forma exclusiva, as vagas da Zona Azul da cidade. As câmeras leem as placas dos carros para confirmar se estão estacionados regularmente nas vagas do estacionamento rotativo. Os dados são cruzados com os dos software do sistema.
Quando confirmado que a tarifa de R$ 4,00 não foi paga pelo motorista, os agentes de bMobilidade Urbana fazem a autuação. A multa é de R$ 195,23, com cinco pontos registrados na CNH. Nesse caso o veículo é removido ao pátio. A fiscalização por câmeras foi implantada junto com o lançamento do sistema Zona Azul Digital. Os motoristas podem acessar o novo sistema em um link existente no aplicativo da Emdec, bem como comprar e pagar os créditos de estacionamento pelo celular. A Zona Azul Digital funciona por meio de aplicativo e as vagas são georreferenciadas.
Com o aplicativo no celular, a pessoa pode comprar e pagar os créditos de estacionamento e verificar onde há vagas próximas ao destino desejado.
No aplicativo da Emdec, há um link da Zona Azul Digital. Basta o motorista realizar o cadastro, onde pode inserir até cinco veículos. Depois, ele compra os créditos e atribui ao carro que estiver utilizando a vaga no momento. Cada local tem um tempo determinado de permanência, que pode ser de 1h, 2h ou 5h. Para utilizar o sistema, o motorista paga o valor único e fixo de R$ 4,00.
Fonte: Correio Popular - Campinas - SP - 17/04/2022