O Grupo Zaffari planeja construir cinco prédios em terreno situado na parte de trás do Shopping Praia de Belas, em Porto Alegre. Uma das torres previstas no projeto terá 130 metros, o que a elevaria à condição de mais alta da Capital.
Na noite de quarta-feira (13), foi aprovado o Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) do empreendimento em reunião do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (CMDUA). Foram 17 votos favoráveis, seis contrários e três abstenções.
O plano diretor prevê altura-limite de 52 metros para a região. Atualmente, o Edifício Santa Cruz, situado no Centro Histórico e com 107 metros, tem o posto de maior da cidade.
Agora, o projeto será encaminhado para homologação do prefeito Sebastião Melo. Na sequência, o empreendedor entra com o projeto arquitetônico e com o alvará de construção. A estimativa é de que a obra seja realizada por etapas e comece em 2025.
"Impactos serão mínimos", diz secretário
O titular da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), Germano Bremm, afirmou que o tema foi discutido nas últimas cinco reuniões do conselho, com posicionamentos favoráveis e outros contrários.
— A gente vem quebrando essa barreira e tabu em relação às alturas na cidade de Porto Alegre — afirmou Bremm, que está no Azerbaijão, onde acompanha as reuniões da COP29.
Questionado sobre possível sombreamento no Parque Marinha do Brasil, em prédios e casas próximas, o titular responde que os "impactos serão mínimos":
— A localização do terreno, o formato e a distribuição das torres já estão estruturados para se ter impacto mínimo de sombreamento por determinadas horas do dia, de tal forma que funcione bem o posicionamento do sol e ele não gere sombreamento em alguma casa, prédio ou até no parque.
Como será o empreendimento
O empreendimento deve ser erguido no quarteirão composto pelas avenidas Borges de Medeiros e Praia de Belas e as ruas Dr. Alter Cintra de Oliveira e Peri Machado.
Além da torre de 130 metros, outras duas teriam cem metros. Os demais prédios seriam erguidos a 85 e a 61 metros, sendo localizados de frente para a Avenida Praia de Belas.
O terreno da futura obra pertence ao Grupo Zaffari. O espaço foi trocado em permuta com o governo do Estado, já que a rede construiu a Penitenciária Estadual de Porto Alegre. A contrapartida foi entregue em 2018 e o investimento foi de R$ 24 milhões.
Dos cinco prédios, três terão fins residenciais, um será destinado para serviços e outro contará com função mista, tendo base comercial e estacionamento com mais de 1,7 mil vagas. Haverá um supermercado. O arquiteto José de Barros Lima, do escritório ZBL Arquitetura, apresentou o projeto nas reuniões do conselho:
— Esse projeto aprovado é fruto de cinco anos de discussões. Não é uma coisa que a gente faz e vai ali e aprova porque tem privilégios, como sempre é levantado. O que a gente tem é um trabalho profissional mostrado para a prefeitura. O arquiteto assegura que foram realizados estudos sobre a questão de sombreamento:
— Tu precisas, no mínimo, de duas horas de sol por dia garantidas. Ele (empreendimento) foi posicionado exatamente para não atrapalhar.
Instituto de Arquitetos do Brasil diz que projeto está "fora da lei"
O Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RS) afirma que não é contra prédios altos, mas reitera sua posição em defesa da legalidade do regramento em relação ao tema. Segundo a entidade, a legislação urbanística é bastante extensa e precisa ser cumprida.
— Nesses grandes empreendimentos, o que temos visto sistematicamente é uma tentativa de flexibilizar ou subverter as regras que valem para todos. Nesse sentido, são apresentados projetos fora da lei — reflete o conselheiro do IAB-RS Tiago Holzmann.
Para o conselheiro, é necessário que sejam avaliados impactos como sombreamento, habitabilidade do entorno, trânsito e condições de transporte coletivo, saneamento, meio ambiente e até riscos de inundação.
— A gente não critica a arquitetura desses empreendimentos, mas ele é ilegal — critica.
