Prestes a ser desativado, o aeroporto Carlos Prates pode dar lugar a um novo bairro residencial em Belo Horizonte. Este é o plano do governo federal – que é dono da área de aproximadamente 60 hectares onde funciona o aeroporto – e pretende incorporar o terreno aos primeiros Fundos Imobiliários da União (FIIs) criados pelo Ministério da Economia com o objetivo de viabilizar a alienação de áreas do Executivo em todo o país.
O terreno deve ser incluído no projeto Incorpora Brasil! – Fundos Imobiliários Federais, que foi lançado pela Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do ministério no último mês. A iniciativa já inclui 237 ativos em todo o país, entre eles áreas da União na divisa de BH e Nova Lima – que tem motivado resistência dos municípios e são tema de debate em um grupo de trabalho criado pelo Ministério Público.
“O zoneamento permite o uso residencial, quando de interesse social. Portanto, é possível criar, do zero, um bairro planejado, com enorme área verde, que ajudará a capital a contornar seu problema de falta de habitação, ao mesmo tempo em que trará ganhos incríveis de lazer à comunidade local. É muito egoísmo ser contra isso”, escreveu o secretário Especial de Desestatização do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, em artigo publicado recentemente em O TEMPO.
A ideia do governo é licitar um gestor privado que deverá atender uma série de pré-requisitos para a estruturação de FIIs, que comporão os imóveis listados no edital, entre eles o aeroporto Carlos Prates. A Secretaria de Desestatização projeta colocar até R$ 25 bilhões em ativos nessa iniciativa, que terá sua rentabilidade auferida de cinco a sete anos.
Esse modelo surgiu como uma alternativa para o governo federal fazer caixa e desfazer de ativos que, muitas vezes, já foram leiloados sem sucesso. “Estamos criando uma solução de atacado. Em vez de vendermos imóvel a imóvel, podemos monetizar por meio de grandes lotes, o que nos garante escala de venda compatível com a oferta que temos”, disse Mac Cord na ocasião do lançamento do programa.
O Ministério da Economia também aposta que a iniciativa pode impulsionar investimentos e geração de emprego no país.
Os primeiros editais-piloto dos FIIs da União devem ser lançados até março, e a expectativa do ministério é que, a cada dois meses, novos editais sejam publicados. No entanto, no caso do Carlos Prates, o aeroporto precisa ser desativado – o que deve ocorrer em maio. Atualmente, a pasta informou que ainda está em fase de tratativas com os órgãos responsáveis pela área do aeroporto.
Apesar de previstos para o mês que vem, o Ministério da Economia ainda não tem definidos os formatos desses fundos imobiliários e informou que, “inicialmente, estuda-se um FII de vocação logística, um FII de retrofit, um FII de vocação turística e dois FIIs com grandes áreas em centros urbanos”. Provavelmente, o terreno no Carlos Prates estaria em um desses dois últimos.
Prefeitura de BH quer assumir operação e questiona proposta
Diante dos planos da União para o aeroporto Carlos Prates, no final do ano passado, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) manifestou interesse em assumir a área – onde atuou em comodato com o governo federal entre 1999 e 2016 –, o que poderia inviabilizar a venda e o desenvolvimento do local por meio de fundos imobiliários.
O Executivo municipal apresentou um pedido ao Ministério da Economia para assumir “a outorga de exploração do aeroporto Carlos Prates (SBPR) em 23 de novembro de 2021 para que junto a instituições parceiras possa realizar uma destinação adequada que atenda o município”.
Segundo a prefeitura, em resposta ao pedido, “o governo federal nos informou no início de janeiro que prorrogou o prazo previsto para a revogação da atribuição, à Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), da exploração do aeroporto Carlos Pratos (SBPR), para a partir do dia 1º de maio de 2022 e também informou que o Estado de Minas Gerais já se dispôs a assumir o procedimento de concessão do aeroporto”.
No ano passado, o vice-prefeito da capital mineira, Fuad Noman (PSD), chegou a dar entrevista dizendo que a região do bairro Carlos Prates não comportaria a construção de imóveis no sentido de dar origem a um novo bairro.
Por meio de nota, a Prefeitura de Belo Horizonte informou ainda que não recebeu nenhum projeto da União sobre as áreas e que, quando apresentados, “serão avaliados, e serão realizados os estudos de impacto necessários”.
“A princípio, qualquer empreendimento imobiliário de grande porte somente será autorizado se compatível com a infraestrutura e equipamentos da região de sua implantação atendidos os requisitos previstos na legislação municipal e de eventuais medidas mitigadoras e/ou compensatórias que venham a ser fixadas no processo de licenciamento, de acordo com a análise do projeto e da estrutura existente ou a ser implantada pelo empreendedor”, complementou a prefeitura à reportagem.
GARANTIA DE MAIOR RETORNO E AUTONOMIA
Apesar de os fundos imobiliários existirem há pelo menos duas décadas no Brasil, eles ainda não haviam sido utilizados como forma de alienação de ativos públicos do governo federal.
Essa iniciativa, na avaliação do professor de finanças Alexandre Chaia, do Insper, pode garantir maior autonomia e trazer bons retornos ao governo.
“Quando você vende uma área grande, você vai negociar com uma empresa grande, uma multinacional. Então, ela vai dizer: ‘Para poder pegar isso, eu quero linha do BNDES, eu quero financiamento, eu quero isenção por dez anos’. Ela pede um montão de coisa porque é uma empresa grande que tem capacidade de comprar uma área grande. Quando você faz via fundo, você vai ter um montão de pequenos investidores sem o poder de barganha que uma empresa grande tem. Então, o governo vai ter mais flexibilidade para colocar as coisas como ele quer desenvolver e não dependerá de arrumar um único comprador ou dois ou três. Ele vai fazer isso no varejo vendendo para diversas pessoas as cotas que ele tem”, declarou o professor do Insper.
Os fundos imobiliários, diferentemente de outros, têm um atrativo interessante, que é a não incidência de Imposto de Renda sobre retornos financeiros.
Fonte: o Tempo, 14/02/22