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Poucas andorinhas para fazer um verão no Centro

Por Jorge Hori*   

A partir da metade dos anos 50, com o surto de desenvolvimento e modernização promovido pelo governo Kubitscheck os centros históricos das grandes cidades começaram a decair. Isso porque foram criados novos polos de negócios e também a transferência das "repartições públicas" para Centros Administrativos.

Moradores, escritórios, comércios, serviços profissionais de maior renda, entre outros, foram saindo dos seus imóveis e se transferindo para outros em novas áreas. E os que ficavam vazios nem sempre eram reocupados, gerando um grande volume de imóveis residenciais e não residenciais vagos.

Esse quadro gerou uma contradição: enquanto aumentava o deficit habitacional em consequência da carência de habitações adequadas, havia um enorme conjunto de imóveis, em área bem servida de infraestrutura e serviços públicos, desocupado.

Ao longo de muitos anos, organizações não governamentais e urbanistas a elas ligados batalharam para levar os programas de habitação social para o centro tradicional. De um lado, enfrentaram sérias resistências dos setores conservadores e, de outro, os movimentos sociais se anteciparam promovendo invasões de imóveis vazios, pelos sem-teto. Diante das invasões, os proprietários reagiam pedindo na Justiça a reintegração de posse, o que conseguiam. Muitas vezes com o uso da força policial e comoção social. Mas, mesmo com a saída dos invasores, permaneciam desocupados, esperando por uma desapropriação pela Prefeitura a valores - supostamente - de mercado.

 Em São Paulo, o prefeito, filiado ao PT e coerente com os objetivos da justiça social e do direito de todos à cidade, vem tentando implantar o programa Moradia é Central, com a desapropriação, reforma e revenda de imóveis vagos à população de baixa renda, na área central da cidade.

 O programa vê uma realidade parcial, verdadeira, mas não considera devidamente o contexto ou, como preferem os urbanistas, o habitat.

A ocupação de um imóvel vago pelos moradores de baixa renda pode permanecer como uma "ilha" diferenciada do contexto, ou promover uma transformação do habitat.

No primeiro caso, a ilha poderá passar quase despercebida e os moradores só terão o local como moradia, se locomovendo para os locais onde possam obter alguma renda, se alimentar e até atender a algum vício. Alguns dos moradores não conseguirão o mínimo para o pagamento das prestações, voltando para a rua ou para as favelas. Não afetarão significativamente o patamar dos valores imobiliários, permanecendo em função dos subsídios.

No segundo caso, eles promoverão o desenvolvimento das facilidades privadas compatíveis com a sua capacidade de consumo. Propiciarão o desenvolvimento de um comércio popular e influenciarão o patamar dos valores imobiliários. A redução dos valores terá como consequência, num primeiro momento, uma nova onda de ocupações legais. A manutenção dos imóveis e do habitat dependerá da atuação do Poder Público. O resultado será a formação de um bairro popular, bem servido.

Daí, além da persistência do padrão de ocupação, podem ocorrer duas transformações. Uma, a elevação do padrão, com o interesse de moradores com uma renda um pouco melhor pelos imóveis, elevando os preços e promovendo a "expulsão" dos primeiros moradores. Embora isso não seja permitido legalmente, proliferam no sistema os chamados contratos de gaveta.

A outra é a transformação em "gueto da pobreza", com tendência a uma situação de "cracolândia". Indesejável, mas provável.

Uma das razões da persistência da desocupação é a inexistência de garagens. Por outro lado, a quase totalidade dos novos moradores não terá o seu carro, não havendo necessidade de vagas para estacionamento. As exceções serão daqueles que precisam de um veículo para exercer as suas atividades econômicas, incluindo os coletores de resíduos sólidos.

O principal impacto do programa Moradia é Central será sobre os terrenos vagos, na área central e centro expandido, com a imposição da construção em função do uso social da propriedade urbana. A perspectiva do proprietário é a sua utilização para a construção de médio e alto padrão, como ocorreu e vem ainda ocorrendo com o lançamento de edifícios altos, com estúdios e apartamentos de um dormitório, com poucas vagas, voltados para moradores sozinhos de alta renda. O valor de venda seria relativamente elevado e os eventuais rendimentos do ativo superiores ao obtido com o uso de estacionamento.

Se, no entanto, for envolvido por um gueto da pobreza, o valor imobiliário irá cair, mesmo que venha a ser ocupado com uma nova construção para moradia social. Para o proprietário do terreno haverá prejuízo em qualquer das hipóteses: deixar desocupado ou construir para habitação social.

Esses guetos terão o suporte institucional de Zeis (Zonas Especiais de Interesse Social), mas nem todas essas áreas irão se transformar em guetos.

A resposta inicial do mercado, conforme mostra pequena reportagem publicada no Estado de São Paulo de domingo ("Miniterreno vira prédio com novo Plano Diretor", Metropole A 23), não é a desejada pela Prefeitura. Os prédios lançados, com grande altura, muito acima do padrão do entorno, para aproveitar todo o potencial construtivo, com centenas de microapartamentos, têm preço elevado, o m2 não saindo por menos de R$ 9.000,00 e vagas apenas para metade dos apartamentos.

Se essas "andorinhas" não fizerem o "verão", o centro tradicional de São Paulo poderá ter uma profusão de novos São Vito.

 

* Jorge Hori é consultorem Inteligência Estratégicae foi contratado pelo SINDEPARK para desenvolver o estudo sobre a Política de Estacionamentos que o Sindicato irá defender. Com mais de 50 anos em consultoria a governos, empresas públicas e privadas, e a entidades do terceiro setor, acumulou um grande conhecimento e experiência no funcionamento real da Administração Pública e das Empresas. Hori também se dedica ao entendimento e interpretação do ambiente em que estão inseridas as empresas, a partir de metodologias próprias.

  NOTA:

Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do SINDEPARK.


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