Para Holzmann, a discussão em relação à flexibilização urbanística necessitaria ter audiência pública, envolver Ministério Público e outras instituições que trabalham em defesa da sociedade.
Representação junto ao Ministério Público
A Associação Comunitária dos Moradores e Amigos de Porto Alegre — Núcleo Menino Deus (Acomapa) critica o projeto. A entidade planeja para o dia 23 de novembro, às 15h, um abraço simbólico de protesto no local. Os integrantes do grupo publicarão carta aberta contra o empreendimento direcionada ao prefeito Sebastião Melo.
— Somos contrários à altura, que ultrapassa muito o limite, e também à ausência de estudo de impacto na vizinhança e de audiência pública, que permite a participação popular — enumera a integrante da direção da entidade, Marcia Godoy.
Segundo ela, o sombreamento é a maior preocupação dos vizinhos. Em grupos de WhatsApp, circula uma animação de como o sombreamento afetaria a região durante o dia.
— O sombreamento vai atingir tanto o Parque Marinha, de manhã, e, no período da tarde, pegará os moradores que moram na Praia de Belas e várias quadras. Porque ele (prédio de 130 metros) é muito alto — diz Marcia.
No dia 6 de novembro, a entidade ingressou com representação junto ao Ministério Público (MP). O pedido solicita apuração sobre possíveis danos ambientais e irregularidades na construção do prédio.
Na segunda-feira (11), a prefeitura de Porto Alegre foi notificada pelo órgão sobre a representação. O MP solicitou informações sobre o empreendimento e estabeleceu prazo de 15 dias para o poder público municipal responder aos questionamentos.
O que diz o Grupo Zaffari
A reportagem procurou o Grupo Zaffari para uma entrevista sobre o empreendimento. Por nota, foi encaminhada a seguinte manifestação:
"Após a aprovação do Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) para o empreendimento da empresa no bairro Praia de Belas pelo Conselho do Plano Diretor de Porto Alegre, se iniciará o desenvolvimento das novas etapas, com a condução de diversos projetos e licenciamentos que incluem os detalhamentos dos projetos arquitetônicos e de engenharia, análises e ajustes ao mercado e parcerias com incorporadoras.
É importante destacar que a aprovação do EVU, onde se debatem as soluções dos estudos e necessidades, é uma etapa essencial para os projetos que formarão este complexo de uso misto. A aprovação pelos técnicos da prefeitura, após a verificação do atendimento das premissas aprovadas no EVU, é que dará as informações mais completas sobre o empreendimento.
Informações adicionais sobre prazos e detalhes das próximas etapas serão divulgadas na medida que forem definidas."
O que diz a Aeronáutica
A Força Aérea Brasileira (FAB) respondeu aos questionamentos de Zero Hora se já havia sido informada sobre o futuro empreendimento e se a altura do prédio de 130 metros não poderia atrapalhar os voos na região.
A FAB respondeu que "não há registro no sistema de solicitações para empreendimentos na área indicada".
Confira, na íntegra, a nota encaminhada pela FAB:
"A Força Aérea Brasileira (FAB), por meio do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), informa que todo o Objeto Projetado no Espaço Aéreo (OPEA) deve ser submetido à apreciação do Comando da Aeronáutica (COMAER), por meio de uma pré-análise, no Sistema de Gerenciamento de Processos da Aérea AGA (SysAGA), responsável pelo gerenciamento dos processos da área de aeródromos.
É válido destacar, no entanto, que o COMAER não emite autorizações de construção. A autorização emitida se limita a questões de segurança e regularidade das operações aéreas, não substituindo a deliberação de outros órgãos públicos sobre aspectos de suas competências específicas.
A FAB informa, ainda, que não há registro no sistema de solicitações para empreendimentos na área indicada."
O que diz o Sinduscon
A reportagem procurou o Sindicato das Indústrias da Construção Civil do RS (Sinduscon-RS) para se manifestar sobre a aprovação do Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) do empreendimento do Grupo Zaffari. Não houve retorno da entidade até a publicação desta reportagem.
Zero Hora - Porto Alegre - RS - 16/11/2024